Jake Davison, o homem suspeito de matar cinco pessoas na cidade britânica de Plymouth no último dia 14 de agosto – o pior ataque a tiros visto na última década no Reino Unido -, discutia ativamente nas redes sociais o movimento “incel”.
A expressão vem da junção das palavras “involuntary celibates” e descreve homens jovens que se definem como “celibatários involuntários”.
Pelo menos dois assassinatos em massa anteriores nos Estados Unidos já haviam chamado a atenção para as atividades online desses grupos.
Mas o que sabemos sobre as pessoas que participam desses fóruns?
Fracassos e frustrações
“Em primeiro lugar, é óbvio que não tenho muitas esperanças de atrair uma mulher.”
Jack Peterson é um dos milhares de homens jovens que visitam fóruns “incel” no Reddit e em outros websites.
“Eu tive duas experiências negativas de relacionamentos e isso me fez sentir, você sabe… é difícil abandonar o meu passado e começar um novo relacionamento”, diz ele. “Eu tive mulheres que me fizeram coisas bem ruins.”
Esses temas gerais de fracassos e frustrações – além de raiva e ódio – são comuns nos fóruns “incel”.
A reportagem da BBC conversou com vários jovens que se autodenominam “incels”. São adolescentes ou garotos com pouco mais de 20 anos, que sofreram rejeição ou tiveram encontros ruins com mulheres e visitam fóruns de mensagens para tentar sair da solidão.
O que encontram são um grupo de homens cheios de raiva fortalecendo a ideia de que eles perderam a “loteria genética” e não há nada que possam fazer a respeito.
Jack tem um canal no YouTube e um podcast. Ele é um dos poucos “incels” abertos para falar com a imprensa após os ataques que mataram 10 pessoas em Toronto em 2018.
Outros concordaram em falar sob anonimato. Seja por vergonha, porque não tiveram sucesso em seus relacionamentos, ou porque querem esconder opiniões extremistas.
Um “incel” do Reino Unido – vamos chamá-lo de Liam – é ativo nos fóruns desde jovem. Ele está desempregado e vive em casa com a família.
E admite: “Adquiri esse tipo de visão misógina que normalmente não ajuda na minha vida”.
Eu pergunto diretamente: “Você odeia as mulheres?”
“De certa forma, sim”, afirma, gaguejando. “Eu tento evitar, mas acabo… acabo falando coisas que realmente não deveria, só porque estava observando os fóruns.”
Nossa conversa é meio afetada, cheia de pausas e às vezes perde o foco. Pergunto a Liam que tipo de coisas ele diz na vida real, mas acha que não deveria dizer. Ele enumera uma série de insultos impublicáveis que profere contra as mulheres.
Mas esse comportamento é resultado do tempo passado nas comunidades “incel”?
“Acho que não posso realmente afirmar se há relação, porque, quando você é mais jovem, provavelmente não acabaria dizendo essas coisas. Mas acho que eu não teria [dito] antes.”
“É isso que essas comunidades são”, acrescenta. “Elas absorvem você para entrar nessa caixa de ressonância de pessoas que sofrem problemas similares.”
“Você pensa em algo pequeno… e aí você vê outras pessoas pensando em coisas muito mais radicais. Então você acha que as coisas pequenas são aceitáveis.”
As coisas radicais mencionadas por Liam são facilmente visíveis nos quadros de mensagens “incel”.
Sexo e genética
A ideia de que todas as mulheres só buscam dinheiro, são promíscuas e manipuladoras aparece com frequência nas conversas “incel”, onde as mulheres atraentes são particularmente chamadas de “Stacys”.
“Stacys” são objetos de desejo e de ridicularização. No seu mundo próprio, os “incels” acreditam que as “Stacys” sempre escolherão os chamados “Chads” em vez deles.
“Chad” é uma caricatura de um homem sexualmente bem sucedido. E as comparações vão além da personalidade ou auto-confiança. Muitos “incels” acreditam que eles são geneticamente inferiores aos “Chads”.
Chad é frequentemente ilustrado como um rapaz bem-sucedido, com mechas loiras e músculos volumosos (que ele exibe em calças de cor verde neon). Ele tem um carro esportivo e, mais que isso, ele tem um atributo físico invejado pelos “incels” – a linha da mandíbula marcada.
Essas caricaturas parecem cômicas, mas são importantes, pois elas criam uma mentalidade de “nós contra eles”. Os “incels” acreditam que sexo, amor e felicidade estão fora do seu alcance e existem apenas para os outros.
Eles são particularmente conduzidos para a teoria niilista “black pill” (pílula preta) – a ideia de que eles são os únicos que compreendem que o jogo de sexo e atração é uma fraude desde o nascimento.