No Acre, quase 2 mil crianças nascidas em 2023 estão sem o nome do pai na certidão de nascimento

Rio Branco e Cruzeiro do Sul lideram o ranking com mais crianças sem o registro paterno

Segundo um levantamento da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), o Acre registrou 1,9 mil crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento.

Em relação aos municípios, Rio Branco despontou na liderança com 691 nascimentos sem o registro paterno na certidão. Já Cruzeiro do Sul, aparece em segundo lugar no ranking, com 400 nascimentos sem pai.

Número só vem crescendo nos últimos anos no Acre/Foto: Matheus Mello/ContilNet

Quando levado em consideração o quantitativo proporcional à população de cada município, Porto Walter lidera com 40, das 168 nascidas em 2023, ou seja, 24% do total.

Veja o ranking completo, por percentual proporcional:

Acrelândia: 17%
Assis Brasil: 11%
Brasiléia: 11%
Bujari: 18%
Capixaba: 12%
Cruzeiro do Sul: 16%
Epitaciolândia: 12%
Feijó: 12%
Jordão: 6%
Mâncio Lima: 23%
Manoel Urbano: 11%
Marechal Thaumaturgo: 10%
Plácido de Castro: 16%
Porto Acre: 15%
Porto Walter: 24%
Rio Branco: 10%
Rodrigues Alves: 12%
Santa Rosa do Purus: 8%
Senador Guiomard: 16%
Sena Madureira: 9%
Tarauacá: 13%
Xapuri: 5%

Lei sancionada

Para tentar diminuir esse número, em julho de 2022, o governo do Acre sancionou a lei n° 3.974. Com a nova regra, os cartórios do estado são obrigados a denunciar à Defensoria Pública casos de crianças registradas sem o nome do pai.

Segundo a defensora pública, Thaís Souza, a lei é necessária para garantir os direitos da mãe e da criança, logo após o nascimento, além de evitar registros tardios de crianças.

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“Os cartórios nos enviarão mensalmente uma lista de crianças registradas somente com o nome materno. Essa lista deverá conter nome, endereço, contato da mãe e se possível, os dados do suposto pai. A equipe da Defensoria mantém contato com essa mãe e orienta sobre os direitos dela e do filho. Porém, ela já precisa ser orientada no cartório que ela pode procurar a Defensoria. Já tivemos casos de crianças de 12, 13 anos sem certidão de nascimento, ou seja, sem cidadania”, explica a defensora em entrevista ao ContilNet.

Segundo a defensora, a falta de dados corretos sobre o pai da criança, atrasa o andamento do processo de investigação de paternidade. “Às vezes, a mãe tem dificuldade em informar o endereço do pai para que o juiz faça a intimação, mas nós tentamos de todas as formas ajudá-la. Usamos bancos de dados com o Infoseg [rede que reúne informações de segurança pública dos órgãos de fiscalização do país] da Receita Federal, que nos ajuda a encontrar o endereço da pessoa. Quando não há dificuldade de localizar o pai, o processo termina em média em 1 ano ou até menos”, diz Souza.

O acolhimento e o amparo às mães nessa situação é a base do trabalho realizado pela Defensoria Pública. A defensora Thaís Souza explica que, em muitos casos, a vergonha de procurar o órgão é um tabu a ser quebrado.

“Existem casos em que elas têm dúvidas sobre a paternidade. Se relacionam com mais de uma pessoa e têm vergonha de procurar a Defensoria. A gente fala que isso não é problema. [Perguntamos a elas] Qual você acha que tem mais probabilidade de ser o pai? Vamos ajuizar a ação contra ele. Não deu certo? Ajuíza o outro. O que importa é garantir os direitos da criança”, expõe a defensora.

Ela completa ainda que, durante a pandemia, o órgão trabalhou de forma remota e que essas abordagens foram feitas on-line, o que ajudou no processo de escuta das mães. “De forma on-line elas se abriam mais, o contato frente a frente pode ser constrangedor”.

Após ajuizar o processo, ocorre a conciliação entre as partes. Segundo a defensora, é nesse momento que, em 90% dos casos, os supostos pais dizem que desconfiam da mãe e solicitam o exame de DNA.

“Se ele disser que não tem condições de custear o exame, se a mãe estiver assistida pela defensoria, o Estado é responsável por arcar com os gastos. Além disso, temos uma equipe multidisciplinar, composta por psicólogos e assistentes sociais, prontos para auxiliar nesses casos”, detalha a defensora.

Ainda segundo Thaís Souza, caso a paternidade seja comprovada após o exame, é de rotina ajuizar também uma ação de pedido de pensão alimentícia. Confirmada a paternidade, o juiz determina que o cartório insira o nome do pai na certidão.

Entretanto, existem casos em que o pai é o responsável por procurar a Defensoria Pública para incluir seu nome na certidão de nascimento do filho. Nessa situação, o processo muda de nome, passa a se chamar reconhecimento de paternidade, já que o processo de investigação não é mais necessário.

“São poucos casos, mas acontece. Às vezes, o pai quer reconhecer a criança e a mãe não quer. Tentamos explicar para ela que o direito é da criança e não só dela. Quando o pai se prontifica a fazer o reconhecimento, há casos em que fazemos tudo de forma extrajudicial, sem precisar de ação”.

Souza explica que, após completar a maioridade, a criança não precisa da autorização da mãe para dar entrada no processo de reconhecimento de paternidade.

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