O governo federal pagou Bolsa Família e auxílio emergencial a uma família dona de empresa que tem contrato milionário com a Prefeitura de Coremas, a 402 km de João Pessoa, na Paraíba.
O dono da empresa é Geraldo Virgolino da Silva. Ele é marido de Rita de Andrade Silva, que recebeu os benefícios do governo, e pai de Jhonatan Andrade da Silva, que também foi sócio da Obraplan.
Jhonatan deixou a empresa do pai em 2019 e criou a Jhonatan Andrade da Silva Eireli, que já fechou contrato, por exemplo, com a Prefeitura de Piancó, a 35 km de Coremas, para reformar o estádio municipal, por R$ 114 mil.
O Bolsa Família em Coremas foi alvo de auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU) à qual o Metrópoles teve acesso.
No total, o órgão identificou o pagamento indevido de R$ 287 mil, entre janeiro e outubro de 2019, a uma série de beneficiários na cidade.
Mais de 130 famílias estariam inelegíveis para fins de concessão dos benefícios do programa – em uma cidade que hoje paga o Bolsa Família a 2,7 mil pessoas.
Uma delas, inclusive, teria sido incluída fraudulentamente no Cadastro Único (CadÚnico) para receber o benefício.
Dois dos membros cadastrados são a gestora local do Bolsa Família e a diretora adjunta do Centro de Referência de Assistência Social (Cras).
Rita chamou a atenção dos investigadores, uma vez que é esposa do dono da Obraplan. Na auditoria, a CGU não publicou nomes das pessoas, mas o Metrópoles confirmou com informações da junta comercial, de documentos pessoais e com a própria família.
Dados do Portal da Transparência indicam que ela recebeu, desde 2013, cerca de R$ 19,3 mil de Bolsa Família – até R$ 259 mensais. Já em relação ao auxílio emergencial – que não foi analisado pela CGU –, foram pagas nove parcelas à mulher, em um total de R$ 4,2 mil.
Ambos os benefícios, no entanto, são destinados a famílias de baixa renda.
Para ter acesso ao Bolsa Família, é necessário ter uma renda per capita de até R$ 178. Já o auxílio emergencial não pode ser pago ao brasileiro que aufira renda familiar mensal per capita acima de meio salário mínimo (hoje, em R$ 550).
Por mês, a Obraplan apresentou faturamento médio de R$ 167,2 mil, segundo dados do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) levantados pela Controladoria.
A última atualização cadastral feita pela família foi em 2017. O CadÚnico informa que a renda bruta anual deles seria de R$ 250, o equivalente a R$ 3 mensais por pessoa. No primeiro semestre daquele ano, contudo, a Obraplan faturou R$ 906,9 mil.
Geraldo Virgolino da Silva esclareceu, ao Metrópoles, que a esposa solicitou o Bolsa Família antes de ele ter criado a empresa, em 2016.
O empresário também explicou que tira apenas 8% de lucro do contrato com a prefeitura. Ressaltou que a maior parte do dinheiro é usada para pagar funcionários, alugar caminhões e reabastecer o combustível.
Em 2018, a empresa tinha 29 funcionários, que recebiam um salário mínimo cada.
“Se a CGU disse que a minha empresa ganhou R$ 5 milhões, isso não quer dizer que R$ 5 milhões são meus”, disse, ao afirmar que recebe, mensalmente, cerca de R$ 8 mil a R$ 10 mil.
Alegou ainda que Rita precisa do dinheiro para pagar contas e comprar as “roupinhas” dela. A mulher é dona de casa.
Por sua vez, a Prefeitura de Coremas confirmou o trabalho da Controladoria-Geral da União e disse que as irregularidades encontradas são referentes à gestão anterior.
“Existiam alguns casos esporádicos que a gente não tinha conhecimento. Mas, hoje, não tem mais nenhum problema desse tipo. A CGU veio aqui e na mesma hora o problema foi resolvido”, pontuou o chefe de gabinete da prefeitura da cidade, Edilson Pereira.
Edilson é ex-prefeito de Coremas e viúvo de Francisca Chagas, conhecida como Chaguinha de Edilson, que foi prefeita entre 2016 e março de 2021 – ela morreu de Covid-19 no último dia 23.
Procurado, o Ministério da Cidadania não se manifestou.