Nas eleições municipais de 2024, o Partido Liberal (PL), associado à direita conservadora e conhecido por suas posições rígidas em questões sociais, surpreendeu ao registrar 29 candidatos transgêneros. Esse número representa uma significativa quebra de expectativa, dada a reputação do PL como um partido com um perfil conservador em relação à diversidade de gênero.
A inclusão de candidatos trans no PL é notável não apenas pelo contraste com a postura conservadora do partido, mas também pela sua relevância dentro do contexto mais amplo das eleições deste ano.
O PT, por exemplo, lidera com 121 candidatos transgêneros, refletindo sua postura inclusiva. Em comparação, o PL demonstra uma abordagem mais equilibrada, incorporando diversidade enquanto mantém suas principais pautas conservadoras.
Números
A Justiça Eleitoral tornou obrigatória a inclusão de informações sobre identidade de gênero no registro de candidatos nesta eleição, o que trouxe à tona a diversidade dos candidatos em vários partidos.
Além do PL, outros partidos também apresentaram números significativos de candidatos transgêneros.
O PSD, com 97 candidatos, e o PSol, com 63, seguem na dianteira, refletindo o crescente reconhecimento e inclusão de diversas identidades de gênero na política.
O número total de candidatos transgêneros para as eleições municipais deste ano, segundo informações obtidas no Metrópoles, é de 963, representando 0,21% do total de 455.752 candidatos para os cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador.
Este dado sublinha a crescente visibilidade e representação política de pessoas trans, que foram historicamente sub-representadas.
Mudanças
Além de representar uma mudança na composição política do PL, a inclusão de candidatos trans também pode sinalizar um movimento mais amplo dentro da política brasileira. A presença de candidatos trans em um partido com uma base conservadora indica uma diversificação que pode refletir esforços para engajar um eleitorado mais amplo e diversificado.
A participação crescente de pessoas trans nas eleições municipais de 2024 é uma vitória significativa para a comunidade LGBTQIA+ e um passo importante em direção a uma maior representação e inclusão política.
Embora a motivação para essa inclusão possa variar, o impacto positivo é inegável, promovendo uma maior diversidade de vozes e perspectivas na política nacional.
O Programa Voto Com Orgulho e outras iniciativas de mapeamento têm documentado e celebrado o aumento das candidaturas LGBTQIA+, com destaque para o papel crescente das pessoas trans na política.
A inclusão de candidatos trans no PL, portanto, não é apenas uma questão de estratégia partidária, mas um reflexo de uma sociedade em transformação que está cada vez mais reconhecendo e valorizando a diversidade.
Este fenômeno sugere uma dinâmica política em evolução no Brasil, onde a diversidade é gradualmente sendo integrada nas esferas de poder, desafiando as expectativas e promovendo uma maior representação de todas as identidades na arena política.
Estes dados podem ser vistos como surpreendentes e até um choque devido ao histórico do partido e suas posições políticas. Aqui estão alguns pontos que ajudam a explicar por que essa inclusão é considerada um contraste significativo:
1. Histórico de posturas conservadoras e transfóbicas
O PL, liderado por figuras como Jair Bolsonaro, tem uma trajetória de posições conservadoras e, em alguns casos, transfóbicas.
Diversos candidatos do partido são conhecidos por suas declarações e posturas controversas em relação às pessoas trans e à comunidade LGBTQIA+ em geral. Essas posturas frequentemente incluem uma resistência a políticas que promovem a inclusão e os direitos trans.
Nikolas Ferreira (PL) é um dos políticos que comumente está envolvido em casos de transfobia e homofobia, o que reforça o posicionamento conservador forte pelo partido. Atualmente, ele exerce o mandato de deputado federal pelo estado de Minas Gerais.
Relembre casos de transfobia:
- Erika Hilton processa Nikolas Ferreira e pede R$ 5 milhões por transfobia
- Nikolas Ferreira defende que empresas discriminem LGBT: “Não é homofobia”
- Justiça mantém condenação de Nikolas Ferreira a pagamento de R$ 30 mil a Duda Salabert
- Deputado que fez discurso transfóbico na Câmara poderá ser cassado
2. Contraste com a agenda conservadora
A inclusão de candidatos transgêneros pelo PL parece contrastar fortemente com a agenda conservadora do partido.
Partidos conservadores tendem a adotar posturas mais rígidas em relação às questões de gênero e sexualidade, priorizando valores tradicionais e muitas vezes demonstrando resistência a políticas de inclusão, além de trazer com frequência um posicionamento religioso forte e realizar agendas em igrejas, que seguem valores morais de uma “família tradicional” levando em consideração passagens bíblicas e criando crenças limitantes.
É válido lembrar que é vedada a realização de propaganda eleitoral em bens de uso comum, sobretudo no caso de igrejas e de templos religiosos. A regra é estabelecida no art. 37, parágrafo 4º, da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97).
Portanto, ver um partido como o PL, associado a essa linha política, registrar uma quantidade significativa de candidatos transgêneros pode parecer um desvio inesperado.
3. Mudança de estratégia política
Esse movimento pode ser interpretado como uma tentativa estratégica do PL para diversificar seu perfil e ampliar sua base de apoio.
Em um cenário político em que a diversidade está se tornando um aspecto cada vez mais valorizado, partidos políticos podem buscar adaptar suas estratégias para refletir e representar uma gama mais ampla de identidades e experiências.
A inclusão de candidatos trans pode ser vista como uma tentativa de modernizar a imagem do partido e atrair eleitores que valorizam a diversidade, mesmo que isso vá contra o histórico e as posições tradicionais do partido.
4. Impacto na percepção pública
Isso pode alterar a percepção pública sobre o partido e sua abordagem às questões de gênero. Para muitos, essa inclusão pode ser vista como uma tentativa de reconciliação com uma imagem pública negativa em relação às questões de diversidade e inclusão.
Isso pode também sinalizar uma mudança na forma como o partido pretende se posicionar no cenário político, possivelmente em resposta a pressões sociais e políticas.
5. Desafios e oportunidades
Embora a inclusão de candidatos trans possa ser uma vitória para a comunidade trans, também levanta questões sobre a sinceridade do compromisso do PL com a inclusão.
A divergência entre a inclusão de candidatos trans e o histórico de posturas conservadoras do partido pode levar a debates sobre a verdadeira motivação por trás dessa decisão e como esses candidatos serão apoiados e representados dentro do partido.
Em resumo, a surpresa com a inclusão de candidatos transgêneros pelo PL é alimentada pela discrepância entre a identidade histórica do partido e a nova abordagem representada por esses candidatos.
Essa mudança pode refletir uma tentativa de o partido se adaptar às novas demandas políticas e sociais, mesmo que isso desafie suas tradições e posturas anteriores.