Cansados de jornadas exaustivas, falta de reconhecimento e desrespeito a direitos básicos, muitos trabalhadores brasileiros estão adotando o quiet quitting — a chamada “demissão silenciosa”, que nada mais é do que a recusa de ir além do que o cargo exige. A prática, que ganhou força nos Estados Unidos e se espalhou pelo mundo, agora atinge em cheio o Brasil, especialmente entre os mais jovens.
Segundo uma pesquisa publicada pela Forbes em 2023, 12% dos profissionais brasileiros já aderiram ao “quiet quitting”, sendo a maioria assistentes e analistas entre 25 e 34 anos. Em vez de pedir demissão formalmente, essas pessoas seguem trabalhando, mas sem se submeter a sobrecargas ou funções que não correspondem ao cargo — tudo em nome da saúde mental e do equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

O quiet quitting pode parecer um ato de desengajamento, mas, na verdade, é um sinal de alerta/Foto: Ilustrativa/Reprodução
É o caso de Loren Vitória, que passou pela experiência enquanto trabalhava em uma loja de departamentos. Com apenas 21 anos na época, ela enfrentou situações que comprometeram diretamente sua saúde física e emocional.
“Infelizmente, essas condições afetaram bastante minha saúde física e mental”, conta Loren. “Ficar horas sem poder ir ao banheiro me causava muito desconforto e mal-estar. Com relação à alimentação, o intervalo curto, somado às horas de trabalho, me deixava constantemente sem energia, com dificuldade de concentração. Isso acabou piorando o meu quadro de gastrite, gerando estresse acumulado, ansiedade e até episódios de insônia. Meu desempenho na faculdade caiu, e eu comecei a sentir como se minha saúde não importasse para a empresa, só o resultado do meu trabalho.”
Loren ocupava uma função de base na loja, mas logo percebeu que as tarefas se acumulavam bem além do que constava no seu contrato.
“Sim, acho que minha posição na loja ajudou a aumentar a quantidade de tarefas além do que era minha função de verdade. Como era meu primeiro emprego, eu queria mostrar serviço e acabava aceitando tudo.”
A virada de chave aconteceu quando ela entendeu que continuar naquele ritmo comprometeria sua saúde a longo prazo. Foi aí que decidiu “sair em silêncio” e cuidar de si mesma.
“Mesmo sendo meu primeiro emprego, percebi que não podia deixar minha saúde de lado. Precisava pensar se aquilo valia a pena pra mim. Comecei a me sentir muito mal fisicamente, e isso afetou também meu psicológico. Foi quando decidi que precisava priorizar meu bem-estar.”
Essa postura está cada vez mais presente entre os jovens brasileiros, que encaram o trabalho com outros olhos. Diferente das gerações anteriores, que muitas vezes viam a dedicação total como sinônimo de sucesso, a geração Z quer crescer, sim — mas não a qualquer custo.
“Acho que a minha geração está enxergando o trabalho de um jeito diferente. A gente valoriza o esforço, mas também a vida pessoal, a saúde mental. Estabelecer limites no ambiente profissional não é falta de comprometimento — é uma forma de se respeitar.”
Hoje, fora do antigo emprego, Loren se sente mais segura, consciente e seletiva com relação ao que deseja para o futuro.
“Depois que saí, minha qualidade de vida melhorou bastante. Passei a dormir melhor, me alimentar direito e cuidar mais da minha saúde e dos estudos. Hoje, antes de aceitar qualquer vaga, observo se a empresa respeita limites, valoriza os funcionários e oferece um ambiente saudável. Aprendi que a gente precisa se valorizar.”
A história de Loren reflete uma mudança cultural silenciosa, mas potente, que desafia o modelo tradicional de trabalho. O quiet quitting pode parecer um ato de desengajamento, mas, na verdade, é um sinal de alerta: os profissionais estão pedindo, ainda que em silêncio, por respeito, saúde e dignidade.