Após a cofundadora do Nubank Cristina Junqueira se retratar publicamente depois da repercussão negativa de sua declaração no programa Roda Viva, da TV Cultura, sobre a dificuldade de contratar negros para cargos de liderança, a empresa postou no domingo em seu site uma carta dos três sócios fundadores se desculpando mais uma vez e prometendo providências para reparar o erro.
No texto, o banco digital diz que a diversidade “foi sempre, sim, parte da nossa cultura. O equívoco foi achar que ter o valor por si só bastava. O erro foi achar que as coisas vão se resolvendo sozinhas, pela própria comunidade de Nubankers, organicamente, sem esforços contínuos e investimentos da liderança”.
A própria empresa diz que ficou acomodada “com o progresso que tivemos nos nossos primeiros anos de vida, que se refletia em algumas estatísticas relativas à igualdade de gênero e LGBTQIA+, por exemplo, que, repetidas, mascaravam a necessidade urgente de posicionamento ativo também na pauta antirracista. Deixamos de nos questionar. Ignoramos o grande caminho que ainda tínhamos pela frente.”
Com isso, diz o Nubank, “perdemos a humildade, que sempre foi a característica que nos ajudou a entender velhos problemas com novas soluções e uma mentalidade inovadora.”
Segundo a carta, a empresa passou os últimos dias conversando “com a comunidade negra de Nubankers, com ativistas negros de fora do Nubank e também com nossos clientes. Nessas conversas, vimos o quanto precisamos avançar, dentro e fora de casa, com uma agenda de reparação histórica e de combate ao racismo estrutural.”
Dessas conversas nasceu uma parceria com o Instituto Identidades do Brasil (ID_BR) “como primeiro passo nessa jornada de aprendizado e transformação. O objetivo é ampliar nosso entendimento sobre o tema, firmar nosso engajamento público e contínuo e acelerar a promoção da igualdade racial no Nubank.”
‘Requisitos técnicos’
Na semana passada, a cofundadora do banco virtual Cristina Junqueira disse no Roda Viva que tem dificuldades de contratar executivos negros para posições de liderança por falta dos requisitos técnicos que julga necessários.
Questionada se a alta exigência não é uma barreira, respondeu que o banco digital “não pode nivelar por baixo”.
Após a forte repercussão, Cristina publicou um vídeo em seu perfil do LinkedIn, dizendo que não se expressou “da melhor maneira”. Ela reforçou o compromisso do Nubank com a diversidade e agradeceu comentários que recebeu.
Especialistas em diversidade racial ouvidos pelo GLOBO avaliam que o discurso de Cristina ainda é muito comum entre líderes empresariais para justificar a falta de negros em cargos de liderança nas companhias que dirigem, mas não corresponde à realidade. [Capa: Reprodução/Instagram]
Leia a íntegra do comunicado do Nubank:
O Nubank errou
Há sete anos, quando fundamos o Nubank, nosso maior desejo era ter uma cultura com valores muito sólidos.
Entre nossos valores mais admirados está Construímos Times Fortes e Diversos.
A diversidade foi sempre, sim, parte da nossa cultura.
O equívoco foi achar que ter o valor por si só bastava.
O erro foi achar que as coisas vão se resolvendo sozinhas, pela própria comunidade de Nubankers, organicamente, sem esforços contínuos e investimentos da liderança.
Ficamos acomodados com o progresso que tivemos nos nossos primeiros anos de vida que se refletia em algumas estatísticas relativas à igualdade de gênero e LGBTQIA+, por exemplo, que, repetidas, mascaravam a necessidade urgente de posicionamento ativo também na pauta antirracista.
Deixamos de nos questionar. Ignoramos o grande caminho que ainda tínhamos pela frente.
Com isso, perdemos a humildade, que sempre foi a característica que nos ajudou a entender velhos problemas com novas soluções e uma mentalidade inovadora.
Erramos.
A diversidade étnico-racial é um desafio muito maior e mais complexo do que imaginávamos.
Passamos os últimos dias em conversas com a comunidade negra de Nubankers, com ativistas negros de fora do Nubank e também com nossos clientes.
Nessas conversas, vimos o quanto precisamos avançar, dentro e fora de casa, com uma agenda de reparação histórica e de combate ao racismo estrutural.
O Brasil tem excelentes profissionais negros em diferentes carreiras.
No Nubank, temos um enorme orgulho da nossa comunidade e pedimos desculpas aos Nubankers negros, ao movimento negro e aos grupos sub-representados por não termos feito mais.
O Nubank precisa ouvir para se transformar. Precisamos de muito mais ações concretas. Queremos aprender sobre raça para liderar nossos times nesta transformação.
Como fundadores, nos comprometemos a ouvir mais e a agir mais.
Já tínhamos iniciativas focadas em recrutamento e inclusão, mas sabemos que é pouco.
Somos inconformados por natureza, questionamos tudo inclusive nós mesmos. Vamos usar essa característica para recomeçar uma jornada de inclusão racial.
Mas não temos e nem queremos soluções simplistas.
Por isso, estamos desenhando uma agenda real com ações concretas e ambiciosas de transformação na área de diversidade racial, a qual dividiremos ainda em Novembro com os números do nosso compromisso.
Para criá-la, estamos trabalhando com nossos Nubankers, representantes da comunidade negra, especialistas em diversidade racial, consultores e ONGs.
Para já, acabamos de firmar uma parceria com o Instituto Identidades do Brasil (ID_BR) como primeiro passo nessa jornada de aprendizado e transformação. O objetivo é ampliar nosso entendimento sobre o tema, firmar nosso engajamento público e contínuo e acelerar a promoção da igualdade racial no Nubank.
O ID_BR confere às empresas que estão neste caminho o Selo “Sim à Igualdade Racial” no nível “Compromisso”, e o Nubank já está incluso nesse processo. Existe uma agenda a ser realizada e o instituto irá nos acompanhar nessa jornada para darmos sequência no planejamento estratégico voltado à temática racial.
Decidimos também dobrar o tamanho do time interno dedicado a recrutar profissionais de grupos sub-representados em todas as posições e níveis da empresa e reforçar a busca por lideranças negras para nos ajudar nesse processo.
Temos certeza que esse trabalho trará benefícios para o Nubank e para a sociedade.
Esperamos que bancos, fintechs e demais agentes do sistema financeiro entrem nesse movimento conosco para ajudar a mudar a realidade à nossa volta.
Nosso compromisso agora é desafiar de novo o status quo — desta vez, no campo da diversidade e inclusão racial no Brasil e na América Latina.
David Vélez, fundador e CEO do Nubank
Cristina Junqueira, co-fundadora
Edward Wible, co-fundador
São Paulo, 25 de Outubro de 2020