Qual é o tamanho do estrago causado pela guerra na economia de Israel

Setores cruciais para a economia israelense, como serviços, turismo e tecnologia, vêm sofrendo os impactos do conflito

Há cinco semanas, no dia 7 de outubro, o grupo terrorista Hamas perpetrou um bárbaro ataque no território israelense, matando 1,2 mil pessoas, segundo estimativas revisadas por Tel Aviv na sexta-feira (10/11). De acordo com informações do Exército de Israel, cerca de 240 pessoas foram sequestradas pelos terroristas no dia do massacre. Apenas quatro foram libertadas desde então.

Diante do maior atentado já praticado em território israelense – e pior ataque terrorista que o mundo viu desde a derrubada das Torres Gêmeas, em Nova York, em 11 de setembro de 2001 –, Israel foi à guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza. Além do desastre humanitário, o país também já começou a sentir os impactos econômicos profundos de um conflito que tende a se prolongar.

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Um relatório elaborado por analistas do banco americano JPMorgan projetou que o Produto Interno Bruto (PIB) de Israel deve recuar 11% no 3º trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período de 2022, o que prenuncia um duríssimo golpe em uma economia que vinha em ascensão.

Dados do Banco Central de Israel mostram que o PIB do país cresceu 4% no 1º trimestre de 2023 e 3,1% no 2º. No ano passado, a expansão da economia israelense foi de 6,5% e, em 2021, de 8,6%, em franca recuperação após o auge da pandemia de Covid-19, que abalou a economia global em 2020.

Em 2022, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o PIB de Israel somou US$ 499 bilhões. No ranking do PIB per capita, calculado a partir da divisão do PIB total pelo número de habitantes – o que permite medir o quanto da riqueza caberia a cada indivíduo de um país se todos recebessem partes iguais –, Israel aparecia à frente de nações como Alemanha, França, Reino Unido e Itália, com US$ 53,2 mil. Pouco antes da guerra contra o Hamas, analistas estimavam que a economia israelense registrasse, ao fim de 2023, um crescimento de 2,5% a 3%.

“É difícil precisar, mas essa previsão para este ano pode ser esquecida. É uma economia muito voltada a serviços de informação, tecnologia e telecomunicações. Certamente ela será fortemente afetada pelos conflitos”, afirma Fábio Andrade, professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

“É bastante provável que o impacto da guerra seja significativo não apenas em termos de PIB, mas com uma piora também na questão da desigualdade de renda. Vários indicadores já mostravam que a situação em Israel vinha piorando nos últimos anos. Com a guerra, provavelmente, esses indicadores devem se agravar ainda mais”, projeta Andrade.

Serviços e turismo afundam

As consequências da guerra na Faixa de Gaza para a economia de Israel guardam algumas semelhanças com o auge da pandemia de Covid-19, quando inúmeros estabelecimentos comerciais ficaram vazios e tiveram de fechar as portas. Em vários pontos do país, escolas e escritórios, quando abrem, funcionam apenas durante algumas horas. O movimento em bares e restaurantes diminuiu, em meio ao temor envolvendo possíveis novos atentados. O setor de turismo, um dos mais importantes da economia israelense, também foi duramente atingido.

De acordo com dados do sistema de compensação de pagamentos Shva, o consumo privado no país recuou mais de 30% nos dias seguintes ao início do conflito. Os gastos com lazer e entretenimento despencaram mais de 70%.

“Sem dúvida, o impacto na economia já é grande e tende a ser maior ainda”, diz Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV (FGV NPII). “Tanto a guerra quanto a pandemia impactam a economia. A diferença, no caso da Covid, é que ela atingiu, horizontalmente, todos os setores. Todo o país parou. Nesse caso, há alguns setores que sofrem muito mais, como o turismo, que é uma fonte importantíssima de recursos para Israel. Neste momento, pouquíssimos turistas estão indo para lá, preocupados com a guerra”, observa.

Das startups ao front

Israel tem uma economia dinâmica e muito baseada em tecnologia – o país é chamado de “a nação das startups”. Nem mesmo esse segmento passou incólume à guerra contra o Hamas. Foram convocados cerca de 360 mil reservistas para o Exército, a maioria dos quais jovens entre 21 e 35 anos. Esta é, basicamente, a faixa etária predominante nos quadros de funcionários de empresas de tecnologia no país. A estimativa é a de que pelo menos 8% da força de trabalho em Israel tenha sido mobilizada para o conflito.

André Miceli, coordenador do MBA de Marketing e Negócios Digitais da FGV, relata que a convocação de jovens profissionais para servirem ao Exército levou a “uma interrupção temporária do processo de inovação e desenvolvimento tecnológico do país”. “Isso pode significar até mesmo uma interrupção na operação das startups e empresas de tecnologia. Existe um percentual grande de empresas com funcionários em idade para se tornarem combatentes do Exército de Israel. Esses profissionais, independentemente de serem ultraqualificados, são chamados para o serviço militar e muitas vezes colocados em funções que não têm absolutamente nada a ver com o que eles faziam”, explica.

“É a primeira vez que assistimos a uma guerra na qual o trabalho remoto está inserido. Existem diversos relatos de empreendedores que estão no front, em combate, e ainda assim vêm tentando manter suas operações. Inevitavelmente, essa falta de foco vai impactar nessas empresas”, diz Miceli.

Para Fábio Andrade, da ESPM, “é difícil medir o quanto já foi comprometido, em termos de inovação, na economia do país”. “Mas não é nenhum absurdo dizer que, provavelmente, algumas inovações e novas tecnologias de negócio já tenham sido perdidas por causa da guerra”, afirma.

Petróleo e a questão global

Além do contexto local, o confronto no Oriente Médio provoca instabilidade entre os maiores produtores mundiais de petróleo. Para o Brasil, a elevação substancial do preço do produto representa uma ameaça para a inflação, algo que teria repercussão imediata no ritmo de queda da taxa básica de juros do país, a Selic. De acordo com Andrade, o impacto econômico da guerra, em escala global, será menor ou maior a depender, justamente, do que acontecer com a oferta e o preço do petróleo.

“Pode ser um impacto tão grande quanto a pandemia para a economia de Israel e, sobretudo, para a Cisjordânia. Talvez afete também a divisa com o Egito. Mas o que mais preocupa, do ponto de vista global, é o quanto essa guerra tem potencial para afetar a economia do resto do mundo por causa de eventuais problemas envolvendo a oferta de petróleo.”

Estimativas divulgadas no fim de outubro pelo Banco Mundial indicam que o acirramento das tensões no Oriente Médio pode levar a um aumento de até 75% no preço do barril de petróleo, no pior dos cenários traçados pela instituição, rumo a uma máxima histórica de US$ 150 o barril. Nesse caso, poderia haver uma redução do fornecimento global de petróleo entre 6 milhões e 8 milhões de barris por dia, o que elevaria brutalmente os preços.

Na sexta-feira (10/11), o barril de petróleo do tipo Brent, considerado referência no mercado internacional, foi negociado a US$ 81,65 (alta de 2%). O WTI, padrão para o mercado dos Estados Unidos, subiu 2,1%, a US$ 77,35 o barril.

O tamanho do estrago

Segundo Leonardo Paz, da FGV, apesar das perspectivas sombrias para os próximos meses, especialmente se o conflito na Faixa de Gaza se alastrar para outras regiões do Oriente Médio, a economia de Israel tem condições de se reerguer e minimizar o estrago causado pela guerra.

“Israel é uma economia muito resiliente e diversa. Não é como a economia da Rússia, que depende muito mais de determinados itens, como a exportação de petróleo. Essa diversidade é boa, adiciona resiliência e faz com que a economia do país resista melhor a fatos como esse”, afirma.

“Além disso, Israel tem muito apoio da comunidade internacional e dos Estados Unidos, inclusive financeiro. Não vejo a economia israelense colapsando por causa desse conflito. Israel já enfrentou outras guerras. Será um impacto duro. Vai acumular mais dívidas, sem dúvida. Mas não deve haver um colapso econômico”, conclui o pesquisador.

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