Tensão no Acre: entenda a operação em Resex que parou BR e gerou polêmicas e ameaças

A Resex Chico Mendes tem sido apontada como a reserva extrativista mais desmatada do Brasil

A Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, no Acre, se tornou o epicentro de uma intensa disputa e de uma crise ambiental e social após o início da Operação Suçuarana, deflagrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) no último dia 5 de junho.

Operação iniciou no dia 5 de junho/Foto: Reprodução

A ação, que visa coibir ilícitos ambientais dentro da unidade de conservação, especialmente o desmatamento e a criação ilegal de gado, gerou uma onda de protestos, com estradas bloqueadas e acusações de abuso de poder por parte dos produtores rurais.

A situação se agravou nesta sexta-feira (13), com a interdição total da BR-317, a principal via de acesso à região, impactando diretamente o fluxo de pessoas e mercadorias. A operação não tem data para finalizar.

Operação Suçuarana: ICMBio executa retirada de 400 cabeças de gado ilegais  dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes — Instituto Chico Mendes de  Conservação da Biodiversidade

Operação Suçuarana: ICMBio executa retirada de 400 cabeças de gado ilegais dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes/Foto: Reprodução

O que é a Operação Suçuarana?

A Operação Suçuarana, nome que remete à onça-parda, um felino nativo da região, é uma iniciativa do ICMBio para fiscalizar e combater atividades ilegais que comprometem a integridade da Reserva Extrativista Chico Mendes. Vale ressaltar que a Resex Chico Mendes tem sido apontada como a reserva extrativista mais desmatada do Brasil.

Operação Suçuarana: ICMBio executa retirada de 400 cabeças de gado ilegais  dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes — Instituto Chico Mendes de  Conservação da Biodiversidade

A operação não tem data para finalizar/Foto: Reprodução

De acordo com o ICMBio, a operação foca na coibição do desmatamento para a formação de pastagens, na criação de gado em áreas não permitidas e na exploração ilegal de madeira. O objetivo primordial é garantir a proteção da biodiversidade local, o uso sustentável dos recursos naturais e a manutenção da qualidade de vida das comunidades extrativistas tradicionais que vivem na Resex, em conformidade com o plano de manejo da unidade.

Polêmicas e acusações de abuso

Desde o seu início, a Operação Suçuarana tem sido alvo de severas críticas e denúncias por parte dos produtores rurais da região. Eles acusam o ICMBio de agir com truculência, apreendendo gado, destruindo benfeitorias e aplicando multas consideradas exorbitantes.

Manifestantes em protesto na BR-317/Foto: Raylanderson Frota

“Eles chegaram sem avisar, derrubaram cerca, soltaram gado e disseram que tudo era ilegal. Vivemos aqui há décadas, cuidando da terra, e agora somos tratados como bandidos”, desabafou João Silva, produtor rural na Resex Chico Mendes. “Não somos desmatadores, apenas queremos trabalhar e sustentar nossas famílias. Onde vamos colocar esse gado agora?”.

Outra produtora, Maria Souza, relata ter tido sua pequena criação apreendida. “Eu tenho apenas algumas cabeças de gado para complementar a renda da família. Não é em grande escala, é para subsistência. Levaram tudo e me deixaram sem nada. Isso é um absurdo, uma perseguição”, disse, emocionada.

Reações das autoridades e órgãos

Em nota, o ICMBio defendeu a legalidade da operação, afirmando que está agindo em estrito cumprimento da legislação ambiental e do plano de manejo da Resex Chico Mendes.

“A Operação Suçuarana visa combater crimes ambientais que causam danos irreparáveis à biodiversidade e aos recursos naturais da reserva. As ações são pontuais e direcionadas a áreas onde há comprovação de ilícitos, como desmatamento e criação ilegal de gado em larga escala, que não se enquadram nas práticas de subsistência das comunidades extrativistas. Todas as ações são realizadas com base em rigorosas análises e em respeito aos direitos dos moradores”, declarou um porta-voz do Instituto, que preferiu não ser identificado.

Operação na Reserva Chico Mendes visa a retirada de ocupantes ilegais -  Jornal A Gazeta do Acre

Operação na Reserva Chico Mendes visa a retirada de ocupantes ilegais/Foto: Reprodução

O ICMBio reforçou que a retirada do gado ilegal na Resex Chico Mendes não afeta as famílias de extrativistas, pois a fiscalização foca em pecuaristas que atuam em grande escala e que não cumprem as normas da reserva, destacando que “os extrativistas que vivem da sua produção em pequena escala não estão sendo alvos da operação”.

O ICMBio também afirmou estar aberto ao diálogo, mas ressaltou a importância de coibir atividades que descaracterizam a finalidade da unidade de conservação.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), embora não seja o órgão responsável pela fiscalização primária dentro da Resex, manifestou apoio às ações de combate a ilícitos ambientais. O órgão afirmou que só pode suspender embargos na Reserva Extrativista Chico Mendes mediante a regularização ambiental das propriedades. Isso significa que, para haver desinterdição de áreas ou propriedades embargadas, os produtores precisam apresentar provas de que estão em conformidade com as normas ambientais. “O Ibama apoia toda e qualquer ação que vise a proteção do meio ambiente e o combate ao desmatamento ilegal no Brasil. É fundamental que as unidades de conservação sejam protegidas de atividades que comprometem sua integridade e finalidade”, disse um representante do Ibama.

Ibama defende a operação/Foto: Reprodução

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), liderado pela acreana e ministra Marina Silva, informou que está acompanhando a situação na Resex Chico Mendes e que buscará mediar o diálogo entre o ICMBio e as comunidades locais.

“É crucial que haja um equilíbrio entre a fiscalização ambiental e as necessidades das comunidades tradicionais que vivem nas unidades de conservação. Estamos em contato com o ICMBio para entender os detalhes da operação e com as lideranças locais para buscar soluções que garantam a proteção ambiental sem prejudicar o modo de vida das pessoas”, afirmou o ministério por meio de nota pública.

Políticos do Acre repudiaram ação do ICMBio

O senador Márcio Bittar fez duras críticas à Operação Suçuarana, contextualizando-a em uma visão mais ampla sobre a Amazônia. Ele alertou que “a esquerda está tomando propriedades na Amazônia”, referindo-se a essas operações do ICMBio como uma forma de desapropriação indireta.

Senador Marcio Bittar/ Foto: Reprodução

“O que está acontecendo no Acre com o ICMBio é um escândalo. Estão tirando o gado de produtores que trabalham duro, que investem e geram empregos, sob a alegação de proteção ambiental. Isso faz parte de uma agenda maior para afastar o homem do campo, da floresta, e é uma ameaça à nossa soberania e à nossa economia”, declarou o senador. Ele argumentou que as ações prejudicam a produção e a subsistência das famílias rurais.

O deputado federal Coronel Ulysses foi outro que criticou veementemente a operação. Ele denunciou as ações do ICMBio no estado, classificando-as como “desumanas” e “abusivas”.

Deputado Coronel Ulysses/Foto: Reprodução

“O ICMBio está agindo com truculência e desrespeitando as famílias de produtores rurais que vivem na Resex há anos, construíram suas vidas lá. Estão apreendendo gado, aplicando multas absurdas e expulsando pessoas sem oferecer alternativas. Isso é um absurdo e um desrespeito com quem produz no campo”, afirmou o parlamentar. O deputado ainda mencionou a intenção de propor um decreto legislativo para proteger os produtores rurais de ações que considera excessivas por parte dos órgãos ambientais.

Ameaças a Raimundão, primo de Chico Mendes

Em meio à tensão gerada pela Operação Suçuarana, o líder extrativista Raimundo Mendes de Barros, conhecido como Raimundão e primo do ambientalista Chico Mendes, passou a ser alvo de ataques e ameaças.

Raimundão é primo de Chico Mendes. Foto: Ramon Aquim

Ele é acusado por infratores ambientais de fomentar a operação do ICMBio que resultou na apreensão de gado. Áudios com ameaças, circulando em grupos de WhatsApp, chegam a insinuar que ele “procura pegar chumbo”, em uma clara alusão à morte de Chico Mendes.

Raimundão, no entanto, nega estar com medo: “Se eu tivesse medo, já tinha cavado um buraco e me enterrado”. A situação de hostilidade na região também tem causado temor em sua família, incluindo sua filha, Raiara Barros, que expressou preocupação com o clima de intimidação. O caso ganhou repercussão nacional, com a ministra Marina Silva e artistas saindo em defesa de Raimundão, pedindo proteção para o líder extrativista.

Protestos e bloqueio da BR-317

A insatisfação dos produtores e moradores da Resex Chico Mendes escalou para protestos que culminaram no bloqueio da BR-317, na altura do km 34, próximo à entrada da reserva. Desde a manhã desta sexta-feira (13), pneus, troncos de árvores e outros materiais foram usados para impedir o tráfego nos dois sentidos da rodovia, que liga a capital Rio Branco a cidades como Xapuri e Brasiléia, e também faz a ligação com a fronteira boliviana.

BR-317 está interditada pelos manifestantes/Foto: Raylanderson Frota

“Não vamos sair daqui enquanto o ICMBio não suspender essa operação e sentar para conversar com a gente”, afirmou um dos líderes do movimento. “Queremos respeito e uma solução para essa situação. A BR-317 só será liberada quando tivermos uma resposta concreta.”

O bloqueio gerou longas filas de veículos e transtornos para quem precisa transitar pela região, incluindo caminhões com mercadorias e veículos de transporte de passageiros.

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