‘Bruce Lee não era super-herói, deve ter sido um babaca às vezes’, diz filha do ator

Era começo dos anos 2000 quando Shannon Lee descobriu alguns rascunhos escritos pelo pai, Bruce Lee, morto em 1973, quando ela tinha apenas quatro anos. Tratava-se do esboço sobre uma série a ser protagonizada pela própria lenda das artes marciais.

A descoberta de Shannon se transformou na série “Warrior”, produzida por ela — ao lado de Jonathan Tropper (“Banshee”) e Justin Lin (diretor de “Star Trek: Sem fronteiras” e “Velozes e Furiosos 9”). A segunda temporada, já em curso no canal a cabo HBO Extreme, também pode ser conferida pelo aplicativo HBO Go.

Cena de ‘Warrior’, série produzida por Shannon Lee, filha da lenda das artes marciais Bruce Lee [Foto: Divulgação/HBO]

— Ele escreveu apenas oito páginas de rascunho, mal daria para transformar em um episódio piloto — conta Shannon, que precisou encorpar, e muito, o material deixado pelo pai. — Foi uma série idealizada por ele há quase 50 anos, mas que ganhou vida no momento certo.

Chinatown

“Warrior” é uma trama policial cheia de ação ambientada na Era das Guerras Tong, no bairro de Chinatown, em São Francisco, no fim do século XIX. A série gira em torno de Ah Sahm (o ator britânico Andrew Koji), um prodígio das artes marciais que emigra da China para São Francisco em circunstâncias misteriosas. A segunda temporada mostra a disputa de dois clãs pelo domínio do território em meio ao crescente fervor antichinês.

Bruce Lee em uma cena do filme ‘O voo do Dragão’ [Foto: Divulgação]

Inevitavelmente, a presença da xenofobia atravessando o enredo da série remete ao preconceito sofrido por Bruce Lee ao retornar para os EUA aos 18 anos, quando iniciou seus estudos de teatro e filosofia, aprimorou seu conhecimento sobre artes marciais e se aventurou no universo de Hollywood.

— Meu pai morreu muito jovem, aos 32 anos, mas enfrentou muitos obstáculos. Ele era carismático, intenso, ativo. Muito talentoso, mas, acima de tudo, era um cara comprometido com o trabalho.

Crítica a Tarantino

Shannon também aborda a pertinência de uma produção com elenco maciçamente oriental, com foco principal na marginalização de imigrantes chineses, diante de um cenário pré-eleitoral em que o presidente Donald Trump chama diariamente a Covid-19 pelo nome de “praga chinesa”:

— Este é um dos motivos pelo qual “Warrior” é tão relevante. E fico orgulhosa de viabilizar este projeto do meu pai traduzindo sua visão de mundo, a visão de alguém que lutou contra um sistema social que segrega.

Além da defesa pela fala, Shannon Lee preserva a memória do pai através da Fundação Bruce Lee, comandada por ela desde o ano de sua criação, em 2002. “Warrior” é apenas mais um passo na trajetória da produtora, marcada pela defesa da figura do pai.

Em 2019, Shannon se envolveu em uma polêmica ao criticar frontalmente a forma como o diretor Quentin Tarantino retratou Bruce Lee em uma cena de “Era uma vez em… Hollywood”. Segundo a produtora de “Warrior”, seu pai foi transformado em uma figura “arrogante e exibicionista”.

Cena de ‘Era uma vez em… Hollywood’ em que Bruce Lee é interpretado pelo ator Mike Moh [Foto: Reprodução]

 — Posso dizer o seguinte: meu pai era um ser humano, então pode ter sido um babaca em algum momento da vida, como qualquer pessoa — argumenta Shannon. — O que Tarantino fez foi uma caricatura, não uma percepção honesta de quem foi Bruce Lee.

Hematomas

Na contramão do que viu na tela do cinema, Shannon se diz uma “purista” quando o assunto é seu pai, inclusive na construção das cenas de luta em “Warrior”.

— Ele revolucionou as artes marciais no cinema ao imprimir realismo, pregando que o ator precisa expressar o que sente enquanto luta — descreve a produtora. — Uma boa cena do tipo tem que fazer sentido dentro do roteiro, fugindo da violência gratuita.

E por falar em luta, as cenas de ação ganham muito mais em intensidade — e quantidade — nesta segunda temporada de “Warrior”, o que leva toda atenção a Andrew Koji, protagonista da série. Filho de mãe inglesa e pai japonês, o ator britânico de 33 anos guarda com carinho, e também alguns hematomas, as lembranças das filmagens:

Andrew Koji diz que quase entrou em colapso durante as filmagens da segunda temporada de ‘Warrior’ [Foto: Divulgação]

— Tecnicamente, foi muito mais difícil de gravar. Quase entrei em colapso enquanto rodávamos a reta final da temporada por causa de uma cena.

Para além da pressão sobre seu condicionamento físico, Andrew também teve de lidar com certa desconfiança de algumas pessoas diante de um papel que, originalmente, deveria ter sido interpretado por Bruce Lee.

O ator revela que, inicialmente, ficava incomodado com qualquer tipo de comparação. Mas sua postura mudou, segundo ele, após cair a ficha sobre a relevância que “Warrior” tem, em especial para os asiáticos que, assim como Bruce Lee, atravessaram o oceano para construir a vida em outro continente.

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