O projeto de lei (PL) encabeçado pelo vereador João Marcos Luz, do Partido Liberal (PL) que proíbe a participação de menores de 18 anos na Parada LGBTQIAP+ foi aprovado no dia 13 de novembro de 2024. Porém a decisão não repercutiu bem dentro da comunidade.
O psicólogo acreano, pesquisador e mestrando, na Universidade Federal de Minas Gerais, acerca de temáticas que envolvem a comunidade LGBTQIAP+ Wisney Berig, falou acerca de alguns simbolismos em torno da aprovação do PL.
“Falar sobre sexualidade e gênero foi associado com frequência ao pecado ou problemas, visto como algo condenável. Ao longo da história pessoas LGBT já foram mortas, simplesmente por serem LGBTs e isso sempre está em voga no Brasil. Inclusive a gente começa a perceber que os direitos da população LGBT são um elástico, eles caminham um pouco e depois logo retrocedem”, pontuou o pesquisador.
Ele aponta ainda que o respeito à comunidade nunca irá existir, se o próprio Estado não o faz, com a existência de políticas que não promovem aceitação e inclusão.
“Sabemos que a população LGBT+ vive no Brasil com precariedade de segurança de direitos e a ausência de políticas públicas que defendam essa população permite violências“ salientou Berig.
Ele diz ainda que a Parada não deveria ser posta nessa posição de algo ruim ou prejudicial, pois isso pode fomentar mais movimentos de intolerância contra a comunidade LGBTQIAP+.
“A PL coloca a Parada LGBT com uma coisa negativa, que não se pode construir com ela, especialmente na proibição de pessoas menores de idade. Colocar esta restrição me parece mais uma tentativa de vincular a parada com o pânico moral. É triste que uma pessoa esteja no poder, queira cercear a liberdade individual da ida á uma manifestação digna e necessária à sociedade”, diz Berig.
Ele ainda aponta que é necessário pensar que não vivemos sozinhos em sociedade, que estamos em “relação com outras pessoas que antes de tudo, são diferentes”.
O pesquisador ainda fala sobre o protecionismo existente com crianças e adolescentes, por um pânico moral que, na realidade, é usado como maneira de perpetuar preconceitos existentes relativos à comunidade.
“É comum a gente ouvir pessoas que falam assim ‘ai eu respeito, eu amo vocês., mas (incluir) as crianças já é demais’, justamente por terem uma ideia de que crianças estão longe destas discussões. É importante lembrar que crianças não são apêndices de suas famílias, sendo sujeitos separados e dotados de vontades, e podem ir pra um movimento como a Parada LGBT”.
Além disso, é importante ressaltar que questões envolvendo gênero e sexualidade não surgem apenas depois da maior idade penal, é algo natural, intrínseco ao ser humano e se desenvolve de maneira orgânica ao longo da vida, podendo já estar presentes durante a infância e adolescência.
Berig ressalta ainda que é importante sim crianças e adolescentes terem contato com a comunidade LGBTQIAP+, como uma forma de se reconhecer.
“É importante falar das próprias crianças LGBTS, especialmente das crianças trans, porque existe um processo muito dizimador sobre esses corpos que são colocados como subalternos, desnecessários e, às vezes, a falta de contato com isso, de compreender esse movimento, faz com que algumas pessoas não entendam pessoas trans”, explicou.
Ele ainda pontua que a Parada é um espaço de pertencimento e de troca de experiências entre pessoas da comunidade, já que nem todos têm contato frequente com pessoas LGBTQIAP+, sendo uma oportunidade de buscar conselhos e se conectar com outras pessoas pertencentes ao mesmo grupo.
“A Parada ela não é só movimento político, mas também é um espaço importante, para que que as pessoas tomem conhecimento das suas questões, que possam compartilhar experiências e isso pode ser muito enriquecedor, porque nem sempre você tem uma pessoa LGBT na sua casa, na sua família, mas com certeza lá você vai encontrar alguém, ainda mais neste espaço que é de liberdade e de poder puxar de volta essa pauta, contra aqueles que sempre oprimiram essas pessoas da comunidade”, finaliza o psicólogo pesquisador.
A Associação dos Homossexuais do Acre se pronunciou acerca da decisão, através de nota oficial em seu perfil no Instagram, afirmando que o PL vai contra o artigo 5º da constituição.
“O Projeto de Lei tenta propagar o pânico moral, criminalizar o maior evento de visibilidade, defesa de direitos humanos das pessoas LGBTQIAPN+ do Acre, além de imputar a Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ e a toda uma comunidade, o estigma de perversão sexual às pessoas LGBTQIAPN+.A Constituição Federal de 1988, no artigo 5° assegura a todas as pessoas o direito de ir e vir, a matéria é inconstitucional, autoritária, logo não pode ser confundida com liberdade de expressão”, diz trecho da nota.
Confira o pronunciamento na íntegra:
“A Associação de Homossexuais do Acre- AHAC, entidade sem fins lucrativos, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos e Cidadania do Acre e do Conselho Estadual de Combate a Discriminação e Direito das Pessoas LGBTQIAPN + do Acre, que desde 2002, luta pela defesa dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, intersexos, assexuais, pansexuais e pessoas não binárias (LGBTQIAPN+) do Estado do Acre, vem a público REPUDIAR veementemente o Projeto de Lei Ordinária N° 14/2024 aprovado nesta terça-feira (13/11) pela Câmara Municipal de Rio Branco, Acre, que proibi a presença de crianças e adolescentes na Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ no município de Rio Branco-Acre.O Projeto de Lei tenta propagar o pânico moral, criminalizar o maior evento de visibilidade, defesa de direitos humanos das pessoas LGBTQIAPN+ do Acre, além de imputar a Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ e a toda uma comunidade, o estigma de perversão sexual às pessoas LGBTQIAPN+.A Constituição Federal de 1988, no artigo 5° assegura a todas as pessoas o direito de ir e vir, a matéria é inconstitucional, autoritária, logo não pode ser confundida com liberdade de expressão.A Constituição Cidadã e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por meio dos pais e/ou responsáveis, cabem zelar pela educação, proteção e integridade de crianças e adolescentes, devendo os mesmos a escolha e a decisão de ir e vir sem constrangimento ou interferência do estado, observada a legislação vigente. Ao Poder Legislativo compete fiscalizar o Executivo, propor políticas públicas que assegurem o acesso e permanência à educação, a saúde, ao emprego, lazer a cultura, de forma a construir uma sociedade inclusiva, uma cultura de paz e de respeito à diversidade e aos direitos humanos.A Associação de Homossexuais do Acre – AHAC, organizadora das Paradas do Orgulho LGBTQIAPN+ no Acre, que zela pelos direitos humanos há 22 (vinte dois) anos dessa população no Acre, vem a público solicitar ao Ministério Público Estadual do Acre – MP/AC e Ministério Público Federal no Acre – MPF/AC, a criminalização por Homofobia do autor da Lei e dos demais vereadores que votaram favoráveis no escárnio inconstitucional de um PL que só propaga cada vez mais o ódio, a aversão e a violência às pessoas LGBTQIAPN+ do Acre. Pois a homofobia é crime no Brasil desde 2019, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a lei contra o racismo também pode ser aplicada a esse tipo de discriminação.A homofobia é considerada um crime inafiançável e imprescritível, ou seja, não há prazo para o estabelecimento de processo, julgamento ou pena. A pena para quem pratica, induz ou incita a discriminação ou preconceito é de um a três anos de prisão e multa.Solicitamos a todas as organizações de Direitos Humanos no Acre, para solicitar o VETO para esta propositura travestida de cuidado, com o discurso ideológico neofascista, onde conclamando toda a população LGBTQIAPN+ a comparecer no dia 01 de dezembro, Dia Mundial de Luta Contra a AIDS, na 17ª Parada pelos Direitos das Pessoas LGBTQIAPN+ do Acre, ecoando nossas vozes por mais amor, respeito e mais direitos para todas as pessoas excluídas pela homo transfobia e em situação de vulnerabilidade social.Aguardamos do prefeito Tião Bocalom (PL) e do seu Vice-prefeito Alysson Bestene (PP), de Rio Branco o VETO e do presidente da Câmara Municipal de Rio Branco, Vereador Raimundo Neném (PSDB) a manutenção do VETO ao PL que se traduz como preconceito por parte de quem deve cuidar de todas e todos aqueles que também são cidadãos rio-branquenses pagadores de impostos.
Associação de Homossexuais do Acre – AHAC”