Peixes agonizam com fenômeno ‘decoada’, que atinge rios do Pantanal

Centenas de peixes estão sofrendo e alguns até morreram por conta do fenômeno “decoada”, no Pantanal de Mato Grosso do Sul. A suspeita é de que esse fenômeno (entenda mais abaixo) possa estar ligado também às queimadas do ano passado (2020) que destruíram mais 4 milhões de hectares do bioma.

Na última sexta-feira (12), pesquisadores do Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) fizeram um levantamento no rio Miranda, no município de Corumbá, e encontraram quase 50 espécies mortas ou agonizando às margens do rio.

O especialista em ictiologia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Fernando Carvalho, explica que este fenômeno acontece agora no período de subida das águas dos rios do Pantanal.

Ainda de acordo com Carvalho, a decoada é um fenômeno natural que ocorre quando as águas dos rios do Pantanal extravasam para as áreas da planície que secaram durante a estação seca e agora, na estação chuvosa, estão com muita vegetação e matéria orgânica.

Equipe do Imasul fez levantamento e constatou que 46 espécies já foram afetadas pela 1ª decoada de 2021. — Foto: Heriberto Gimenes Junior/Foto

“Quando a água da calha dos rios entra na planície, processos de oxidação nesta matéria orgânica deixam as águas com pouco oxigênio dissolvido (condição de hipóxia) ou mesmo sem oxigênio (condição de anóxia), além de elevar os níveis de concentração de gás carbônico na água”, explicou Carvalho.

 

Quantidade de espécies de peixes podem ser prejudicadas por conta de queimadas no Pantanal. — Foto: Tai Strietman/Foto

O especialista também explicou que, “nesta condição, os peixes ‘agonizam’ por falta de oxigênio e muitos morrem”. “Quanto mais matéria orgânica e outros compostos presentes na área, por exemplo cinzas, mais intensos os processos de decomposição e de alteração das propriedades físico-químicas da água”, explicou ao G1.

Outra preocupação do pesquisador é que a primeira decoada deste ano poderá ser mais intensa devido aos grandes incêndios que devastaram o bioma em novembro de 2020.

Como mostra o vídeo abaixo, a maior parte das queimadas foi provocada por ação humana.

“As cinzas que estão no solo alteram a qualidade da água. A matéria orgânica em deposição deixa a água com a cor mais escura e aliado a diminuição drástica de oxigênio, os peixes vão para a superfície em busca de ar”, finaliza.

Segundo o biólogo do Imasul, Heriberto Gimenes Junior, a equipe ainda avalia se esta primeira decoada do ano teve interferência dos grandes incêndios que devastaram a região ou se foi somente um fenômeno natural.

 

Incêndio que destruiu mais de 4 milhões de hectares do Pantanal, em Corumbá. — Foto: Corpo de Bombeiros/Divulgação

Quantidade de peixes reduzida
Em outubro do ano passado, Carvalho alertou que o rastro de destruição pelo fogo na região do Pantanal, poderia não só interferir na qualidade da água, mas também afetar a quantidade de peixes nos rios que cortam o bioma.

Peixes que alimentam de itens de fundo dos rios também será afetada negativamente. — Foto: Tai Strietman/Foto

Na época, ele explicou que isso poderia ocorrer porque a dinâmica de reprodução dos peixes da planície pantaneira está intimamente relacionada com as áreas alagáveis. Essas áreas foram muito atingidas pelos incêndios. Os dados mais recentes apontam que o Pantanal possui em torno de 300 espécies de peixes.

Fotógrafo Araquém Alcântara registra fuga de animais e a destruição das queimadas no Pantanal. — Foto: Araquém Alcântara/Divulgação

Carvalho ainda reforçou que o Pantanal possui uma diversidade considerável de animais, incluindo peixes: “O que é mais marcante no bioma não é a diversidade, mas sim a abundância de cada espécie, de maneira geral populações grandes, com grande número de indivíduos”, relembra.

O pesquisador ainda ressalta que é muito difícil estimar quanto tempo que as interações biológicas voltarão como eram antes das queimadas. Acredita que certamente não serão as mesmas interações, ou seja, a partir dessas queimadas, será uma nova realidade, uma nova normalidade.

“Os ecossistemas têm certa resiliência para lidar com estas situações adversas, mas a intensidade com que elas estão acontecendo, ano após ano, diminui sobremaneira a capacidade de se recuperarem. Os efeitos sinérgicos e constantes das interferências antrópicas são altamente prejudiciais ao ecossistema pantaneiro como um todo”, finalizou.

 

 

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