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Neto de Darli Alves, o mandante do assassinato de Chico Mendes, teme morrer no presídio e escreve cartas

Por Tião Maia, ContilNet

O mais perigoso membro do clã Alves da Silva, que ficou internacionalmente conhecido como assassinos a partir do assassinato do líder sindical e ambientalista Chico Mendes, em dezembro de 1988, em Xapuri, é um homem marcado para morrer e está pedindo ajuda às autoridades da área de defesa dos direitos humanos para não morrer. Artur Ramoile Alves da Silva, de 37 anos, conhecido por “Russo”, é neto do fazendeiro Darli Alves da Silva, apontado como o mandante da execução de Chico Mendes. Cumpre pena superior a 50 anos de prisão no presídio estadual “Francisco D’Oliveira Conde” e vem denunciando que está marcado para morrer.

Artur Ramoile Alves da Silva e Silva é neto de Darli Alves, acusado de ser o mandante do assassinato de Chico Mendes/Foto: Reprodução

Quem quer matá-lo, segundo o preso, são membros das duas facções cujos membros também cumprem pena no presídio, o CV (Comando Vermelho) e PCC (Primeiro Comando da Capital), que no Acre age sob o nome “Bonde dos 13”. “Russo” caiu em desgraça junto aos dois grupos criminosos e revela que só está vivo ainda porque conseguiu abrigo no pavilhão “Q”, do presídio, onde ficam presos que se convertem ao Evangelho de Cristo e deixam de ter contato com os faccionados. Os membros das facções ficam divididos em grupos com os quais se identificam, nos pavilhões H e L.

“Se eu bater de volta em qualquer um desses dois, morro na certa”, diz Russo em cartas que ele conseguiu enviar a jornalistas, nas quais expõe sua agonia. Diz, entre outras coisas, que de fato fez coisas erradas e que está disposto a pagar sua pena e que está preso há 16 anos, sofrendo torturas físicas e psicológicas. Mas agora, além disso, corre risco de morrer porque membros das duas facções, inclusive da sua (CV), querem pegá-lo. “Russo” diz ainda que fez a denúncia por ter ficado sabendo que a direção do presídio quer mandá-lo de volta para o chamado “Chapão”, onde ficam também os presos mais perigosos, exatamente aqueles que querem executá-lo.

“Russo” teve a vida cercada de crimes, tanto os que ele cometia quanto aqueles praticados por membros de sua família. Além da família envolvida com crimes de pistolagem, há pelo menos duas décadas, quando ainda era jovem, ele decidiu entrar para o Comando Vermelho e ajudou a propagar a facção pelo Acre.

No mundo do crime, Artur é conhecido como Russo e seria a oitava pessoa batizada ou filiada no CV no estado. O padrinho de Russo dentro da facção é o criminoso Deibson Cabral, o Tatu, de 33 anos, um dos fugitivos da Penitenciária Federal de Mossoró (RN) em fevereiro deste ano. Em seguida, o próprio Russo passou a batizar outros membros do grupo, segundo um organograma feito pelo Ministério Público do Acre (MPAC), quando o denunciou por assaltos e organização criminosa. De acordo com o MPAC, todos os batizados na organização criminosa têm um “padrinho”, que é o criminoso anterior e que já faz parte da facção, o qual endossa a entrada do novo membro.

Neto do assassino de Chico Mendes virou importante membro do CV/Foto: Reprodução

Relatório de inteligência do Ministério Público do Acre descreve Artur Ramoile como um “importante faccionado” do CV. “Verificou-se ainda que Russo referendou (apadrinhou) o ingresso de outros faccionados, contribuindo assim para o crescimento da organização criminosa”, diz trecho do relatório, que é baseado em documentos do Comando Vermelho encontrados no celular de um membro do grupo.

Para o Ministério Público, Deibson e Artur estão entre os fundadores da facção criminosa no Acre. Os dois já foram condenados por organização criminosa por causa do vínculo com o CV.

Desde a adolescência, Russo coleciona casos de latrocínio, que é o roubo seguido de morte, assassinatos, assaltos e tentativas de fuga do sistema prisional, onde ele segue preso.

Uma conversa interceptada pela Polícia Civil do Acre entre duas mulheres ligadas ao Comando Vermelho, em 2018, revelou que Russo teria discordado do conselho da facção e sido agredido por conta disso.

De acordo com relatório da interceptação, uma das mulheres relata que membros da facção estavam planejando uma fuga do presídio estadual de segurança máxima Antônio Amaro Alves, mas o plano teria sido abortado por conselheiros do CV.

“Os caras iam fugir e o irmão do conselho pegou ele. Foi um bagulho doido. Ele (Russo) contou quase chorando, porque ele (Russo) é da lei dos trinta, não sai da cadeia mais. Ele contou assim: ‘Esse Comando Vermelho é uma farsa’. Eu vi ódio na cara dele. Os irmãos do conselho pegaram ele pelo pescoço, e ele não pôde reagir porque o João, que é um dos conselheiros, estava com uma faca para furar ele”, descreveu uma das mulheres na conversa.

Artur foi apreendido quando tinha 17 anos em Xapuri (AC), acusado de matar o estudante Raele Lorenzone. Na época, a mãe da vítima disse que o crime foi anunciado: “Ele disse que ia matar meu filho e matou. Avisei a polícia, mas ninguém levou a sério”, denunciou a mulher na época.

Já maior de idade, Artur foi condenado a mais de 50 anos de prisão por dois latrocínios com arma de fogo, que foram cometidos em um mesmo final de semana. Morreram o gerente de loja de roupas Carlos Luiz da Silva e o vendedor de frutas Raimundo Lustosa Leão, nos dias 28 de fevereiro e 1º de março de 2009.

A juíza que o condenou na época foi Denise Castelo Bonfim, hoje desembargadora do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC). Na sentença da época, ela o descreve como frio e perigoso. “A personalidade do réu é de pessoa violenta e destituída de um mínimo de solidariedade, com total desprezo à dignidade e à vida humana”, escreveu a então juíza de primeiro grau.

Além da fuga frustrada pelo próprio Comando Vermelho, Artur Ramoile tentou escapar da prisão pelo menos outras duas vezes. Na manhã de 11 de janeiro de 2016, ele e outros sete presos serraram as grades do presídio estadual, mas foram contidos por uma equipe de agentes prisionais.

Já em 2013, Artur e um outro detento aguardavam uma audiência na cela do Fórum de Rio Branco, capital do Acre, e saíram correndo algemados quando a polícia abriu as grades. Artur acabou caindo e foi recapturado.

Em uma entrevista para a TV Record em 2015, quando foi acusado de tentar matar um outro detento durante o banho de sol, batendo a cabeça da vítima contra o concreto e deixando-a em estado grave, Russo aproveitou a câmera ligada para reclamar do sistema prisional.

“Ao contrário do que o policial civil ali acabou de falar, o presídio não recupera ninguém. O Estado não se esforça para recuperar ninguém. A realidade é essa, nem a nossa comida que a família compra eles deixam entrar. É perseguição contra preso, contra visita do preso, e ainda somos taxados de monstros por todo mundo”, reclamou.

O fazendeiro Darli Alves e o filho Darci Alves Pereira foram condenados em 1990 por matar Chico Mendes com uma escopeta. Darli foi apontado como o mandante e o filho o executor. O fazendeiro era conhecido por ser um grileiro na região.

Familiares de Artur dizem que os crimes cometidos por ele não têm qualquer ligação com a condenação do avô. A mãe de Artur é uma das filhas de Darli.

O Iapen (Instituto de Administração Penitenciária), que administra os presídios acreanos, requisitou a correspondência do presidiário, na qual ele também denuncia torturas que seriam praticadas por agentes da Polícia Penal. A correspondência já foi entregue à instituição.

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