Em conversa com o advogado de defesa, gravada em vídeo, obtido pelo Metrópoles, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, fala sobre o papel que exercia de mediador de conflitos, quando ainda cumpria pena em São Paulo, e como se tornou o líder máximo do Primeiro Comando da Capital (PCC). Ele também menciona a “amizade” com um diretor do Carandiru, palco da maior matança da história do sistema carcerário paulista, promovida por agentes estatais.
No registro, feito em 2022 (assista abaixo), Marcola comenta sobre a atuação dele para apaziguar os ânimos no sistema prisional, a pedido do diretor do Carandiru na ocasião, Guilherme Silveira Rodrigues. Atualmente aposentado, o ex-diretor foi procurado pela reportagem, sem sucesso. O espaço segue aberto para manifestações.
“Esse diretor, ele sempre gostou de mim como um filho. Porque eu conseguia acalmar toda a cadeia dele, que era [ocupada] por muito assassino junto. Não morria ninguém, não acontecia nada quando eu estava lá. Então, ele me tratava mesmo muito bem.”
Marcola conta que, na suposta conversa com o diretor do presídio, afirmou que iria “segurar as pontas” em relação ao controle da massa carcerária, “mas com uma condição”: a transferência dele para outro estado. “Esse doutor Guilherme conseguiu, [indo] atrás da Secretaria da Segurança Pública [SSP], uma transferência para mim em Ijuí, no Rio Grande do Sul.”
Vídeo
Estratégia de defesa
Marcola fala ao advogado a respeito de Guilherme Silveira e conta o motivo pelo qual o defensor deve procurar o ex-diretor de presídio. A ideia é convidá-lo a testemunhar favoravelmente ao nº 1 da facção em um processo de homicídio em que Marcola e o advogado traçam uma estratégia de defesa.
O líder máximo do PCC foi condenado a 152 anos de prisão por causa de oito homicídios, ocorridos durante uma rebelião, em fevereiro de 2001 no Carandiru, zona norte paulistana. Apesar de não ter concretizado a chacina, a Justiça acolheu denúncia do Ministério Público de São Paulo (MPSP), que apontou Marcola como mandante dos assassinatos. As vítimas eram integrantes da facção rival Seita Satânica.
Na época das mortes, Marcola já estava no sistema carcerário gaúcho, dois dias antes da deflagração da primeira megarrebelião, promovida pelo PCC em 29 presídios paulistas. Oficialmente, atribuiu-se à transferência dele e de outras lideranças da facção o motivo para o motim generalizado – argumento refutado por Marcola ao advogado.
“Eu que fiz esse pedido [de transferência], junto com ele [Guilherme Silveira]. Mas aí falam que as rebeliões foram uma retaliação para a minha transferência para Ijuí, sendo que eu que pedi para ir [para lá].”
Marcola diz ainda que, após atribuírem-lhe responsabilidade pela rebelião, além das mortes, ele foi mantido “só trancado”, por um ano, na Penitenciária Federal da Papuda (DF), onde permaneceu confinado até 9 de fevereiro de 2002.
Execução da esposa
Após isso, ele retornou ao sistema carcerário paulista, onde soube, em 22 de outubro do mesmo ano, do assassinato de sua então esposa, a advogada Ana Maria Olivatto Herbas Camacho, de 45 anos. Marcola atribui o homicídio da companheira a “esses aí”, referindo-se a pessoas ligadas a dois fundadores do PCC: José Márcio Felício, o Geleião, e César Augusto Roriz da Silva, 0 Cesinha.
Geleião também fez uma delação premiada, em 2003, num momento no qual esse dispositivo não era comum no Brasil. Isso, aliado à morte da companheira, balançou Marcola.
“Aí que me tornei o chefe no negócio, porque antes disso eu não era chefe de nada, eu não era nem líder.”
Pessoas ligadas à morte de Ana Olivato foram encontradas por parceiros de Marcola e mortas.
Cesinha e Geleião foram depostos do PCC em 2002, a mando de Marcola, que passou a considerá-los inimigos. Cesinha foi assassinado em 2006. Geleião morreu de Covid-19 em maio de 2021.
Desde então, Marcola mantém o posto máximo da maior facção criminosa do Brasil, na qual implementou um esquema empresarial, que gera bilhões de reais anualmente, por meio do tráfico internacional de cocaína.