Pimenta: a gente nunca esquece uma caravana na BR-364, ainda mais quando descobre o macadame

Solo de tabatinga e pedras importadas são argumentos para justificar alto custo da manutenção

Foto: Aleac

Tecnologia

A caravana pela BR-364 até Cruzeiro do Sul realizada na última sexta-feira (30), foi mais uma para fortalecer e consolidar a luta pela travessia da rodovia com o máximo de conforto e segurança por todo o sempre e sob qualquer clima. A julgar pelos comentários dos participantes do evento, no futuro o uso de macadame hidráulico permitirá ao tráfego flutuar sobre um tapete de pedras grandes, recheadas de pedregulhos e preenchidas por areia molhada e prensada por rolo compressor. Uma tecnologia milenar, segundo o engenheiro Ricardo Araújo, superintendente do Dnit no Acre, nunca implantada naquela região por conta do alto custo, 40% superior.

Flaviano

A caravana para Cruzeiro do Sul foi uma iniciativa compartilhada entre o gabinete da deputada federal Socorro Nery (PP), pela mesa diretora da Aleac, comandada pelo presidente Luiz Gonzaga e pelo o Governo do Estado, representado pela vice-governadora Mailza Assis. Um evento que já pode ser considerada uma tradição implementada há muito tempo lá atrás, como diz o refrão. O então candidato a governador do Acre em 1986, Flaviano Melo, teria sido o precursor da aventura, segundo narra o jornalista Elson Martins em artigo publicado em 2014.

Currículo

Até então, o chefe do MDB no Acre, Flaviano Melo, tinha como maior realização profissional, antes de ser nomeado prefeito da capital, um cargo de engenheiro da Construtora Mendes Junior e uma atuação na construção da ponte Rio-Niterói. Tal experiência o tornaria credenciado para concretizar o sonho acreano de asfaltar a rodovia BR-364 até Cruzeiro do Sul. “Montou uma caravana com três ônibus novos da Viação Rio Branco, mais três a quatro camionetes F-1000 com tração nas quatro rodas, colocadas à sua disposição, além de alguns veículos menos adequados, de puxa-sacos de plantão, e seguiu em cortejo embalado pela musiquinha de campanha: ‘O que o povo quer será’!”, escreve Elson Martins.

Epopeia

“Após cinco dias de atoleiro e pernoites mal dormidos, a caravana chegou a Cruzeiro em festa, causando um ‘frisson’ na cidade. Os atropelos da viagem e também o acanhamento do candidato estreante, contudo, não atrapalharam a estratégia eleitoral. Foi eleito governador com votos dos vales do Acre e do Juruá em clima esperançoso. Mas o que o povo queria de verdade – a conclusão da estrada com asfalto – só aconteceria três décadas e meia depois, em 2013, no governo da Frente Popular. E coube ao governador Tião Viana “cortar a fita”, afirma o jornalista Elson Martins. Mas, na verdade a BR já havia sido inaugurada antes, pelo governador Orleir Cameli, no trecho entre Rio Branco e Sena Madureira, um asfalto que até hoje resiste com alguns remendos inevitáveis dada à sua longevidade. Depois voltou a ser inaugurado quando o asfalto chegou no último trecho entre o rio Liberdade e Cruzeiro do Sul. E voltará a ser inaugurada quando chegar o piso de macadame hidráulico.

1998

Em 2013, por ocasião da morte do ex-governador Orleir Cameli, o então governador, Tião Viana, que havia sido seu adversário em 1994, lamentou o falecimento em nota oficial. O governador petista disse que Orleir Cameli foi responsável pela “integração e o desenvolvimento do Estado – notadamente o asfaltamento da BR-317 de Senador Guiomard a Brasiléia, o asfaltamento da BR-364 no trecho de Rio Branco a Sena Madureira, além da reabertura da estrada de Sena Madureira a Cruzeiro do Sul no verão de 1998, depois de nove anos totalmente fechada”.

Consórcio

O custo da manutenção da estrada por conta do solo ruim e da falta de pedras é alvo de críticas desde o início de sua reabertura no segundo mandato do governo Jorge Viana. Em novembro de 2005, por exemplo, o jornal O Rio Branco, do empresário Narciso Mendes, acusava a existência de um consórcio de empresas suspeitas atuando na recuperação da estrada. A coluna vai substituir o nome das empresas por números para não mexer antigas feridas que já podem estar cicatrizadas. “Conforme a fonte do Complexo de Comunicação O RIO BRANCO, de um empréstimo de R$ 150 milhões conseguido junto ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para executar dois trechos na BR-364, a construtora 01 se consorciou com a empreiteira 02 e ganhou um trecho no valor de R$ 96 milhões.

Em família

A reportagem prossegue: “Por outro lado, a construtora 3 se consorciou com a empreiteira 4 e ganhou um trecho de R$ 44 milhões. Em se tratando de um negócio feito em família, o resultado não poderia ser diferente: o trecho que coube ao consórcio 1 e 2 saiu ao preço de R$ 1,9 milhão o quilômetro; o trecho do consórcio 3 e 4 a R$ 2,2 milhão o quilômetro. O governo Orleir Cameli (1995/1998) pavimentou vários trechos dessa mesma rodovia, com igual topografia e mesmo solo, ao preço de R$ 400 mil o quilômetro. A alegação da carestia dos insumos (pedra, asfalto, cimento, etc) importados não justifica, já que nos governos passados também foram comprados em outros estados.

Pedras

Os participantes da última caravana parecem encantados com a informação de que o macadame hidráulico pode ser a salvação da estrada. De acordo com o engenheiro Ricardo Araújo, superintendente do Dnit e velho conhecido do trajeto, por um custo 40% superior é possível aplicar a tecnologia, amplamente utilizada em todo o mundo desde a antiguidade. A pergunta que fica é porque não foi aplicada até agora? O custo-benefício parece interessante tendo em vista o valor das despesas quase anuais para conservação da pista.

Insumos

Desde sempre, portanto, o solo de tabatinga e o custo das pedras têm sido apontados como fator do encarecimento da manutenção da estrada. Em abril passado, durante uma audiência pública na Aleac sobre a situação da BR-364, o empresário Jarbas Soster, falou como representante das empresas do setor. Ele é dono da MSM, que há anos atua em obras de conservação da rodovia. “Um dos problemas que a gente mais enfrenta é referente à escassez de mão de obra. Outra questão é com relação aos preços elevados dos insumos, que a maioria deles vem de Rondônia e Manaus. O material sai muito caro. O Acre já quebrou muita empresa por conta disso, é tudo muito difícil. Sem falar na grande deficiência de logística”, disse.

Vermelho

Jarbas disse que o principal problema da BR-364 é a defasagem dos contratos. “A questão é, logicamente, o preço. O preço que o órgão se propõe a pagar, o preço máximo não atende mais os custos que estamos tendo para atender essas obras. Cada medição é no vermelho. Nós estamos tirando dinheiro de outra área para colocar no Dnit”, disse o empresário, filho do ex-deputado Waldomiro Soster, proprietário do grupo familiar Pedra Norte. A empresa pode ser chamada de única pedreira do Acre, só que sua jazida fica em Rondônia e a sede administrativa em Rio Branco.

Cortes

No comando do Dnit em abril, quando aconteceu a audiência na Aleac, Carlos Moraes, comentou que durante todo o governo de Bolsonaro, entre 2019 e 2022, os orçamentos destinados à rodovia caíram drasticamente com relação a 2018. Para se ter uma ideia, em 2018, o orçamento foi de R$ 185 milhões. Já em 2019, caiu para R$ 113 milhões. Em 2020, R$ 102 milhões. Os anos de 2021 e 2022 os orçamentos foram: R$ 127 milhões e R$ 92 milhões, respectivamente. No primeiro ano do governo Lula saltou para R$ 174,9 milhões.

Fiscal

A deputada federal Socorro Neri (PP) uma das organizadoras da excursão pela BR-364, vem a ser membro titular da Comissão Externa da Câmara que fiscaliza obras públicas em todo o país. De acordo com ela, fazia três anos que o governo federal negava recursos para as BRs. “Mas, graças a PEC da Transição, foi possível alocar esses recursos para essas obras iniciais e já há a garantia do presidente para liberação de mais recursos uma obra definitiva, com nova tecnologia”, disse Socorro.

Novo olhar

Há mais de 20 anos esquadrinhando a rodovia BR-364 em suas campanhas eleitorais o líder da oposição na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), deputado Edvaldo Magalhães (PCdoB), também participou da caravana de sexta-feira (30). Segundo ele a falta de investimentos na BR-364 para serviços de manutenção, por parte do governo Bolsonaro, à rodovia a uma condição precária. Edvaldo crê que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá um outro olhar para o Acre, com a inclusão da estrada no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). “Foi o presidente Lula mandando reformar o orçamento da União, que não tinha dinheiro para infraestrutura, todo mundo sabe. A nossa bancada federal agora pode bater na porta, mas também a porta se abre para que o dinheiro venha”, disse o parlamentar.

Justa causa

O prefeito Mazinho Serafim, de Sena Madureira, ao receber em sua casa a comitiva de parlamentares e representantes de órgãos envolvidos com a recuperação da BR-364, disse que a causa é justa e que toda a classe política do Acre, precisa apoiar a ideia. De acordo com o prefeito, 60% da população do Acre dependem da rodovia que une os vales do Acre e do Juruá. Em Sena, a esposa do prefeito Mazinho, a deputada federal Meire Serafim, e o deputado coronel Ulysses, se juntaram à comitiva.

Hemodiálise

“Mas minha maior preocupação é com o pessoal de Sena e que faz tratamento de hemodiálise em Rio Branco e que precisam ir à capital três vezes por semana”, lembrou Mazinho Serafim. “Esse é só um exemplo da necessidade e importância desta estrada para mais da metade da população do Acre”, acrescentou. O deputado estadual Nicolau Júnior (Progressistas), lembrou que a população do Acre precisa virar a historia sobre essa rodovia. “Precisamos começar a pensar em outros projetos estratégicos além da rodovia”, disse Nicolau Júnior.

Frente federal

Os deputados federais Socorro Neri, coronel Ulysses, Meire Serafim e anunciaram que, na próxima semana, em Brasília, será constituída uma frente parlamentar de defesa da BR-364. A nova frente deverá ser presidida por coronel Ulysses e com Zezinho Barbary na vice-presidência. Socorro Neri é autora da proposta que propiciou a caravana que fiscaliza as obras da BR.

Frente estadual

Por sua vez, os deputados estaduais como Pedro Longo (PDT), Gilberto Lira (União), Antonia Sales (MDB) e Manoel Moraes (Progressistas) e o presidente Luiz Gonzaga também anunciaram para agosto, após o recesso parlamentar, a criação de uma frente parlamentar estadual para acompanhar as obras de recuperação da estrada.” Essa estrada é a espinha dorsal do nosso desenvolvimento e por isso a classe política deve permanecer em sua defesa”, argumenta Gonzaga.

Lula cá

O senador Sérgio Petecão e a governadora em exercício Mailza Assis também se manifestaram e defenderam a necessidade da estrada para o desenvolvimento do Acre. Mailza Assis lembrou a defesa que o governador Gladson Cameli faz da rodovia junto dos ministros do presidente Lula. Petecão lembrou que, na semana, esteve reunido com Lula e o convidou a vir ao Acre visitar as obras da BR.

O sucessor

O que o ex-presidente Bolsonaro fez ou deixou de fazer pela BR 364 está claro e transparente nos números mencionados pelo ex-superintendente do Dnit. Mas isso não importa para os bolsonaristas do Estado e eles estão vivos e ativos sendo a maioria esmagadora do eleitorado acreano. De acordo com uma pesquisa do jornal Estado de São Paulo, diante da cassação dos direitos do Mito, os bolsonaristas no Acre não veem Tarcísio Freitas, atual governador de São Paulo, como candidato em potencial para as próximas eleições. A pesquisa foi feita em cerca de 150 grupos de WhatsApp e apontou, ainda, o nome da ex-ministra da Agricultura e atual senadora, Tereza Cristina, como preferência aos acreanos ligados ao agronegócio. O levantamento busca descobrir qual possível candidato a direita acredita que seja uma opção para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições de 2026.

Rejeição

Seguindo tendência de outras regiões do país, como a região do triângulo mineiro, Pará e Rondônia, os acreanos acreditam que Tarcísio deve seguir governando São Paulo, buscando a reeleição. Além do Acre, Tereza Cristina cresce entre os ruralistas de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Paraná. Eles defendem alguém ligado diretamente ao agronegócio e rejeitam os nomes de Romeu Zema, governador de Minas Gerais, do Novo, e de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que comanda o Palácio dos Bandeirantes.

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