O Senado confirmou na tarde desta quarta-feira (4) a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à prorrogação da desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia.
Como a Câmara já havia seguido o mesmo caminho nesta manhã, o veto está derrubado em definitivo. A desoneração da folha de pagamento para esses setores, que empregam cerca de 6 milhões de pessoas, será, portanto, mantida até dezembro de 2021.
O veto presidencial foi derrubado por quase unanimidade dos senadores presentes. Foram 64 votos a favor da derrubada -eram necessários 41 votos, o que representa a maioria absoluta na Casa. Apenas dois senadores votaram pela manutenção.
Situação semelhante já havia ocorrido na Câmara, onde foram 430 votos a favor da derrubada do veto e apenas 33 contra. Naquela Casa, eram necessários 257 votos para que o veto caísse.
Na saída da sessão na Câmara, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), falou que o veto foi derrubado seguindo um período de maturação e conciliação.
“De fato, o governo tinha vetado esse artigo dessa proposta, que foi inclusive inserida na tramitação da matéria na casa, e a partir daí se iniciou um debate sobre a importância dessa desoneração para esses setores fundamentais, que geram em torno de 6, 7 milhões de empregos no Brasil”, disse.
“Nós estamos na pandemia, o Brasil está perdendo muitas vidas, e a gente não pode perder empregos. O emprego é fundamental para o crescimento econômico, ainda mais em um momento como esse, conturbado, que estamos vivendo.”
Segundo ele, quando decidiu vetar o dispositivo que prorrogava a desoneração, a visão do governo era outra. “E agora na sessão do Congresso hoje, nós tivemos a orientação do governo para derrubada do veto do governo.”
Atualmente, a medida beneficia companhias de call center, o ramo da informática, com desenvolvimento de sistemas, processamento de dados e criação de jogos eletrônicos, além de empresas de comunicação, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiros e empresas de construção civil.
A derrubada do veto à desoneração da folha de pagamento foi acertada em uma reunião virtual entre os líderes do Congresso. O próprio governo admitiu na ocasião que não contava com votos suficientes para manter o veto e passou a recomendar a derrubada.
O encontro foi chamado e conduzido pelo líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
Gomes (MDB-TO) afirmou mais cedo, durante sessão da Câmara, que o próprio governo viu a necessidade de derrubar o veto.
Ele afirmou que, no bojo do acordo da desoneração, vem a manutenção de vetos importantes, entre eles um à ampliação do BPC (benefício assistencial para idosos e deficientes pobres).
“É uma medida necessária, mas não é uma medida fácil, porque o governo entende que, legalmente, está abrindo mão de receita sem apontar fonte segura. E todos sabem a situação fiscal do país”, alertou.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), foi o único líder a manifestar posição contrária à derrubada do veto, apesar de encaminhar a votação a favor do acordo firmado no dia anterior para a votação.
“Nós vamos encaminhar a favor do acordo, mas vamos ressalvar a posição da Liderança do Governo no Senado, que é contra a derrubada do veto. Contudo, apoiamos o acordo e solicitamos às bancadas que apoiam o Governo que honrem o acordo que foi costurado pelo nosso Líder, Senador Eduardo Gomes”, afirmou.
Bezerra afirmou que pode haver vício de inconstitucionalidade na manutenção da desoneração até o fim do próximo ano. Bezerra argumentou que há uma manifestação nesse sentido do ministro Bruno Dantas, do TCU (Tribunal de Contas da União).
A desoneração da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual que varia de 1% a 4,5% sobre o faturamento bruto, em vez de 20% sobre a remuneração dos funcionários para a Previdência Social (contribuição patronal).
A medida representa uma diminuição no custo de contratação de mão de obra.
O incentivo tributário, porém, está previsto para terminar em 31 de dezembro de 2020.
Empresários desses setores, que reúnem cerca de 6 milhões empregos diretos, dizem que não suportariam esse aumento de custo. Segundo eles, 1 milhão de pessoas poderiam perder os empregos com o fim da desoneração.
“Um aumento de 0,01% nos custos é impensável neste momento, quanto mais quando a perspectiva é de 7% de aumento para nosso setor”, afirma Vivien Mello Suruagy, presidente da Feninfra (Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática), entidade que representa 137 mil empresas.
Vivien Mello Suruagy afirma que, caso a desoneração não fosse mantida, o setor deixaria de investir R$ 3 bilhões nos próximos anos. A federação também estima que 300 mil pessoas pudessem perder seus empregos.
Por ampla maioria, o Congresso aprovou, em junho, um projeto que adia o fim da medida para dezembro de 2021. Bolsonaro, porém, vetou a decisão dos deputados e senadores.
O governo conseguiu adiar essa discussão desde o começo do segundo semestre.
A votação era dúvida por causa de um embate envolvendo a sucessão à Câmara dos Deputados.
Na Casa, há uma disputa de poder envolvendo o líder do centrão, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente da Casa, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). As votações na Câmara estão travadas há semanas.
O atraso na decisão sobre o veto, porém, começou antes da briga na Câmara.
Ainda em julho, o Ministério da Economia prometeu apresentar uma medida que atenderia um desejo do titular da pasta, Paulo Guedes: uma ampla desoneração da folha (não apenas para alguns setores) e, em troca, um novo imposto seria criado para bancar a redução nos encargos trabalhistas.
Líderes do governo no Congresso então atuaram para que a votação do veto aguardasse o movimento de Guedes. Mas, até hoje, a equipe econômica não apresentou uma solução.
Interlocutores de Bolsonaro então passaram a admitir a derrota.
Com a derrubada do veto, os congressistas terão de ajustar as contas do próximo ano.
O projeto de Orçamento de 2021 já prevê um gasto de R$ 3,7 bilhões com a desoneração da folha de pagamento desses setores. Isso acontece porque, mesmo com o fim previsto para dezembro de 2020, a medida gera efeito nos encargos a serem pagos nos quatro primeiros meses do próximo ano.
Assim, o custo adicional da prorrogação do incentivo fiscal seria de R$ 4,9 bilhões no Orçamento de 2021.
Sem o corte proporcional de despesas, o governo estouraria o teto de gastos. Com isso, haveria descumprimento da regra prevista na Constituição, que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior.
Interlocutores do Palácio do Planalto tentaram usar essa discussão para acelerar a votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) Emergencial, que autoriza o acionamento de medidas temporárias, como corte de salário e jornada de servidores, em momentos de crise nas contas públicas.
A ideia era incluir na PEC Emergencial um artigo que deixaria claro que a desoneração da folha poderia, sim, vigorar por mais um ano.
Auxiliares de Guedes defendiam que ampliar os benefícios tributários, com a derrubada do veto, seria uma medida inconstitucional.
O argumento é que, desde novembro do ano passado, quando entrou em vigor a reforma da Previdência, fica proibido conceder novos descontos que reduzem a arrecadação do fundo que banca as aposentadorias do setor privado.
O governo, então, abriria mão da disputa sobre a desoneração e, em troca, aceleraria a votação da PEC Emergencial, após as eleições municipais, de novembro.
Nesta quarta, dentro do mesmo veto, os deputados retomaram dispositivos sobre novas regras para participação nos lucros. Se a empresa decidir pagar a participação em parcela única, o acordo deve ser fechado até 90 dias antes.
Também derrubaram o veto que invalidava pagamentos de PLR que ocorressem em mais de duas vezes no mesmo ano ou em periodicidade inferior a um trimestre. Isso acontece para que o valor não configure salário.
Os deputados também rejeitaram outro veto de Bolsonaro a outro projeto. O dispositivo retomado suspendia por 120 dias a obrigatoriedade do cumprimento das metas e dos requisitos quantitativos e qualitativos pactuados pelos entes federativos com a União no âmbito do SUAS (Sistema Único de Assistência Social). A derrubada também foi confirmada pelos senadores.
Na sessão, mantiveram vetos de Bolsonaro a dispositivos que reduziam as alíquotas de contribuição ao sistema S e ao Pronampe (programa nacional de apoio às microempresas e empresas de pequeno porte).
Também acataram a decisão do presidente de barrar trecho que permitia que pacientes de grupos de risco à Covid-19 e pessoas com deficiência indicassem terceiros para a retirada de medicamentos.
Além disso, mantiveram vetos a mudanças nas regras para frequência em locais de atendimento à população de rua, assim como barraram dispositivos que suspendiam efeitos da não observância de indicadores financeiros ou de desempenho previstos contratos ou em dívidas.
Os vetos foram mantidos por 321 votos, enquanto 112 deputados votaram pela derrubada. Por terem sido mantidos pela Câmara, não tramitaram no Senado.
Por outro lado, como parte do acordo firmado, os senadores também mantiveram o veto presidencial em relação à legislação que ampliada o rol de beneficiados pelo auxílio emergencial. Um dos principais pontos foi o veto à determinação de categorias profissionais aptas a receber o benefício, como agricultores familiares e pescadores.
Nesse momento, houve uma leve fissura no acordo, pois alguns senadores reclamaram que a presidência da sessão optou pela votação global da questão, quando afirmam haverem negociado para a votação de destaques em separado.
Apesar de bancadas de cinco partidos terem então fechado voto contra o acordo, o veto acabou mantido por 45 votos a 17.
Os senadores, assim como haviam feito os deputados anteriormente, também votaram projetos que abrem créditos a diversos ministérios, e a proposta que retira R$ 6,1 bilhões de emendas parlamentares para bancar obras.
O texto gerou polêmica por prever a retirada de verba de emendas dessas bancadas -inclusive do Norte e Nordeste- para financiar projetos e dar mais poder aos ministros.
Para viabilizar isso, reduziu o orçamento de diversos ministérios, como Educação e Cidadania, inclusive em programas que haviam sido considerados prioritários pelos parlamentares.