Relutei em me manifestar sobre o assunto mais debatido nas redes sociais recentemente: a cena de uma passageira sendo filmada por uma mãe que a acusava de “ser ruim” por não ceder o assento da janela para o filho. Sinceramente, o que essa cena revela são dinâmicas emocionais que ultrapassam a superficialidade.
Tenho estudado muito sobre o comportamento e desenvolvimento humano, especialmente sobre o que há por trás desses comportamentos. Sob a perspectiva psicanalítica, podemos observar, de um lado, a dificuldade em lidar com o limite do “não” e, de outro, a maturidade emocional de quem soube manter a paciência e não alimentar o conflito.
O “não” é fundamental no desenvolvimento humano. Desde cedo, aprendemos que nem todos os nossos desejos serão atendidos, e isso não apenas molda nossa capacidade de tolerar frustrações, mas também ensina que os outros possuem desejos e direitos que coexistem com os nossos. Quando uma mãe não estabelece esse limite para seu filho, ela não apenas dificulta o aprendizado da criança, mas também demonstra a própria dificuldade em lidar com a frustração e a rejeição.
Ao filmar a passageira e expô-la nas redes sociais, a mãe extrapolou o espaço do respeito mútuo, transformando um episódio cotidiano em um ato de invasão e constrangimento. Essa atitude revela uma projeção: ao rotular a passageira como “ruim”, a mãe externalizou sua própria sensação de inadequação por não conseguir lidar com a situação de maneira madura. Por outro lado, a postura da passageira, que se manteve tranquila e não reagiu à provocação, reflete uma capacidade psíquica rara de autorregulação emocional.
Esse episódio, com certeza, já aconteceu com você em algum momento da vida. Talvez não dentro de um avião, mas em situações cotidianas onde você se relaciona com várias pessoas de gerações e culturas diversas. Dependendo de quem o julga e a partir da sua subjetividade, você também pode ser exposto.
O episódio em destaque ilustra a importância de ensinarmos às crianças e a nós mesmos que limites são inevitáveis e saudáveis. Não há problema em desejar o assento da janela, mas também é fundamental compreender que o desejo do outro pode ser igualmente legítimo. O “não” não é rejeição; é uma oportunidade de aprender a lidar com as frustrações inevitáveis da vida, uma lição que a mãe, nesse caso, perdeu a chance de ensinar ao filho e de aprender para si mesma. A paciência e a firmeza da passageira demonstram que respeitar os próprios limites, mesmo diante da pressão social, é um ato de coragem e equilíbrio. Afinal, o convívio harmonioso começa onde termina a invasão ao espaço alheio.
Como o renomado psiquiatra Augusto Cury afirma, “Saber dizer não é uma das maiores provas de maturidade emocional.” E, segundo a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, “Estabelecer limites é um ato de amor próprio e respeito ao próximo.” Essas palavras nos lembram que, ao respeitarmos nossos próprios limites e os dos outros, construímos relações mais saudáveis e equilibradas.
Tenhamos limites!