Especial de Natal do Porta dos Fundos fala de atentado, Bolsonaro e Regina Duarte; veja trailer

O novo especial de Natal do Porta dos Fundos é uma espécie de volta às origens e um pouco de déjà-vu, desta vez com cuidados reforçados. Em primeiro lugar, porque o grupo deixa a Netflix e volta ao YouTube, plataforma em que conquistou sua fama. Em segundo, porque o roteiro não deixa de fazer piadas com a Bíblia, mesmo no rastro de um atentado terrorista sofrido no ano passado por retratar Jesus como um homossexual.

O gigante do streaming que acolheu a trupe de humor nos últimos três anos confirma que agora abre mão de transmitir o especial, pelo qual ganhou até um Emmy Internacional, e que apoia o fim da parceria. “Teocracia em Vertigem”, o filme do grupo deste ano, estreia direto no canal online em que também foram lançados os especiais de 2013 a 2017.

Segundo Christian Rôças, o CEO do grupo conhecido como Crocas, a decisão de deixar a Netflix foi tomada pelo próprio Porta dos Fundos, lembrando o prêmio que receberam pelo especial “Se Beber, Não Ceie”, parceria com a plataforma de streaming de 2018, e também o impacto do controverso “A Primeira Tentação de Cristo”.

Nenhuma das partes mencionou como causa do rompimento a série de ataques à sede da produtora no Rio de Janeiro que ocorreram em reação ao especial de Natal no ano passado. A saída vem no rastro de uma série de protestos de grupos religiosos e do atentado a bomba à sede do grupo. Tanto o grupo como a plataforma responderam a diversas ações na Justiça depois do lançamento de “A Primeira Tentação de Cristo”, que mostrava uma versão gay de Jesus. O grupo diz que não perdeu nenhum desses processos.

“Este é um projeto com o DNA do Porta, por isso optamos por voltar ao nosso canal do YouTube, que tem quase 17 milhões de inscritos. Foi para valorizar a nossa audiência”, diz Rôças. Ainda segundo ele, os dois últimos especiais de Natal exibidos pela Netflix também serão relançados em dezembro no YouTube, em data a ser anunciada.

Durante uma entrevista coletiva, Fábio Porchat fez questão de enaltecer a parceria com a Netflix, que acionou seus advogados para defender o grupo e ainda resistiu à pressão para retirar “A Primeira Tentação” do ar.

A saída do Porta dos Fundos da plataforma também tem uma razão comercial. Sem ser exclusivo da Netflix, o novo especial também poderá ser visto no Pluto TV, o serviço gratuito de streaming que acaba de ser lançado pela —mesmo conglomerado de mídia que hoje controla o grupo de humor.

Depois do Jesus corrupto de 2018 e do homossexual de 2019, o de 2020 não deve gerar grandes controvérsias. Interpretado por Porchat de peruca loira e lentes de contato azuis, a nova versão do messias cristão é irreverente e desbocada, mas bastante fiel ao retratado nos evangelhos.

“Nós fomos atrás do Jesus político, que queria liderar uma revolta dos hebreus contra o domínio romano”, diz Gregorio Duvivier, ator do grupo e também colunista deste jornal. Para garantir a autenticidade do personagem, Porchat —que assina o roteiro, a partir de uma ideia de Gabriel Esteves— mergulhou no Novo Testamento e pinçou frases inteiras de lá. Depois, durante as gravações, assegurou que o elenco não improvisasse em cima dessas citações bíblicas, para que elas permanecessem intactas.

Se a figura de Jesus Cristo é de certa forma poupada, “Teocracia em Vertigem” não economiza munição contra seu entorno. Figuras como Caifás, Barrabás e Pôncio Pilatos servem como avatares para líderes políticos e religiosos da era Bolsonaro.

Um dos personagens diz em depoimento que “depositaram 89 mil moedas de prata na conta da ex-mulher do Judas”, referência direta aos cheques que Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro investigado pelas rachadinhas na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, depositou na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

“Teocracia em Vertigem” também satiriza o gênero documental, intercalando entrevistas fictícias sobre a história de Jesus Cristo. Até Petra Costa, diretora do documentário indicado ao Oscar “Democracia em Vertigem”, em que narra em primeira pessoa a turbulência política em torno do impeachment de Dilma Rousseff, faz uma breve participação.

Porchat ainda tomou o cuidado de mostrar o roteiro às atrizes do elenco, que sugeriram mudanças para deixar a linguagem menos machista em alguns trechos. Também enviou cópias para os pastores Henrique Vieira e Caio Fábio, de linha mais liberal —e recebeu deles até sugestões de piadas.

As gravações do especial aconteceram entre agosto e setembro passados, algumas delas de forma remota. Para evitar aglomerações, um único figurante foi usado, e ele acabou aparecendo em diversas cenas. Quando mais do que um se fez necessário, o próprio Porchat não se fez de rogado —é dele a mão que massageia Pilatos, papel de Paulo Tiefenthaler, por exemplo.

“Nossa ideia jamais foi destruir os valores religiosos ou demolir a civilização judaico-cristã”, conclui Duvivier. “No especial deste ano tem muita agressividade, muita violência, mas não na boca de Jesus”, acrescenta Porchat. “A gente atira para todo lado.”

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