Atuação das Pastorinhas do Segundo Distrito é documentado em filme e estreia no domingo em Rio Branco

O documentário “Estando as pastorinhas aqui nesse lugar”, realizado pelo cineasta acreano
Silvio Margarido, terá estreia gratuita e será exibido em telão na Rua África, espaço da
cabeceira da passarela Joaquim Macedo, no dia 19 de março, domingo, às 19:30 horas.

O filme conta a história do espetáculo de dança folclórica realizado por mais de quinze anos em Rio Branco por moradoras do bairro Seis de agosto, as Pastorinhas do Segundo Distrito
(também conhecidas como da Seis de Agosto) sob regência da professora aposentada
Guajarina Margarido, também mãe do diretor.

Resultado de um projeto iniciado em 2021 por meio do apoio da lei Aldir Blanc, o documentário foi feito a partir da seleção de um grande acervo de filmagens das
apresentações realizadas pelo público, amigos e cinegrafistas que assistiram e acompanharam as Pastorinhas desde 2006, ano em que o grupo nasceu.

Silvio Margarido tinha como intenção primeiramente fazer uso do material que estava parado em casa. Para isso, ele passou para o computador as gravações que Guajarina recebia em DVDs e guardava com ela, e doou os arquivos em um HD para a Fundação Garibaldi Brasil (FGB), como uma forma de divulgar o trabalho realizado todos esses anos por Guajarina e muitas meninas do bairro Seis de Agosto.

Espetáculo do auto de natal realizado pelas Pastorinhas do Segundo Distrito.

Porém, a ideia não ficou apenas nesse compartilhamento das imagens dos espetáculos. Silvio queria também que a história das Pastorinhas do Segundo Distrito fosse contada pela voz de quem participou do grupo e que fosse levada para outras pessoas de forma mais profunda. Ele escolheu fazer isso através do meio com que trabalha, o audiovisual: “Eu pensei que seria uma boa fazer esse documentário pra manter a história, a memória, e também que pudesse ser um vídeo educativo pra passar para outras pessoas conhecerem”, como afirma o diretor.

Silvio Margarido é produtor na Mil Acres e também roteirista e editor. Estudou Cinema e
Mídias Digitais na Instituição de Educação Superior de Brasília e tem um conjunto de obras
que se passam no Acre, e falam sobre o estado e sua história. Entre elas, O Mergulho,
documentário de 2009 que aborda a relação dos moradores de Rio Branco com a cidade, suas transformações e o Rio Acre, e a série ficcional Mauani – o Silêncio de Maria de 2016,
história da personagem Maria, vítima das correrias, contada por meio de seu caderno de
memórias compartilhado com a neta, exibido em 5 episódios na TV Brasil.

Trazer memórias que falam sobre o lugar onde ele mora é um dos principais direcionamentos dos trabalhos feitos por Silvio. O diretor quis fazer o documentário para aproveitar a bagagem de histórias sobre a vivência das Pastorinhas que sua mãe Guajarina carrega, que com uma idade avançada, já não lembra de muita coisa.

Trata-se de memórias da arte e da vivência de uma geração de moradores do bairro Seis de Agosto que estão guardadas com pessoas, que se não forem ouvidas, podem ser perdidas.

A dança folclórica apresentada pelas Pastorinhas do Segundo Distrito conta a história do
caminho feito pelas pastoras rumo à Belém para visitar o recém nascido Jesus. A jornada é
realizada por dois cordões, um azul, liderado pela Contra-Mestra, e o outro encarnado, pela
Mestra, ao meio uma personagem recebe as duas cores, a Diana.

Em meio à dança, várias outras figuras aparecem para participar da festa, como os pastores, as borboletas, a estrela da noite, a cigana e a camponesa. O espetáculo recebe também momentos teatrais e músicas que contam a história dançada pelas pastorinhas.

Encontro entre o grupo das Pastorinhas, Guajarina de chapéu ao fundo.

Foi assistindo a esse espetáculo ainda na década de 50 que Guajarina teve contato com a
primeira pessoa que trouxe O Pastoril, como também é conhecida a dança, para Rio Branco. Mestre Zuza veio do nordeste e montou o primeiro grupo de pastorinhas na cidade, e Guajarina assistia as apresentações, ainda sem imaginar que um dia iria resgatar o folclore e ter seu próprio grupo de pastoril, como ela conta: “E aí eu ia olhar as meninas apresentarem. Mas eu nunca dancei, e nunca tive a intenção de montar o grupo nem nada”.

Muito além do espetáculo, as Pastorinhas tornou-se também um grupo de convivência entre meninas e meninos do bairro Seis de Agosto. Elas nasceram a partir da Associação de
Mulheres do Segundo Distrito, projeto que unia moradoras em diálogos e trocas culturais
entre si.

A dança era uma das criações da associação, que também foi liderada durante alguns anos por Guajarina. Os ensaios chegavam a se transformar em eventos na própria casa de Margarido: “Era bom que as pastorinhas vinham pra cá, a gente fazia artesanato, a gente fazia alguma coisa de comer” , como afirma a regente do grupo.

A história feita pelas mulheres da Seis de Agosto e por Guajarina influenciou Patrícia
Monteiro, uma das artistas que participou na trilha sonora do documentário, que conta que ao morar no bairro Seis de Agosto passou a conhecer o trabalho cultural de Guajarina, e ser influenciada através da vivência de vizinhos que fizeram parte das Pastorinhas, que assistiam e que contaram para ela sobre o projeto, criando nela uma admiração.

Espetáculo das Pastorinhas realizado durante o arraial.

Essa admiração se dá pela relação que Patrícia tem com a arte, mas também pela
identificação com Guajarina, professora de Português e Inglês por mais de trinta anos na
cidade, e com as mulheres do bairro, protagonistas nessa história cultural de Rio Branco: “De alguma forma me sinto próxima a ela e a sua história de vida e luta, pois sou estudante de Letras Inglês na UFAC como ela foi; sou preta, sou periférica e moro aqui no bairro Seis de Agosto, e me sinto extremamente inserida culturalmente na realidade daqui deste bairro, na história das mulheres daqui, que como eu, sofrem diariamente com a exclusão, o preconceito, a invisibilidade, agressões diversas”, conta a estudante e artista.

Com a possibilidade de criar mais admirações e aumentar a rede de contatos que As
Pastorinhas podem unir, o documentário pretende não só falar sobre a memória, mas também influir sobre o presente.

A última apresentação do grupo foi em 2020, e hoje seu retorno e permanência é incerta, como reflete Silvio Margarido: “Porque como parou a partir da pandemia, houve uma dispersão muito forte. Alguns cresceram, casaram e tal.” Guajarina conta que pretende voltar com As Pastorinhas e seus espetáculos neste ano ainda, quem sabe pode acontecer logo após a estreia do documentário.

 

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