Após seguidos impasses, indefinições e prejuízos, a Fórmula 1 abrirá a temporada 2020 nesta sexta-feira, com os primeiros treinos livres do GP da Áustria, às 6h e às 10h, pelo horário de Brasília. Nas duas sessões de atividades na pista no Circuito de Spielberg, a categoria vai colocar a prova o seu “novo normal”, com adaptações e diversas restrições, para encarar uma “maratona” de oito corridas nos próximos dez finais de semana.
Pelos novos protocolos da competição, não haverá visitantes nem patrocinadores circulando pelo paddock. Cada equipe terá que fazer cortes para reduzir o número de pessoas nos boxes e nas áreas de hospitalidade, com limite de 80 por time. A presença de jornalistas também será minimizada. Os poucos presentes não terão acesso ao paddock ou ao pit lane.
A Federação Internacional de Automobilismo (FIA) exigiu que todos os funcionários das equipes assinassem o seu Código de Conduta. Pelas regras, eles não poderão ter contato com pessoal de outros times. Para os que têm acesso a paddock e pit lane, todos terão que ter exame negativo para covid-19. E serão submetidos a novos testes a cada cinco dias.
A preocupação para evitar aglomeração também prevê que as equipes não levem aos circuitos seus famosos motorhomes. Assim, equipes e pessoal devem usar a estrutura dos próprios autódromos para facilitar o cuidado com a transmissão.
O número reduzido de funcionários em cada equipe pode trazer consequências diretas para a pista. Com menos gente nos boxes, por conta do distanciamento social, os mecânicos vão enfrentar maior exigência e consequente cansaço. Erros poderão se tornar mais frequentes, afetando o resultado das corridas. Ações comuns nos boxes, como trocas de motor ou da caixa de câmbio, devem levar o dobro do tempo em comparação ao esquema tradicional.
“Vamos tentar fazer exercícios de respiração e pausas para manter a nossa equipe na melhor forma possível”, diz o diretor esportivo da Ferrari, Laurent Mekies. “Nosso maior desafio será usar máscara o tempo todo. Uma coisa é trabalhar de máscara na fábrica, outra é atuar nos boxes ou na pista, com temperatura de 40 graus ou mais.”
Para os pilotos, haverá uma dificuldade adicional: correr sem torcida. “Pilotar diante de arquibancadas vazias não será muito inspirador. Será um tanto solitário. Vamos sentir falta dos fãs”, admite Lewis Hamilton. “Acho que será a temporada mais difícil para todos nós por causa destes tempos difíceis que estamos enfrentando e as mudanças que vamos ter que fazer.”
Outras destas mudanças terão forte impacto nas tradições da categoria. A F-1 já avisou que não terá mais o desfile dos pilotos antes das provas, justamente para evitar aglomeração entre eles. O grid também deve ser afetado, com menos gente em torno de cada carro. Por fim, não haverá cerimônia no pódio. Mas haverá a entrega de troféus, com protocolo ainda não divulgado pela organização.
RISCOS – Apesar do risco constante de contaminação, as estratégias criadas pela F-1 para reduzir as chances de contágio podem ser bem-sucedidas, na avaliação do infectologista Jamal Suleiman. “Não existe nenhuma estratégia que impeça o contágio enquanto não tiver vacina. Mas os protocolos podem ajudar a minimizar o risco, caso das arquibancadas vazias e da redução de funcionários por equipe”, disse o especialista, ao Estadão.
Para o profissional do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, a F-1 tem a vantagem de ser disputada ao ar livre e sem contato físico entre os atletas. “Isso porque não é um esporte de interação, ao contrário do futebol, que abriu fazendo testagem no meio da pandemia, o que é um escárnio.”
Na sua avaliação, a testagem a cada cinco dias é uma saída eficiente. Mas explicou que o contágio mais frequente é por gotículas de saliva, que podem manter o vírus ativo por até 72 horas sobre superfícies, como aço e carbono, tão comuns no mundo da F-1. “Este tempo pode diminuir em ambiente mais aberto, como são os boxes.”
Para Suleiman, o maior desafio da F-1 será manter o distanciamento social, principalmente em situações como a preparação do grid de largada. “As relações humanas não estão baseadas no distanciamento. E o distanciamento precisa ser treinado. Vai ser interessante ver como todos vão se comportar.”