O primeiro caso registrado em Santa Catarina de um bebê que nasceu com anticorpos contra a Covid-19 gerou diferentes questionamentos.
A opinião sobre a imunidade do recém-nascido Enrico não é unânime entre os especialistas, mas todos afirmam que o coronavírus não tem como foco as crianças, e a existência ou não de anticorpos em bebês não modifica o cenário da pandemia no Brasil.
Como o bebê adquiriu os anticorpos?
Enrico não contraiu a doença, nem tomou a vacina, mas recebeu a defesa da mãe.
A presença de anticorpos no bebê não é questionada, já que foi atestada pelo exame neutralizante feito em laboratório catarinense, mas a imunidade é.
— Não sabemos o quanto isso garante imunidade ao bebê, pois até o momento presente, não temos dados sobre o que chamamos de “correlato de proteção”.
Não sabemos qual é a porcentagem de anticorpos neutralizantes no sangue considerada suficiente para garantir que o indivíduo esteja imune — explica Bárbara Simionato, médica do Controle de Infecção de Infectologia Pediátrica da Santa Casa de Misericórdia, de Porto Alegre.
Do outro lado, o pediatra Juarez Furtado, de Itajaí, acredita que o bebê está imunizado. A dúvida que fica é: por quanto tempo?
— A gente pode dizer que se ele tem o anticorpo, agora, teoricamente, ele está imunizado para a Covid, mas a gente não sabe quanto tempo dura esse anticorpo.
Por quanto tempo o anticorpo permanece no bebê?
Os especialistas explicam que durante o terceiro trimestre de gestação, a mãe transmite para o bebê pela placenta diferentes anticorpos do tipo IgG.
A pediatra Bárbara Simionato diz que a quantidade de anticorpo passado pela mãe vai diminuindo aos poucos.
— [A passagem dos anticorpos de mãe para filho] Auxilia na imunidade do bebê nos primeiros meses de vida. Essa imunidade vai reduzindo progressivamente ao longo dos meses e dando espaço aos novos anticorpos produzidos pelo bebê — explica.
Se os anticorpos contra a Covid seguirem o mesmo padrão dos demais, em alguns meses o bebê vai “perder a imunidade” e só conseguirá produzir novos anticorpos caso seja vacinado ou contaminado.
O médico Juarez Furtado lembra da importância de fazer o monitoramento do bebê para atestar quanto tempo os anticorpos podem permanecer no organismo:
— Veio o anticorpo, mas a gente não sabe quanto tempo dura esse anticorpo. Então tem que monitorar para ver se perdura. Nós temos várias doenças que precisa tomar todo ano uma vacina para que fique melhor imune às variantes, por exemplo.
Há ainda a possibilidade de o leite materno prolongar a presença de anticorpos no bebê.
Normalmente, muitas defesas são passadas de mãe para filho durante a amamentação.
Ainda não há a confirmação se o mesmo ocorre com os anticorpos específicos contra a Covid-19.
Ter anticorpos significa ter imunidade?
Esse tópico vale tanto para criança e bebê, quanto para adulto. A pediatra Bárbara relembra que é preciso saber o correlato de proteção para dimensionar a quantidade de anticorpos necessária para garantir a proteção do indivíduo. Ainda não há esse dado quando se trata da Covid-19.
— Certamente, encontrar anticorpos no bebê é uma notícia promissora, mas até o momento não sabemos o que isso significa na prática. A imunidade trazida pela vacinação não é exclusivamente medida pelos anticorpos. Existe também a imunidade celular que não pode ser medida através de exames comuns e desempenha um papel importante na nossa memória imunológica. Assim, mesmo que a mãe não tivesse IgG, não significaria que ela não está imunizada — explicou a médica do Controle de Infecção de Infectologia Pediátrica da Santa Casa de Misericórdia.
De forma prática, o coronavírus ainda é muito desconhecido, por isso, é difícil fazer afirmações sobre a doença.
Como explicou a médica, pessoas com anticorpos podem não estar imunizadas, visto que ainda não se sabe a quantidade necessária para fazer a proteção.
Da mesma forma, pessoas que não apresentem anticorpos podem estar imunizadas, já que existe também a imunidade celular.
Notícia promissora, mas não muda muita coisa
Os especialistas lembram que a Covid-19 se manifesta com casos leves em bebês e crianças, já que esses não são o foco do coronavírus, ao contrário da H1N1.
Com isso, a pedriatra Bárbara faz um alerta:
— O significado clínico para o bebê é menos relevante do que para suas mães. As gestantes, sim, é muito importante que sejam vacinadas, pois ter Covid na gestação aumenta o risco de mortalidade da gestante em 20 vezes em relação à gestante sem Covid.