A Páscoa pode ser considerada a grande festa cristã. Nessa data, é celebrada a ressurreição de Jesus Cristo. No entanto, a Páscoa já existia desde a Antiguidade, embora com outro significado. Até hoje, a Páscoa simboliza coisas diferentes para judeus e cristãos.
O feriado religioso acontece sempre em um domingo e vai muito além dos ovos de chocolate. Confira a origem da data e seus significados.
Origem da Páscoa
A origem da Páscoa é antiga, mais velha para os judeus do que para os cristãos, inclusive.
“Sabemos que essa festa está muito ligada a um ambiente pastoril, agrário, rural. Era uma festa que existia na Antiguidade no que seria o Oriente Médio hoje.
Provavelmente a Páscoa nasceu como uma festa em comemoração do nascimento das ovelhas na primavera”, conta Gerson Leite de Moraes, coordenador do curso de teologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Na tradição judaica, a Páscoa acontece a partir do momento em que os israelitas se libertam da escravidão dos egípcios. Não é fácil precisar datas, já que os registros arqueológicos são escassos. É possível situar o período de escravidão próximo ao século 13 antes de Cristo, na época do reinado do faraó Ramsés 2º (1279 a 1213 a.C.).
Na Bíblia, o livro do Êxodo (o segundo no Antigo Testamento) é tradicionalmente atribuído a Moisés. Relata o período da escravidão dos hebreus, a saída do povo do Egito e a peregrinação rumo a Canaã, a chamada Terra Prometida. O texto é recheado de passagens que contam o sofrimento do povo sob o jugo egípcio.
“Moisés não aceitou a truculência escravocrata e matou um egípcio. Com medo da sentença de morte, fugiu para o deserto. Depois, foi reenviado ao Egito para propor uma saída da escravidão”, diz o frei Lisaneos Prates, também professor da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
Daí se tem uma definição da Páscoa: saída de uma definição de escravidão em busca de liberdade. Por isso que o termo hebraico ‘Pessach’ significa saída, passagem, esperança, no sentido de superar a escravidão. Frei Lisaneos Prates, professor da PUC-SP.
Como ganhou contornos religiosos?
“No horizonte bíblico, os israelitas são um povo peregrino, migrante, nômade. Ao longo das andanças, foram tendo contato com vários povos e religiões. Houve também contato com religiões politeístas. Eles foram agregando elementos à cultura religiosa, obviamente sem colocar em risco o horizonte monoteísta”, diz o professor da PUC-SP.
Entre Moisés e Jesus, há uma separação estimada entre 1.200 e 1.500 anos. Mas há semelhanças no histórico entre os dois povos.
Na época de Moisés, por exemplo, os judeus sofreram nas mãos dos egípcios. Já nos tempos de Jesus, o perseguidor estava na figura do Império Romano, que contava com o apoio de alguns grupos de judeus.
“Jesus não aceitava a dominação política imperial romana e não aceitava que seus conterrâneos tivessem uma parceria interesseira com a dominação romana. Na época, Jesus foi visto como ameaça e isso gerou uma perseguição”, afirma o frei Lisaneos Prates. “As lideranças judaicas ortodoxas, em conluio ao poder imperial, perseguem Jesus e dão a Ele uma morte violenta na cruz.”
A morte de Jesus foi antecedida da Última Ceia, ou seja, da celebração da Páscoa judaica. Em uma sexta-feira — a Sexta-Feira da Paixão ou Sexta-Feira Santa—, Jesus foi condenado à morte, sendo crucificado.
“A morte de Jesus causou uma dispersão nos primeiros seguidores, por causa do risco de também serem brutalmente assassinados. Muitos se esconderam. E aí vem a ressurreição de Jesus, que foi definitiva para a nova Páscoa. É a cristianização da Páscoa judaica feita pelos seguidores de Jesus”, completou Prates.
Claro que houve descrença, como explica Helmut Renders, pastor e professor do curso de teologia e do Programa de Mestrado e Doutorado em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo.
“Não há uma linha direta de confiabilidade. Não existem provas nem certezas que conseguem desfazer a necessidade de confiança, de fé. Páscoa é uma afirmação da fé. Não há uma forma de cientificamente aprovar ou reprovar”, diz.
O relato bíblico dá conta que, após a ressurreição no domingo, Jesus teria convivido com seus seguidores por aproximadamente 40 dias, antes de ascender aos céus. A cruz virou símbolo.
Primeiro papa
Sem Jesus, começou a difusão do cristianismo a partir do trabalho dos seguidores de Jesus. É o caso de Pedro, um dos apóstolos e considerado o primeiro papa da Igreja Católica. Até então, o cristianismo era considerado um ramo dentro do judaísmo.
No ano de 325, o imperador Constantino organizou o Concílio de Niceia, quando foi dada liberdade de culto aos cristãos.
No ano 380 d.C., durante o governo de Teodósio, o cristianismo se tornaria a religião oficial do Império Romano.
Por que a data da Páscoa muda?
Foi no concílio de Niceia que a data da Páscoa começou a ser discutida. O consenso atual é que a Páscoa tem relação direta com eventos da natureza. O primeiro ponto é a chegada do equinócio de primavera (no hemisfério Norte) —ou seja, a transição de inverno para primavera— ou equinócio de outono (no hemisfério Sul). O fenômeno acontece entre os dias 20 e 22 de março.
“A partir daí, você tem que esperar a primeira lua cheia. O próximo domingo após a lua cheia é o domingo de Páscoa”, diz Gerson Leite de Moraes.
“Da Páscoa, se conta 40 dias para trás, até chegar à Quarta-Feira de Cinzas, que marca o início da quaresma”, completa.
“Ressignificar a Páscoa, mais do que nunca, hoje, é esperança. Em uma pandemia, os mais pobres sofrem mais. A vacina é o grande símbolo da esperança pascal, do êxodo, da passagem, de uma situação que é desumana. É a semente da esperança. O gesto de colocar a vacina no braço é um horizonte da mudança. É passar de uma pandemia perversa, que mata, para um novo tempo”, opina o frei católico da PUC-SP.
Como o Coelhinho da Páscoa entra na história?
É impossível separar a Páscoa tradicional da que envolve o Coelhinho da Páscoa e os ovos de chocolate. É como pensar em Natal —em memória ao nascimento de Jesus— sem Papai Noel. Acredita-se que a tradição do coelhinho tenha raízes na Europa.
“O coelho simboliza a vitalidade. É um animalzinho que tem uma fecundidade a toda prova. Isso corresponde à proposta pascal, com o novo que deve emergir”, aponta Prates, da PUC-SP.
“Já o ovo como símbolo de ressurreição faz parte da iconografia medieval e isso, de certa forma, é preservado nas nossas tradições por meio dos ovos de Páscoa”, afirma Helmut Renders, da Universidade Metodista.