“Tomei a mais difícil decisão da vida: te entubar”, diz médica que perdeu o pai para covid

“Sim, esse é meu pai. Vítima da covid-19, com quadro grave, entubado na UTI”. É assim que a médica paranaense Claudia Moschen Antunes, de Francisco Beltrão, começa seu relato que viralizou rapidamente nas redes sociais. Infelizmente, o pai de Claudia, que tinha 75 anos, não venceu o vírus e faleceu no dia 2 de janeiro, após 30 dias de internação. “Hoje fica apenas a dor e a saudade”, disse.

Em entrevista à CRESCER, ela, que trabalha em UTI como intensivista há 15 anos, disse que tem sido muito difícil para os profissionais de saúde continuar trabalhando dentro do hospital onde familiares ou amigos ficaram internados ou morreram. “Para mim, foi muito difícil voltar à UTI onde meu pai esteve internado, ver o leito dele ocupado por outro paciente, lembrar do respirador que ele usou, do tratamento que ele fez, do esforço de todos da equipe, das lágrimas escondidas atrás das máscaras, das palavras de apoio e carinho — ‘Ele vai ficar bem’, ‘Ele vai melhorar’. A dor é imensa. Nesse período, revisei todo tratamento dele várias vezes, tudo certo no momento certo e por que ele se foi? Não tinha doenças, era saudável, forte e feliz, nunca havia sido internado… Porque a covid escolhe alguns pacientes aleatoriamente. Por isso, nunca subestime seu poder. Sempre disse a todos: ‘Não tenha medo, tenha respeito’. Não podemos prever como nosso corpo vai reagir frente a esse vírus, independente da idade, doenças prévias ou condições imunológicas. Hoje, uma paciente olhou bem fundo nos meus olhos e disse: ‘Você salvou a minha vida’ Fico feliz, porém, continuo a pensar: ‘Mas não consegui salvar meu pai'”, desabafou.

Claudia também lamentou que o vírus não seja levado tão à sério por uma parcela da população. “As pessoas que não viveram a doença na família não têm ideia da gravidade e das consequências. Infelizmente, grande parte da população não faz as medidas preventivas, que é a única forma eficaz de combate até o momento”, comentou. Além do pai, ela perdeu também um grande amigo e colega. “Meu colega e um dos melhores amigos. Trabalhamos juntos em São Paulo e ele era intensivista também”, disse.

Confira, abaixo, o depoimento de Claudia que viralizou nas redes sociais.

“Sim, esse é meu pai. Vítima da covid-19, com quadro grave, entubado na UTI. Foi difícil pegar o resultado do seu exame, foi difícil tratar você… Você dizia que estava ótimo. Foi no décimo dia que sua oxigenação caiu… internou imediatamente, recebeu todo suporte rápido e, mesmo assim, 56 horas depois, eu tomo a mais difícil decisão da vida: te entubar! Quando você chegou ao hospital, eu brinquei: ‘Você quis vir conhecer nossa unidade de tratamento da covid por dentro (risos)’ Quem imaginaria… Foi difícil ver você piorando; foi difícil dizer que não podia voltar pra casa, pois não estava bom; foi difícil ver você com tanta falta de ar e tosse que te sufocava. Tive medo sozinha… No meio da madrugada éramos eu e você! Perguntei apenas uma vez: ‘Porque?’ Nunca saberei… mas sei que tudo tem um motivo e um sentido. Deus sabe o porque mesmo quando não estamos preparados para isso. Mas vocês me ensinaram a ter coragem…

Foi difícil juntar seus pertences do quarto e levar para minha casa. Pensei: ‘Como somos finitos’ Alguns minutos e seu celular, sua carteira, seu óculos, seus livros, tudo já não era mais seu! Todos os dias, quando chego na UTI, eu sorrio e digo: ‘Bom dia, pai. Força!’ Uma lágrima vai nascer, mas não posso chorar, pois molha a máscara e tenho outros pacientes pra ver. Então, respiro fundo e continuo, afinal, muitos dependem do meu cuidado. Sento para prescrever os pacientes com você ao meu lado, será que me ouve? Talvez… Cada alarme que toca vindo de você faz meu coração parar. Cada telefone do hospital agora pode ser pra mim: a filha do seu Vitor Soares Antunes. 

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