Acre pode enfrentar problemas com desertificação; entenda o fenômeno

O dia mundial de combate à desertificação e à seca é comemorado neste mês de junho e o perigo pode estar mais perto do que se pensa

A floresta Amazônica é a maior floresta tropical do mundo, entretanto, até mesmo nela a deterioração pode chegar em níveis irreversíveis, e com isso poderá ser observado o início do processo de desertificação no local. Mas a floresta pode se transformar em um grande deserto nas próximas três a cinco décadas, de acordo com informações do projeto Floresta+ Amazônia

Outras pesquisas, da Universidade Federal do Acre, apontam que existe a possibilidade de que trechos do rio Acre, dentro do perímetro urbano, em período parecido ao indicado pelo projeto, venham estarem completamente secas.

Ainda existem estudos que apontam para um processo mais brando, mas também preocupante, que seria a transformação da densa floresta Amazônica, passando por um processo de savanização, deixando o local com uma vegetação mais rala.

A Amazônia já passou por um processo de savanização anteriormente ,que pode ser agravado desta vez pela ação humana/ Foto: Reprodução

“O solo amazônico usado em exagero para a agricultura pode dar início a esse processo”, diz Francisco Mendonça, professor de geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), à revista Mundo Estranho.

Os problemas relativos à seca já tomam proporções internacionais, com a Aliança Internacional para a Resiliência à Seca, aderida pelo Brasil durante a 27ª Cúpula da ONU sobre o Clima (COP27).

O grupo visa reunir capital político, financeiro e técnico para realizarem ações que consigam preparar o planeta para futuras secas extremamente severas. Oficialmente, cerca de 38 milhões de brasileiros distribuídos em mais de 1.500 municípios estão sendo afetados de alguma maneira pela desertificação e seca. 

Segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, a seca de 2023 na Amazônia teve índices que preocupam, fazendo com que áreas consideradas semiáridas comecem a avançar para climas tidos como desérticos

Seca deve ser ainda mais severa em 2024. Foto: Juan Diaz/ContilNet

Somado a isso observou-se também que ainda no ano de 2023, uma a cada quatro pessoas em todo o mundo foi afetada por eventos extremos de seca, o que significa um valor de aproximadamente dois bilhões de pessoas.

Anderson Azevedo Mesquita é doutor em geografia e professor da universidade federal do Acre, e explica sobre como as ações do homem podem influenciar nos ciclos naturais de desertificação.

“A própria floresta amazônica passou por um processo desse ao longo do tempo, influenciando no perfil da vegetação que recuou para o que seria hoje parecido com o cerrado ou com a savana. Mas ações do homem podem sim intensificar esse processo que ocorre de forma natural”, conta o doutor.

O pesquisador explica ainda que um processo como esse ocorrer em solo amazônico não é impossível, apesar de muito difícil. “É um processo que pode ocorrer dadas as alterações e modificações no uso do solo e também das alterações climáticas. Seria possível sim que ocorresse na Amazônia”, explica.

O semiárido nordestino já tem 13% do território em processo de desertificação/Foto: Agência Brasil

Sobre o rio Acre em específico, que na sexta-feira (14) marcou pela primeira vez em 2024 um nível abaixo dos dois metros, o que não ocorria neste período desde 1971. O pesquisador explica que os extremos se tornarão cada vez mais comuns na região, com períodos de seca cada vez mais extremos, mas com as cheias também sendo mais impactantes.

Vejo mais: Rio Acre fica abaixo dos 2 metros e cota em junho já é a pior desde a década de 70

“As chuvas tendem a reduzir muito entre maio e setembro, levando o rio a reduzir drasticamente o volume impactando o abastecimento da cidade. Em contrapartida, com cada vez mais frequência vamos ter um período de precipitação mais intensa fazendo com que o rio chegue a cotas maiores”, afirma Mesquita.

Ele explica ainda que o leito do rio muda de maneira natural conforme o passar do tempo, porém os cuidados com ele podem impactar de maneira direta o quão rápido essas alterações podem acontecer e também como elas acontecem. 

“O rio Acre particularmente é muito degradado, principalmente o seu curso dentro do perímetro urbano, com as margens desprotegidas, junto com as mudanças climáticas, infelizmente esses dois fatores, fazem a gente ter um ambiente caótico, que não é nem no futuro, é no presente, já é uma realidade”, pontuou.

Os desequilíbrio ambiental potencializa os dois extremos, não só a seca, agravando também as enchentes/Foto: Reprodução

O pesquisador ainda ressalta os impactos para a população, que ficará sem abastecimento caso a seca continue se agravando, destacando também as populações ribeirinhas, que muitas vezes usam dos rios para se deslocarem e poderão ficar isoladas com a piora das secas.

“Infelizmente a população mais pobre é menos assistida, estão mais vulneráveis, tendem a ter uma piora muito forte muito mais intensa da sua qualidade de vida”.

O professor diz que a situação já chegou em um ponto de não retorno, e que a partir disso é necessário reduzir os danos causados e depois aprender a lidar com as novas situações causadas por esse desequilíbrio, que tende a levar climas cada vez mais ao extremo.

“O ponto principal é a floresta em pé, também a redução do uso de combustíveis fósseis e utilizar outras matrizes mais limpas e mais eficientes”, pontua.

Como proposta de resolução do problema, o doutor diz que as mudanças devem começar pela educação. “Precisamos construir alternativas, ter estrutura, trabalhar a cultura educacional para poder lidar com esses efeitos da melhor forma possível evitando o máximo a perda material, mas principalmente tentando preservar aquilo que há de mais importante que é a vida”.

É importante salientar que os efeitos das mudanças na Amazônia podem levar outros lugares do Brasil, e talvez até mesmo da América do Sul a terem mudanças irreversíveis nos seus climas, o que já vem acontecendo em território nacional, onde localidades anteriormente semiáridas estão passando a se transformar em biomas mais inóspitos.

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