Médico da Santa Casa é afastado por suspeita de abuso sexual durante cirurgia

Funcionários do hospital, que pediram para não serem identificados, disseram que o episódio aconteceu há duas semanas, durante uma cirurgia de mão

FOLHAPRESS) – O médico residente de ortopedia Ramiro Carvalho Neto, 33, foi afastado da Santa Casa de São Paulo sob suspeita de importunação sexual durante uma cirurgia. A instituição confirmou o caso por meio de nota.

Funcionários do hospital, que pediram para não serem identificados, disseram que o episódio aconteceu há duas semanas, durante uma cirurgia de mão. Testemunhas afirmam que durante o procedimento, Ramiro teria passado a mão nas regiões íntimas da paciente.

Ainda de acordo com essas pessoas, os médicos presentes filmaram a ação dele, que foi denunciado para a direção do hospital.

A Folha de S.Paulo tentou contato com o médico desde a manhã desta segunda-feira (6), por ligação, mensagem e rede sociais, mas não obteve contato até a publicação desta reportagem.

Um dos responsáveis pela denúncia encaminhou a cena gravada para a coordenação dos residentes da Santa Casa.

“A instituição recebeu denúncia anônima sobre importunação sexual ocorrida em suas dependências. O profissional envolvido foi imediatamente afastado após o recebimento da denuncia”, diz o hospital.

A Santa Casa afirma que foi “instaurada sindicância interna em que todos os cuidados estão sendo tomados para que a apuração ocorra de maneira irrestrita e sigilosa, para que seja preservada a privacidade da suposta vítima, a qual estamos prestando assistência e acolhimento”.

© Global Imagens

Ainda em nota, a instituição reitera que “repudia veementemente qualquer ato de assédio ou importunação que fira a dignidade humana, assim a sindicância seguirá no firme propósito de apurar toda e qualquer responsabilidade”.

A reportagem procurou o Cremesp (Conselho Regional de Medicina de São Paulo) que afirmou no dia 30 de abril que ainda não havia sido notificado sobre o caso.

Já o CFM (Conselho Federal de Medicina) disse que não tece comentários sobre casos concretos. O órgão afirmou ainda que após a denúncia, cabe ao Cremesp tomar as providências necessárias para apuração do caso, ficando o denunciado sujeito a responder a um processo ético-profissional. “Se condenado após julgamento, fica suscetível à aplicação de penalidades previstas em lei”.

Esta não é a primeira vez que o médico é denunciado por crimes sexuais. Enquanto cursava medicina, ele ficou um ano afastado após ser acusado de ter abusado de uma colega de faculdade durante os jogos universitários. O caso teria acontecido no fim de 2013.

A Folha não encontrou denúncias formais contra Ramiro nem na polícia nem na Justiça de São Paulo –tanto sobre o caso no hospital quanto sobre o caso da Unicamp.

A reportagem questionou a Santa Casa se ela formalizou a denúncia contra o médico para as autoridades policiais. A instituição explicou que tanto a Santa Casa quanto a suposta vítima concordaram “em aguardar a conclusão da sindicância em curso para eventual comunicação a autoridade policial acaso constatada conduta passível de ser enquadrada criminalmente “.

Segundo o hospital, a medida visa proteger a identidade da suposta vítima.

A Unicamp abriu uma sindicância para analisar a denúncia contra Ramiro em 2014. A Folha teve acesso ao documento.

O caso aconteceu quando ele estava em um jogo universitário. Segundo a sindicância, uma estudante acordou durante a noite e percebeu que Ramiro estava com as mãos em suas partes íntimas e com o pênis a mostra.

O documento afirma ainda que ela e as amigas foram ofendidas por um grupo de alunos mais velhos no dia seguinte, após denunciarem o caso.

A sindicância diz ainda que há relatos que Ramiro teria mostrado o pênis para alunas da faculdade de medicina durante as competições.

A aluna que decidiu denunciá-lo à faculdade afirmou, em condição de anonimato, que o episódio a traumatizou e que não conseguiu frequentar a as aulas por meses. Ela não registrou boletim de ocorrência do caso.

Em depoimento à faculdade, Ramiro afirmou que usava um kilt -um tipo de saia masculina que era usada por alunos da universidade durante competições- nos jogos, sem cueca por baixo, e que durante a noite acreditava que seu braço ou perna podem ter encostado na aluna de forma não intencional.

Ele afirmou que tentou conversar com a denunciante, mas que ela chorava muito na ocasião e foi embora.

Depois, afirmou que mandou uma mensagem para a jovem, que não o respondeu. Ele disse ainda que tentou se explicar para as amigas e pediu desculpas lamentando que tivesse acontecido aquela confusão.

Na mensagem, ele reitera que a colega pode ter o visto pelado sem sua intenção. “Se isso ocorreu, eu sinto muito do fundo do meu coração”, disse ele. O médico, na época estudante, disse ainda na mensagem que a colega deixou os jogos universitários muito “chateada, com o que aconteceu, mas a acusação que você está fazendo é muito séria e pode afetar bastante sua vida acadêmica. Eu não quero que seus pais te tirem da faculdade ou você se sinta excluída por um mal entendido. Você pode ter certeza que eu nunca tentei ou tentarei te machucar ou farei mal algum.”

Ele foi questionado pela universidade se não considerava atentado ao pudor andar de kilt sem cueca. Ramiro negou, e disse que só usava saias entre amigos. Ainda afirmou que “no colegial brincava com os amigos de mostrar a genitália e todos levavam numa boa”.

O documento aponta que ele ficou suspenso da faculdade por 90 dias -pessoas que estudavam na universidade na época afirmam que ele passou um ano afastado das aulas.

Em nota, a Simesp (Sindicato dos Médicos de São Paulo) diz que existe um ciclo que liga trotes abusivos nas faculdades de medicina a casos de assédio sexual perpetrados por médicos contra pacientes.

“A prática de trotes, muitas vezes marcada por humilhações, abusos físicos e psicológicos, cria um ambiente tóxico que não apenas afeta negativamente a formação humanística dos futuros médicos, mas também perpetua uma cultura de desrespeito e violação de limites”, diz a entidade.

Segundo o sindicato, “a correlação entre os trotes abusivos e o assédio sexual no ambiente médico reflete a necessidade urgente de uma reforma cultural dentro das faculdades de medicina e, por extensão, no seio da prática médica”.

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