Acreana trancista desde os 17 anos fala sobre tendência de penteados

Além de ser uma forma de transmitir o conhecimento ancestral, as tranças podem ser também uma fonte de renda para muitas pessoas negras

Comemorado no dia 24 de janeiro, o Dia Mundial da Cultura Africana e Afrodescendente foi adotado em 2019 pela Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), na 40ª sessão da Conferência Geral da Unesco. As memórias da cultura do afrodescendente são muito ricas e presentes no Brasil. Em seu artigo Trança Afro – A cultura do cabelo subalterno, Aline Ferraz Clemente explica como o cabelo traz a memória da cultura afrodescendente e como as tranças podem ser uma forma de transmitir o conhecimento ancestral, além de ser uma forma de renda para muitas pessoas negras.

Rayane Mendes, 26 anos, é uma mulher negra e trancista que atualmente atende em Rio Branco, no bairro João Eduardo. Seu interesse pelas tranças veio aos 17 anos, quando começou a assistir a vídeos que contavam a história das tranças. A partir de então, pesquisou como começar a fazer, sobre os materiais utilizados e gostou do assunto. As primeiras tranças foram feitas em seu próprio cabelo e divulgadas em suas redes sociais, o que despertou a curiosidade de algumas pessoas em algo que, de acordo com Rayane, era muito novo aqui.

Rayane Mendes é uma mulher negra e trancista que atualmente atende em Rio Branco, no bairro João Eduardo/Cedida

“Eu acho ótimo que várias e várias mulheres estão procurando tranças e vários outros tipos de penteados. Aumenta a autoestima da mulher, principalmente das mulheres pretas “, completa.

Rayane destaca que a trança não se trata somente de uma estética. “Nos faz voltar a nossa ancestralidade, a nossa força. Quando os escravos chegavam até aqui, os europeus raspavam a sua ‘’coroa’’, que são as tranças que eles faziam, e hoje essa cultura está voltando “, disse.

Trabalho virou a renda de muitas meninas no Acre/Cedida

O que gosta de fazer se tornou sua fonte de renda. Os primeiros clientes foram surgindo e indicando para outras pessoas, aumentando assim a demanda. Mas a procura não é feita somente por mulheres pretas. “Minha primeira cliente era branca. Ela gostou muito, ficou dois meses com a trança e eu também gostei muito de ter feito. Tem brancas de cabelo crespo, cacheado que também usam trança”, expõe.

Ela ressalta ainda que várias pessoas ainda têm receio e perguntam se branco também pode fazer. Ray acredita que toda mulher tem direito de fazer o que quer no cabelo e no corpo, desde que não leve isso somente como uma estética, e sim, mostre sobre a história das tranças.

Ainda de acordo com Rayane, a trança é muito utilizada por pessoas que passam pela transição capilar, o processo de sair do cabelo liso e voltar para o cabelo cacheado. “Muitas pessoas se libertam do liso, da pressão que existe para se enquadrar em um padrão e iniciam a transição capilar, mas alguns de início não se aceitam assim tão rápido e se refugiam nas tranças’’, declara.

Ela está desde 2017 fazendo o que gosta e a dica que dá para quem deseja começar é não ligar para a opinião das pessoas, procurar entender a história, procurar modelos, fazer curso e, principalmente, amar o que faz. ‘’Aqui em Rio Branco tem várias e várias trancistas que estão se aprimorando mais, fazendo curso e isso é bem interessante porque antes era difícil de encontrar’’, completa.

“Muitas pessoas se libertam do liso, da pressão que existe para se enquadrar em um padrão”, disse a trancista/Cedida

Rayane relata que o processo de virar trancista foi difícil no começo devido ao preconceito sofrido. Atualmente, apesar das inúmeras informações existentes, ainda há muito preconceito e quem olhe com desprezo para quem usa tranças. “Principalmente com quem usa cabelo crespo. Mas é a nossa coroa, a gente não pode querer alisar somente para tentar se enquadrar em um padrão. É muito importante combater o preconceito, que às vezes vem da própria família, é por isso que muitas meninas que eu atendia acabavam alisando o cabelo e entrando em transição novamente. Mexia muito com o emocional’’, conclui.

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