O Atlético Mogi, equipe da Segunda Divisão sub-23 do Campeonato Paulista (equivalente à quarta divisão), tem chamado a atenção por conta de um longo e indigesto retrospecto negativo: a última vitória do time foi no dia 17 de junho de 2017, há quatro anos e três meses.
De lá para cá, o clube de Mogi das Cruzes, na Região Metropolitana de São Paulo, entrou em campo 44 vezes. Foram 42 derrotas e dois empates, com 155 gols sofridos e apenas 18 marcados. O último jogo perdido foi na quarta-feira, para o Manthiqueira, por 4 a 2, em casa, pela sétima rodada do Grupo 5.
Já são 25 derrotas seguidas desde 2019…
E o resultado adverso da última quarta-feira, no Nogueirão, confirmou o que era previsto: a eliminação. O Atlético Mogi, lanterna com zero ponto, não tem mais chances de classificação à próxima fase. Nem mesmo aquelas mais remotas que só a matemática ainda mantinha vivas.
Para além dos números ruins, há sonhos em todas as áreas do clube.
Entre jogadores e comissão técnica, é a busca pela primeira vitória em quatro anos e três meses e a tentativa de firmar carreira como profissionais. Na direção, por outro lado, existe a expectativa de levar o clube de Mogi das Cruzes, fundado em 2004, a uma posição de destaque no estado.
Apesar de todos saberem que há um longo caminho a percorrer, o discurso é de que há evolução. Mesmo sem os resultados…
Derrotado nos sete jogos que fez na atual edição do Paulista, incluindo uma goleada por 9 a 0 para o Mauá, o Atlético tem o clássico da cidade neste domingo, às 15h, contra o União Mogi, clube fundado em 1913. Vencer o rival pode ser a chance de acabar com as brincadeiras que tanto incomodam os que vivem o dia a dia na equipe.
– O Atlético é um clube como vários outros pequenos no Brasil. Falta estrutura, patrocinadores que acreditem no trabalho. O pessoal não vê o dia a dia, o esforço dos meninos, a maioria é de São Paulo, pega trem, vem treinar e depois volta. Este grupo foi montado 30 dias antes de começar o campeonato – resumiu o técnico.
A estrutura
Como acontece na maioria dos times que disputam a Segunda Divisão, os jogadores não recebem salários e muitos precisam fazer longos deslocamentos para treinar e jogar em Mogi – não há alojamento, nem centro de treinamento.
Eles aceitam essas condições, mesmo com dificuldades, por entenderem que o Paulista é uma vitrine interessante para seguir a carreira – suas páginas nas redes sociais costumam ter, inclusive, links de vídeos com lances em jogos para atrair possíveis interessados.
A comissão técnica é reduzida. Não há massagista, nem um preparador físico fixo. Quatro profissionais se revezam ao menos nos jogos de acordo com a agenda. Além do técnico e do treinador de goleiros, o clube trouxe agora um novo auxiliar, que fez sua estreia na última quarta-feira.
O treinador é responsável, também, pelos trâmites burocráticos com a Federação Paulista de Futebol, como credenciamento de jogadores e preparação dos protocolos (inclusive contra a Covid-19) do estádio pré-jogo – por isso, muitos brincam que ele é um “faz tudo” no clube.
O Atlético Mogi manda os jogos no estádio municipal Francisco Ribeiro Nogueira, o Nogueirão, que possui boas condições, mas os treinos acontecem no gramado do parque Leon Feffer, em que a estrutura é bem prejudicada, tanto no campo quanto nos vestiários.
O clube gostaria que ao menos um treino acontecesse no local dos jogos diante desta diferença, mas isto é uma possibilidade pouco provável.
– Tornar o Nogueirão um local com treinos de maior frequência causaria um dano tremendo para o gramado. Não temos como, mesmo as equipes profissionais que estão na ponta do país não treinam com esta frequência no local onde jogam. Por isso existem os CTs, outras situações para preparação. O custeio, manutenção e reparo ficariam pesados para a secretaria. Podemos conversar para ter estudos, falar com engenheiros da parte de gramado. Temos de estar aberto para conversas – respondeu Ewerton Komatsubara, secretário de Esportes e Lazer de Mogi das Cruzes.
– (Sobre o Leon Feffer) Este é um problema crônico com relação a parte estrutural. São anos e anos em que a gente talvez não tenha olhado com carinho a estrutura e manutenção. Estamos agora buscando uma força-tarefa para que estes locais sejam minimamente melhorados – resumiu.
O elenco
Diante da falta de poderio financeiro, os jogadores do Atlético chegam por indicações ou por uma espécie de peneira de jogadores profissionais de 18 a 22 anos. O clube fez anúncios da seletiva em suas redes sociais até julho, um mês antes da estreia no Paulista.
Anderson, o técnico, considera este um elenco com potencial, mas ainda pouco experiente e montado às pressas. Ele acredita que se a base for mantida para a próxima temporada o desempenho será melhor.
Nas sete derrotas, seis foram por no máximo dois gols de diferença – os 9 a 0 para o Mauá são vistos como um ponto fora da curva. Ano passado, as goleadas foram mais frequentes: dois 9 a 0, um 6 a 0 e um 5 a 0.
Já com rodagem na Segunda Divisão, o jogador está no Atlético Mogi desde o ano passado e não esconde a chateação quando se fala apenas dos resultados da equipe.
– É muito dolorido, não só para mim, mas para todos que estão na luta. Eu particularmente acordo 6h da manhã, pego uma hora de ônibus até o Tucuruvi, metrô até a estação da Luz, então a linha 11 da CPTM até a estação de Braz Cubas (em Mogi). Costumo chegar em casa pelas 15h e já saio novamente para treinar na parte da tarde com o treinador de goleiros Romero Nunes. E ainda assim temos que ver pessoas falando sobre nós sem saber um terço do que passamos. Mesmo com todas as dificuldades, entramos em campo e damos o melhor, e em seis das sete partidas batemos de frente com os adversários – completou.
Falta de apoio
O Atlético Mogi não tem patrocinadores – a marca que estampa o uniforme é da empresa “Representaciones Desportivas”, que tem o presidente do clube Roberto Costa como sócio.
Agente e intermediário de negociações com o futebol internacional, Roberto tem relação com o clube desde 2009. Naquele ano, participou da maior negociação da história do time: a ida do atacante Maicon Oliveira ao Volyn, da Ucrânia. O jogador ainda passou pelo Shakthar Donetsk antes de morrer em um acidente de carro, em 2014.
Ao longo desses quatro anos sem vencer, o clube chegou a perder um jogo por W.O., em 2018, e sob o comando da antiga presidência foi acusado de maus-tratos a menores, em 2017.
Roberto Costa assumiu o comando total do clube neste ano e reclama da falta de apoio na cidade. Todos os gastos são do dirigente – desde os cerca de R$ 2,5 mil por jogo para mandar os confrontos no estádio municipal Francisco Ribeiro Nogueira, às ajudas de custo que sejam necessárias para atletas e comissão técnica.
– O Atlético tem um espírito guerreiro. Momento de pandemia, vários times de tradição na segunda divisão do Campeonato Paulista, e o Atlético, considerado o caçula de Mogi das Cruzes, entrou sem investidor, sem apoio de ninguém e estamos mantendo o Atlético de pé até hoje – respondeu o presidente.
Os filhos estão com ele de diferentes formas: Roberto Costa dos Santos é o vice-presidente, enquanto Roan é jogador e capitão do time.
– A gente, com todas as dificuldades, a falta de apoio no futebol profissional de Mogi das Cruzes, considera um clube vencedor. Respondam construtivamente: qual o time da Primeira Divisão de São Paulo que revelou um jogador que ninguém conhecia para o futebol da Ucrânia? Que fez a transferência para um dos times mais importantes do futebol internacional como eu, Roberto Costa, e o Atlético fizemos? Nosso objetivo é levar o Atlético como representante de Mogi das Cruzes nas principais divisões do futebol paulista – reforçou.
Quanto à marca de 44 jogos sem vencer, o dirigente diz que não está preocupado:
– Eu não estou preocupado aqui com estatística. A vitória é boa, faz feliz, sem dúvida. Futebol vive de resultado, mas quero fazer um Atlético competente, representante de Mogi das Cruzes nas principais divisões do Campeonato Paulista. Mas para isto precisamos de apoio melhor da secretaria de esportes, da cidade. O Atlético está em um processo crescente. O importante, para a diretoria, é que o clube possa progredir, possa melhorar. E as pessoas de Mogi das Cruzes entenderem: não é só Mogi que precisa de um representante nas divisões importantes do Campeonato Paulista.
– O futebol profissional representa o Brasil, como Penapolense, Rio Claro, Mirassol… Mogi das Cruzes tem tudo para chegar onde estas cidades chegaram, mas para isto precisa dar um apoio melhor ao futebol profissional. Precisa apoiar mais o Atlético Mogi. Se tiver apoio da cidade, tenho certeza que vamos ser os representantes de Mogi nas principais divisões do futebol paulista.
O que diz a prefeitura
Mogi das Cruzes, com população de cerca de 450 mil habitantes, é uma cidade que tem uma relação próxima com o basquete – o próprio secretário participou do projeto de reconstrução do Mogi Basquete. Já os diretores dos clubes de futebol da cidade alegam que lhes falta apoio.
A prefeitura afirma que não coloca dinheiro público para patrocinar modalidades esportivas, mas busca diversificar as opções de esportes na cidade, além do basquete. O futebol entra no plano, mas o foco neste momento é na liga amadora, que tem força em Mogi.
– A gente teve em reuniões, não só com o responsável do Atlético, mas do União (Mogi), nosso clube mais do que centenário. Mas precisa ser um estudo muito profundo. Antes de falar do esporte profissional, a gente está realizando isso, é uma melhor estruturação e diversificação do futebol amador da cidade. Não podemos pensar no futebol profissional antes de entender de verdade o que representa o futebol amador na cidade – pontuou Ewerton Komatsubara.