Tamandua e Baita sobreviveram as últimas três décadas sozinhos, fugindo de grileiros e madeireiros no meio da Floresta Amazônica, carregando apenas um facão, um machado e uma tocha. Mas nos últimos três meses, os dois únicos remanescentes isolados do povo Piripkura enfrentaram sua mais difícil batalha. Diagnosticado com um cisto no cérebro, Tamandua precisou ser transferido para um hospital em São Paulo, onde foi submetido a uma cirurgia, teve complicações no pós-operatório e precisou ser internado na UTI. Baita, tio de Tamandua, teve o diagnóstico de próstata aumentada, mas resistiu aos tratamentos. O caso ganha contornos ainda mais dramáticos porque a renovação da proteção ao território onde vivem, que vence no próximo dia 4, depende da comprovação de que a Terra Indígena é habitada pelos índios.
— O Tamandua não conseguia ficar em pé sem apoio, por consequência de uma hidrocefalia provocada por um cisto aracnoide. Sem tratamento, ele não teria como sobreviver na mata — conta Marcos Schaper, que trabalha há duas décadas no setor de Saúde Indígena do Hospital São Paulo. — O procedimento cirúrgico foi minimamente invasivo, com o uso de endoscópio. A gente esperava que a alta acontecesse em um dia, mas ele teve complicações, precisou ser sedado, entubado e passou uns cinco dias na UTI.
Os primeiros relatos sobre a existência dos Piripkura surgiram em 1985, quando uma indígena, rebatizada como Rita, foi encontrada numa fazenda da região. Ela contou que havia deixado a aldeia onde vivia com outras 13 pessoas após a morte do marido e, apesar de pedidos insistentes dos parentes, decidiu não retornar. Com o relato, expedições foram montadas na tentativa de localizar o grupo. Foram encontrados vestígios de um acampamento permanente, mas nenhum sinal dos índios. No dia 1º de maio de 1989, Tamandua e Baita foram encontrados.
— Tudo o que eles diziam é que o resto do povo havia morrido. Eles contaram que estavam fugindo dos brancos e precisavam cruzar um rio. Eles cruzaram primeiro e a canoa voltou para uma segunda viagem, mas foi interceptada. Eles se esconderam e assistiram o massacre — conta o sertanista Jair Candor, que lidera a Frente de Proteção Etnoambiental Madeirinha-Juruena da Funai, responsável pela Terra Indígena Piripkura, e estava naquela expedição.