Jovem com câncer morre 10 dias após realizar sonho de se casar

As dores não deram conta de esconder o sorriso de Ada. Em cuidados paliativos por causa do câncer, levantou-se da cadeira de rodas na metade do trajeto até o altar e seguiu em pé ao encontro do noivo, Ruan Pablo de Lara, de 27 anos, que tentou — em vão — segurar as lágrimas.

Nenhum dos presentes na Paróquia Nossa Senhora da Salette, em União da Vitória, no sul do Paraná, conteve a emoção. Adarlele Ribas Andrade de Lara, de 26 anos, viveu em 6 de fevereiro a realização do sonho que alimentou entre os vestidos de noivas na loja em que trabalhava.

Adarlele de Lara com o vestido de noiva — Foto: Arquivo pessoal

Dez dias depois da cerimônia, a vendedora perdeu a batalha contra a doença que encarava pela terceira vez. A caçula de cinco irmãos estava ao lado da mãe, Lúcia Glaab de Andrade, de 60 anos, no Hospital de Clínicas, em Curitiba.

“Rezou o Pai Nosso, a Ave Maria, cantou pra mãezinha do céu duas vezes. Na terceira não conseguiu e foi com Deus”, recordou-se a mãe. “Está sendo muito difícil”, desabafou.

Dos parabéns ao casamento
Ada fazia aniversário em 22 de maio. No último, em 2020, um desconhecido decidiu parabenizá-la em uma rede social. Antes que o mês acabasse, ela e Ruan, que trabalha como programador, tiveram o primeiro encontro.

“A gente se deu muito bem desde primeira conversa [pela internet]. Um começava a escrever, o outro escrevia a mesma frase. Foi de primeira”, contou o viúvo. “Vivemos muito em pouco tempo”, indicou.Dali em diante, os cerca de 20 km entre União da Vitória e Porto Vitória (SC), onde a jovem estava morando, pareciam cada vez mais próximos. Tanto que começaram a namorar em 12 de junho, Dia dos Namorados.

“Ela falava que ele era o príncipe encantando dela. É uma história de filme, uma prova que o amor verdadeiro existe”, afirmou o irmão da jovem Adnilson de Andrade, de 32 anos.
Quando o casal se conheceu, Ada se considerava curada de um tumor no braço esquerdo descoberto aos 23 anos – e que a deixou com dificuldades para movimentá-lo. Vencer a doença não era novidade para ela. Aos sete, já havia superado um tumor no rim.

Adarlele e Ruan em ensaio de fotos antes do casamento — Foto: Arquivo pessoal

Atenta, a jovem percebeu os sinais do corpo. Foi uma bolinha que surgiu na testa. Em agosto, os médicos diagnosticaram a metástase do tumor. A doença reapareceu na cabeça, na coluna e na bacia.

“Desistir jamais. Nunca passou nem pela minha cabeça nem pela dela. Ela lutou até o fim. A gente sempre acreditou no milagre”, disse Ruan.
No decorrer do tratamento, eles se uniram ainda mais. A decisão de casar foi bem recebida pelas famílias. Do mesmo jeito que as dores não a impediam de viver, a doença não barrou o sonho.

Em meio à pandemia do novo coronavírus, a organização da cerimônia foi cercada de cuidados. Não houve festa, e na igreja um terço da capacidade. A primeira data era dezembro, embora Ada quisesse antes. Com o aumento de casos de Covid-19, ficou para fevereiro.

Ada gostava de organizar festas. Além dos aniversários, tinha ajudado no casamento de uma prima. Segundo a mãe, os cinco afilhados da jovem foram agraciados com a capacidade que ela tinha de deixar tudo no capricho.

Ao passo que fevereiro se aproximava, o quadro da noiva se agravava. Às vésperas da cerimônia, ela encarou dez dias de internação por causa da forte anemia e das dores. Ada queria alta para provar o vestido, os médicos não liberavam.

Adarlele de Lara com o vestido de noiva — Foto: Arquivo pessoal

A família não esconde a gratidão pela equipe do hospital. Uma ambulância com médico e enfermeiro levou a jovem, que estava internada na capital, para provar o vestido ao lado da mãe. Algumas pessoas que participaram do tratamento estavam na cerimônia.

“A hora que estavam saindo da igreja, o Ruan levando ela sentada na cadeira de rodas. Os dois chorando, todo mundo aplaudindo. Ela aplaudia junto com o sorriso mais lindo do mundo”, contou o irmão.

Os últimos dias
O casamento não era o único sonho de Ada, que se dividia entre trabalho e faculdade de administração, interrompida pelo tratamento. O curso de radiologia ficou por terminar. Já a carteira de habilitação, não. Tirou mesmo sem o braço estar bom.

Sonhou em ser mãe, ela adorava crianças. Impedida pelos tratamentos agressivos, adotou o cãozinho Snow – um shih-tzu de um ano e meio que mora com Ruan na casa onde vivia com Ada desde dezembro.

Após o casamento, em um sábado, a jovem ficou bem até a terça-feira, contou o marido. Sentia dores, mas a medicação controlava. No dia seguinte, ela foi de ambulância para uma consulta em Curitiba e ficou internada.

A mãe, mais uma vez, estava junto. Dessa vez, ela ficou no hospital o tempo todo. A filha, que comia doces como uma formiga, já não tinha tanto apetite.

O pai, marido e irmãos iriam para visitas, conciliando horários com os trabalhos. Na semana seguinte ao internamento, eles foram chamados às pressas do sul para a capital.

“Na metade do caminho o Ruan disse que não adiantava a gente correr, que a gente já estava atrasado”, lembrou o irmão. “Eu estava sozinha com ela. Só eu e ela. E Deus comigo”, disse a mãe.

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