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Caos ambiental: como o garimpo pode potencializar os estragos da crise climática no Acre

Por Vitor Paiva, ContilNet

O garimpo vem aumentando na Amazônia nos últimos anos, principalmente dentro de terras de preservação ou reservas ambientais, com mais de 80 mil pontos de garimpo no bioma, apenas no Brasil. Isso é o que aponta nota técnica publicada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, referente ao mês de abril de 2024.

Atualmente uma área de 241.019 hectares encontra-se diretamente afetada por garimpos na Amazônia brasileira, com os estados mais afetados sendo Roraima, Pará, Mato Grosso e Rondônia.

As terras indígenas também são impactadas na região amazônica, representando mais de 10% da área total em hectares de garimpo ilegal, totalizando 25.070 hectares. Desde o ano em que os monitoramentos começaram, foi registrado um aumento no garimpo ilegal na região amazônica de 12 vezes, entre 1985 e 2022, passando de 18.619 hectares para os  241.019 já citados, ou seja, apenas a parcela de garimpo dentro de terras indígenas atualmente já é maior do que o registrado em sua totalidade no princípio da observação.

O pico deste crescimento se deu entre os anos de 2016 e 2022, quando cresceu 361% dentro das terras indígenas e 96% em outras partes do bioma. Entre os anos de 2015 e 2020, foram extraídos de maneira ilegal 200 toneladas de ouro do Amazônia como um todo.

Entre os anos de 2016 e 2022, quando cresceu 361% dentro das terras indígenas/Foto:Foto: Victor Moriyama / ISA

 Ao contrário do que se imagina, existe sim, garimpo legal dentro do bioma, entretanto, não com os materiais vistos comumente, como os metais preciosos, e sim com outros tipo de materiais, como, por exemplo, a areia. 

Em 2022, ano de corte utilizado pela pesquisa, o material foi o mais extraído no estado, movimentando aproximadamente R$12 milhões anuais.

Pesquisas financiadas pelo World Wide Fund for Nature (WWF) mostram os possíveis impactos do garimpo feito de maneira descontrolada e ilegal pode causar à natureza e as populações que moram nela.

O mercúrio, que é amplamente usado na extração de ouro, por exemplo, pode afetar as águas e impactar na cadeia alimentar, atingindo o homem e causando problemas neurológicos sensitivos e motores. 

Mas se engana quem pensa que apenas o garimpo visando o enriquecimento bruto de maneira ilegal é o responsável pelos números alarmantes. Muitas famílias têm sido fortemente afetadas pelas cheias presenciadas nos últimos anos, e com seu extremo oposto, as secas cada vez mais severas, perdem seus principais meios de sustento.

Em Rio Branco os níveis registrados pelo rio Acre já preocupam, estando a menos de 50 centímetros de sua marca histórica, com o registro desta quarta-feira (17), sendo de  1,68 metro, enquanto o menor registro foi em setembro de 2022, quando atingiu 1,12 metro.

O mercúrio é usado para separar ouro de outros elementos durante o garimpo/Foto: GETTY IMAGES/BBC

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Porém, o estado não é o único afetado pela mudança do clima. Outras partes da Amazônia já sentem seu impacto, é isso que conta a presidente da associação da comunidade Terra Firme, em Porto Velho (RO), Maria de Fátima, ao site racismoambiental.net.

“A situação está alarmante, porque as comunidades dependem do rio para se deslocar, se alimentar, pra tudo. E também não temos condição nenhuma de consumir a água nem os peixes do Rio Madeira, por causa da poluição do mercúrio dos garimpos”, conta ela.

Do outro lado do rio Madeira fica o município de Humaitá, no estado do Amazonas, onde parte da comunidade afirma que o garimpo só irá atrasar um problema maior, pois conseguem sustento para agora, mas acabam prejudicando ainda mais os leitos de água a longo prazo.

“O rio acaba morrendo do mesmo jeito, porque as explosões destroem tudo e também contaminam a água com os produtos químicos. Tem pessoas até com a saúde mental afetada, porque estão sem alternativa para sobreviver”, diz a comunidade local ao site.

Chegando ainda mais perto dos acreanos está Boca do Acre, também no Amazonas, onde acampamentos de garimpo ilegal foram desmontados, a menos de um ano.

Na operação do desmonte, participaram  agentes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis do Acre (Ibama-AC), Força Nacional, Polícia Militar Ambiental  do Acre, Secretaria Municipal de Meio do Acre, Instituto de Administração Penitenciária (IAPEN), Grupo de Especial de Fronteira da SEJUSP-AC (GFRON) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Já foram encontrados peixes no Acre com mais de 40% de mercúrio acima do permitido pela OMS/ Foto: Reprodução

No local, foram encontradas motocicletas, motosserras, combustível e suprimentos, além disso, alguns dos presos na ocasião já eram conhecidos da Justiça por desmatarem áreas de maneira indevida.

E de fato, os efeitos do garimpo nas diversas “amazônias”, já pode ser sentido no estado do Acre, onde a população vem adoecendo.  Uma mulher, que não quis ter seu nome divulgado, relatou que sua mãe, de 78 anos, tinha altas taxas de mercúrio no sangue.

Em maio de 2023 um grupo de pesquisadores, oriundos de diversas instituições diferentes, apontou que no Acre, os peixes apresentavam níveis de contaminação 35,9% acima do limite tolerável, que é de de ≥ 0,5 µg/g, segundo a Organização Mundial da Saúde, mercúrio este potencialmente ligado ao garimpo irregular.

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Em caso de contaminação pelo mercúrio, procure um médico.  Os principais sintomas são: fraqueza, cansaço frequente; perda do apetite; úlcera no estômago ou no duodeno; alteração do funcionamento dos rins; dentes fracos e quebradiços, podendo haver tendência à queda; irritação e inchaço na pele quando há contato direto com o mercúrio.

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