Mecânico morre por Covid-19 dois dias depois do filho ter alta da doença

Em menos de 48 horas, uma família de Sorocaba (SP) foi da gratidão ao luto. Aos 69 anos, o mecânico Narcizo Gonçalves da Silva morreu por infecção do coronavírus depois que o filho deixou a Santa Casa da cidade sob aplausos pela recuperação da Covid-19.

A saída de Rogério Gonçalves da Silva, de 36 anos, um entre os quatro irmãos, foi registrada em vídeo. As imagens compartilhadas na rede social do hospital mostravam o paciente sendo levado à porta, em um corredor com médicos e enfermeiros perfilados. Em uma mão ele segurava a placa e a outra fazia o sinal de “positivo”.

Na madrugada de sexta-feira (8), a família do rapaz recebeu uma ligação do mesmo hospital, informando que o pai, Narcizo, não resistiu à doença e seria a 25ª morte registrada na cidade.

Ao G1, Andressa Aparecida Lopes França, a irmã mais nova de Rogério e filha de Narcizo, lembrou os últimos momentos do pai e a luta contra a doença, que chegou silenciosa e infectou quatro parentes.

“Parece que ele estava esperando meu irmão sair do hospital para poder se despedir. Ele não pôde ser enterrado com dignidade, estava dentro do plástico e levamos uma troca de roupa para colocar dentro do caixão para simbolizar”, disse.

Primeiros sintomas

O mecânico completou 69 anos em 5 de abril. Na ocasião, todos estavam cumprindo isolamento e apenas os filhos participaram em um almoço em família. Segundo Andressa, ninguém apresentava os sintomas.

Na mesma semana, o idoso saiu de casa para se vacinar contra a gripe. Dias depois, ele começou a sentir dores no corpo e febre quando foi levado pela família a uma unidade de saúde na zona norte da cidade.

De acordo com a filha, o idoso foi transferido como caso suspeito de coronavírus para outra unidade na zona leste, foi medicado e voltou para casa.

“Na quinta-feira a minha mãe ligou desesperada e disse que meu pai estava muito ruim, que estava precisando fazer inalação, porque estava ficando com falta de ar”, lembra.

Já debilitado e sem confirmação do coronavírus, o idoso foi novamente levado à UPH Zona Leste e foi transferido para a Santa Casa. A internação foi registrada no dia 24 de abril, quando foi intubado e colocado em coma induzido.

Com o passar dos dias, a situação se agravou e o vírus, segundo Andressa, pode ter afetado os rins.

“Foi fumante desde adolescente, mas havia parado há 20 anos. Os rins ficaram comprometidos e teve a confirmação de Covid-19. Fizeram sessões de hemodiálise, porque estava com muito potássio acumulado.”

‘Não teve chance de lutar’

Enquanto o pai lutava pela vida, Andressa também viu o irmão apresentar os sintomas e ser internado. Ao perceber a situação, a família dobrou as medidas de contenção para evitar que a mãe e outra irmã, que moravam na mesma casa com os dois pacientes, não fossem infectadas.

“Você receber a notícia do positivo é assustador. É um sentimento de desespero, porque o que você sabe é que a doença está ali [no paciente] e ela vai tentar fazer de tudo para destruir a vida daquela pessoa.

O óbito do paciente foi registrado 00h20 de sexta-feira ao sofrer uma parada cardíaca. O sepultamento foi feito no cemitério Memorial Park, sem velório e com os filhos e esposa distantes.

“Eu queria chegar na casa do meu pai e poder cumprimentar ele no portão e ouvir a voz dele no telefone. Eu não posso. Mas a doença é tão maldita que acabou com a vida do meu pai, acabou com a nossa vida de uma forma que a gente não deseja para ninguém. Não teve chance de lutar”, desabafou.

Mecânico morreu de Covid-19 durante internação na Santa Casa de Sorocaba — Foto: Arquivo Pessoal
Mecânico morreu de Covid-19 durante internação na Santa Casa de Sorocaba — Foto: Arquivo Pessoal

‘Fechadão e de coração bom’

O paciente, que foi uma das mais de 11 mil mortes registradas no país até a manhã desta segunda-feira (11), morava no bairro Guaíba, na zona norte, com a esposa e dois dos quatro filhos.

“Era fechadão, mas tinha um coração muito bom. Sempre foi um homem muito trabalhador, um pai presente que trabalhou na roça e foi muito companheiro da minha mãe.”

Andressa detalha que o pai atualmente procurava se dedicar à família e era considerado por eles como uma pessoa saudável com as poucas vezes que se queixou de problemas de saúde. No entanto, a idade e ação silenciosa do vírus, conforme a filha, podem ter sido fatais.

“A gente não sabe onde meu pai pegou. Não espere que um parente pegue para acreditar. A doença, ela vem escondida, pode vir com uma caminhada na praça, no parque sem máscara”, aconselhou a filha do paciente.

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