Há exatos 35 anos, em 22 de dezembro de 1988, o Acre perdia um de seus filhos mais ilustres, um defensor da Amazônia e um ícone internacional na luta pela preservação ambiental. Chico Mendes, líder ambientalista nascido no seringal Porto Rico, em Xapuri, deixou um legado que ecoa pelos anos, iluminando caminhos como uma poronga nas trilhas noturnas dos seringueiros.
Quem foi Chico Mendes?
Francisco Alves Mendes Filho, carinhosamente conhecido como Chico Mendes, nasceu em 15 de dezembro de 1944, em meio às seringueiras que se estendiam por Xapuri. Desde jovem, Chico trabalhou como seringueiro, compartilhando os desafios com as famílias que dependiam do extrativismo para sobreviver.
Alfabetizado aos 16 anos, Chico Mendes começou sua jornada de luta pelos direitos dos seringueiros e pela preservação da floresta. Sua atuação ganhou destaque na década de 1970, quando a expansão dos pecuaristas ameaçava as terras de floresta do Acre. Chico organizou os “empates”, bloqueando tratores e confiscando motosserras para deter o avanço do desmatamento.
O ambientalista visionário
Chico Mendes não apenas liderou os seringueiros na resistência contra a exploração, também fundou o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, com seu amigo Wilson Pinheiro, e posteriormente o Sindicato Rural de Xapuri. Sua visão transcendia as fronteiras do Acre, alcançando o cenário nacional e internacional.
Em 1985, no 1º Encontro Nacional dos Seringueiros, Chico reuniu centenas de pessoas na Universidade de Brasília, dando origem ao Conselho Nacional dos Seringueiros e à Aliança dos Povos da Floresta. Suas propostas incluíam a criação de reservas extrativistas, uma revolução conceitual que unia a preservação ambiental aos modos de vida tradicionais.
Reconhecimento nacional e internacional
A luta incansável de Chico Mendes ultrapassou fronteiras. Em 1987, suas palavras na conferência do BID levaram à suspensão do financiamento para a expansão da rodovia BR-364, evidenciando o impacto global de suas ações. No ano seguinte, ele recebeu a Medalha de Meio Ambiente da Better World Society e o Global 500 da ONU.
Em 1989, pouco depois do assassinato de Chico Mendes, o ex-Beatle Paul McCartney homenageou o seringueiro com a música How Many People (Quantas Pessoas), faixa do seu oitavo álbum solo, Flowers in the Dirth (Flores na Sujeira). A canção é uma homenagem não apenas a luta de Chico Mendes, como também a de tantos outros que morreram lutando por um mundo melhor.
A morte que não silenciou a voz
O prestígio internacional de Chico Mendes gerou descontentamento entre ruralistas e políticos locais. As ameaças de morte aumentaram, culminando no trágico dia 22 de dezembro de 1988, quando Chico foi assassinado no quintal de sua casa em Xapuri. Seu legado, entretanto, transcendeu sua morte.
Dois anos após sua partida, as primeiras reservas extrativistas foram criadas no Acre, com uma delas recebendo seu nome em homenagem. Em 2004, Chico Mendes foi reconhecido como Herói da Pátria, e, em 2013, tornou-se o Patrono Nacional do Meio Ambiente.
O eco de sua filosofia: “Não há defesa da floresta sem os povos da floresta”
Chico Mendes não apenas lutou contra a exploração dos seringueiros, mas também enxergou além, abraçando a filosofia do ecossocialismo. Sua visão ampla rejeitava um sindicalismo ou ecologismo restrito, unindo a defesa da natureza aos direitos humanos.
Hoje, recordamos Chico Mendes não apenas como um líder ambientalista, mas como um herói que iluminou os caminhos da preservação ambiental e da justiça social. Seu legado persiste em cada árvore da Amazônia, em cada seringueiro que continua a lutar, e em cada coração que acredita na possibilidade de harmonia entre homem e natureza. Que o exemplo de Chico Mendes continue a guiar nossos passos na construção de um futuro sustentável.
“Sua enorme crença na capacidade humana de superar as contradições do mundo em que vive, se organizando social e politicamente, foi capaz de inspirar todo um conjunto de ideias e práticas que vê a natureza, com sua produtividade e capacidade de auto-organização, e a criatividade humana na sua diversidade cultural como base de uma racionalidade ambiental ou, como ele gostava de chamar, de uma sociedade que combine socialismo com ecologia”, escreveu Carlos Walter Porto-Gonçalves, amigo de Chico Mendes e um dos maiores geográfos da história do Brasil.