Após enchentes, comunidade científica internacional se preocupa com secas na Amazônia

Região onde está o Acre tem as árvores mais susceptíveis à morte, diz estudo publicado pela revista inglesa Nature

Estudo publicado pela revista Nature, da Inglaterra, diz que árvores e florestas do sul da Amazônia, onde se localiza o estado do Acre, são mais susceptíveis à morte pelo fogo e às secas das  mudanças climáticas. 

Passado o período das grandes cheias na Amazônia, a comunidade científica internacional começa a se movimentar em torno do debate que visa diminuir as queimadas que avançam anualmente na região e que ameaçam a última grande floresta tropical e úmida do planeta.

Seca histórica no Rio Acre. Foto: Juan Diaz

Por isso, agora em maio, está sendo colocado em ação um movimento envolvendo 80 cientistas da Europa e da América do Sul. O movimento identificou, segundo a Nature, as regiões da Floresta Amazônica onde as árvores têm maior probabilidade de enfrentar risco de condições mais secas provocadas pelas mudanças climáticas.

Com base na análise, os cientistas preveem que as árvores no oeste e no sul da Amazônia, onde se localiza o estado do Acre, correm o maior risco de morrer. Eles também alertam que investigações científicas anteriores podem ter subestimado o impacto da seca na floresta tropical porque tais estudos se concentraram na parte centro-leste da floresta, que é a menos vulnerável à seca.

O professor David Galbraith, da Universidade de Leeds (Reino Unido), que supervisionou o estudo, disse: “A Amazônia está ameaçada por vários estressores, incluindo desmatamento e clima. Compreender os limites de estresse que essas florestas podem suportar é um grande desafio científico. Nosso estudo fornece novos conhecimentos nos limites da resistência da floresta a um grande estressor – a seca”.

Algumas partes da Amazônia já sofreram mudanças nos padrões de chuva. No sul da região, há evidências de que a estação seca se tornou mais longa e as temperaturas nessa região aumentaram mais do que em outras partes da Amazônia. As mudanças no sul da Amazônia são parcialmente atribuídas ao desmatamento extensivo.

A pesquisadora Julia Tavares, também citada pela Nature e que liderou o estudo durante o doutorado em Leeds, e agora está baseada na Universidade de Uppsala (Suécia), afirmou: “Muitas pessoas pensam na Amazônia como uma grande floresta. Mas não é. Ela é composta por inúmeras regiões florestais que abrangem diferentes zonas climáticas, desde locais que já são muito secos até aqueles que são extremamente úmidos, e queríamos ver como esses diferentes ecossistemas florestais estão lidando para podermos começar a identificar regiões que estão em risco particular de seca e condições mais secas”.

A equipe de pesquisa disse que suas descobertas estavam removendo um “(…) grande gargalo de conhecimento de como a mudança climática afetará este ecossistema crítico”.

A equipe de pesquisa, conhecida como “médicos das árvores” pelas comunidades que vivem na floresta, fez medições e amostras ao longo de um ano em 11 locais separados no oeste, centro-leste e sul da Amazônia – cobrindo Brasil, Peru e Bolívia. O estudo envolveu dados de 540 árvores individuais em 129 espécies.

Os pesquisadores queriam determinar a resistência de diferentes espécies de árvores e florestas às condições de seca. Os cientistas então usaram os dados para testar se a vulnerabilidade da floresta à seca poderia prever sua capacidade de acumular e armazenar o carbono retirado da atmosfera.

A partir dos dados, a equipe de pesquisa foi capaz de quantificar a segurança das árvores contra a morte relacionada à seca. Na parte sul da Floresta Amazônica, onde historicamente houve queda nos níveis de chuva, as árvores apresentaram maior grau de adaptação para lidar com a seca.

Apesar disso, porém, o estudo revelou que as árvores corriam o maior risco de morrer devido à seca. Isso provavelmente ocorre porque a região já passou por mudanças climáticas rápidas e interrupções nos padrões de chuva causadas pelo desmatamento, que levou as árvores ao limite de sua capacidade de lidar com o cenário.

Em contraste, as espécies de árvores nas partes mais úmidas da Floresta Amazônica mostraram o menor nível de adaptação à seca, mas eram as mais seguras em termos de riscos de mudanças climáticas futuras porque, pelo menos até agora, não haviam sido impactadas por mudanças nas chuvas.

Munidos dessa visão mais sutil de como diferentes partes da Floresta Amazônica podem responder à seca, os pesquisadores alertam que as investigações científicas, que tendem a se concentrar na região centro-leste, onde as árvores mostraram algumas das maiores adaptações para lidar com condições mais secas, podem ter subestimado a vulnerabilidade de outras regiões florestais às mudanças climáticas.

Os pesquisadores dizem que as descobertas do novo estudo devem ser usadas para ajudar a atualizar e refinar os modelos existentes sobre como a Amazônia pode ser afetada por condições mais secas.

Segundo os pesquisadores, a Floresta Amazônica detém entre 10% e 15% do carbono armazenado pela vegetação globalmente e desempenha um papel fundamental na absorção de carbono que, de outra forma, estaria na atmosfera.

A modelagem revelou que, à medida que o risco de mortalidade por seca aumenta, a capacidade das árvores de armazenar carbono seria significativamente reduzida. A parte da Amazônia com maior estresse hídrico está na região sudeste. A análise revela que as árvores neste local não atuam mais como um armazenamento de carbono em larga escala.

O professor David Galbraith disse: “Este estudo revela como o risco florestal à seca varia em toda a Bacia Amazônica e fornece um mecanismo para prever o balanço de carbono no nível da floresta. Florestas que são ‘mais seguras’ da mortalidade induzida pela seca estão acumulando mais carbono do que aquelas que enfrentam maior risco de mortalidade induzida pela seca.

O professor Emanuel Gloor, também da Universidade de Leeds, que co-supervisionou o estudo, acrescentou: “O padrão de resiliência e os riscos identificados entre as diferentes populações de árvores no estudo serão usados para construir modelos climáticos mais eficazes e precisos do como a Amazônia pode mudar à medida que a região responde às mudanças climáticas”.

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