A Polícia Civil investiga um suposto caso de agressão contra um grupo de cinco pessoas que distribuía alimentos a indivíduos em situação de rua em uma praça próximo ao terminal Sacomã, na zona sul de São Paulo, na madrugada do último sábado (6/7).
Simone Maldegan, voluntária do Projeto Abayomi, estava com o grupo, entre meia-noite e uma hora da manhã, enquanto acontecia uma festa num prédio na proximidade. Ela disse ao Metrópoles que uma pessoa que estava na festa apareceu e começou a questionar se os voluntários sabiam sobre o chamado “PL da Fome”, que criou uma série de condições para que se possa fazer doação de comida à população de rua. A proposta teve uma grande repercussão negativa e o autor do projeto, o vereador Rubinho Nunes, suspendeu a tramitação na Câmara Municipal.
Simone afirma que a síndica do prédio onde ocorria a festa, acompanhada de 10 pessoas, proferiu palavras de baixo calão e a agrediu com tapas, socos e arranhões, causando hematomas nos braços.
“Perguntou por que estávamos alimentando bandido. Respondi que a proposta foi retirada de votação e começou uma confusão.”
O boletim de ocorrência registrado na tarde desta segunda-feira (8/7) autorizou o exame de corpo de delito da vítima, que está com marcas no corpo. O caso será investigado pelo 16º DP (Vila Clementino).
O presidente do Instituto Amigos, Geraldo Silva, avalia que o vereador Rubinho Nunes é o culpado pelo ato de violência contra os voluntários do Projeto Abayomi. Para ele, o político precisa se retratar. “Ele é o causador disto. [Simone] Teve que ir parar no pronto-socorro por conta da agressão física do ‘cidadão do bem’. Nunca havia ouvido falar deste tipo de violência nas ações das 21 ONGs que pertencem ao Na Rua Somos Um.”
Procurada, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) ainda não se manifestou sobre a investigação do caso. O agressor não foi identificado para dar sua versão.
Projeto previa multa de até R$ 17.680
O vereador Rubinho Nunes (União) anunciou, no dia 28 de junho, a suspensão da tramitação do projeto de lei que estabelece regras para a doação de alimentos à população de rua. A proposta trazia a previsão de multa de até R$ 17.680 a quem fizer doações sem aval da Prefeitura de São Paulo.
O Projeto de Lei nº 445/2024 chegou a ser aprovado em primeiro turno na Câmara Municipal no dia 26 de junho, em votação simbólica que durou 34 segundos. O texto deveria ser submetido a uma segunda votação, antes de ser encaminhado para sanção do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB).
Antes de anunciar a suspensão da tramitação, Rubinho disse ao Metrópoles, na manhã desta sexta, que, diante da repercussão negativa, iria editar a proposta, por meio de um substitutivo, para retirar a previsão de multa a pessoas físicas e entidades religiosas.
Horas depois, o vereador anunciou a desistência da proposta. “A suspensão da tramitação tem o objetivo de ampliar o diálogo com a sociedade civil, as ONGs e as demais associações”, buscando o aperfeiçoamento do texto.
“Desde o início, o objetivo da proposta é ampliar a distribuição alimentar, otimizar as doações, evitar desperdício e, principalmente, acolher as pessoas em situação de rua e vulnerabilidade, dando a elas oportunidade de melhoria, dignidade e higiene ao se alimentar”, afirma Rubinho Nunes na nota.
Ao Metrópoles o vereador admitiu que “houve erro”. O anúncio sobre a suspensão da tramitação da proposta foi feito após reunião com o presidente da Câmara, Milton Leite (União). Rubinho Nunes disse que não tratou do projeto de lei na conversa.
“Houve erro no projeto. Ele permite uma interpretação extensiva, que acaba prejudicando especificamente as ONGs e associações que fazem ali doações da maneira quase que familiar. A multa também era excessiva e nós optamos por retirar o projeto, abrir um diálogo com a sociedade civil, e apresentar um novo”, disse.
Acolhimento
Rubinho Nunes havia dito ao Metrópoles que a ideia não era punir doações individuais. O objetivo do projeto, diz ele, é melhorar a qualidade no acolhimento às pessoas em situação de rua, oferecendo um caminho para que elas procurem um abrigo.
“A pessoa pode doar. Você vê uma pessoa passando fome, abre o vidro do seu carro, você não vai ter problema nenhum. Você não está fazendo uma doação em larga escala. Você não está sendo impedido. Não tem burocracia. É só a pessoa falar: ‘Quero doar mil marmitas segunda-feira na hora do almoço’. É simples. Ninguém vai passar fome por isso. Você só organiza as ONGs”, afirma Rubinho Nunes.
“O objetivo é organizar a doação em larga escala, de ONGs, associações que doam lá. Chegam lá com mil marmitas. Às vezes elas fazem distribuição no mesmo local. As pessoas vão comendo na rua, na sarjeta. O texto prevê a instalação de tendas, para que as pessoas passem por triagem, tenham uma oportunidade de acolhimento. E aí elas possam ganhar um pouco mais de dignidade para sair da rua”, complementa o vereador.