Veja sinais que indicam que seu filho sofre de algum transtorno mental

Mais de um ano e meio após o início da pandemia, e a abordagem sobre as preocupações, danos e cuidados com a saúde mental nunca esteve tão em alta. Alguns sintomas e quadros, como ansiedade e depressão, ficaram mais evidentes nessa fase complexa que estamos vivendo, mas é importante dizer que os transtornos mentais não acontecem “do nada”, pelo contrário, eles tendem a surgir de forma gradual, desde cedo, o que nos leva a direcionar um olhar mais atento para a infância e adolescência.

Mudanças de humor e de comportamento, alterações de apetite, no padrão de sono, irritabilidade, redução do rendimento escolar, desinteresse em atividades habituais, de lazer, e isolamento —muitos adolescentes passam a ficar longas horas em seu quarto — são sinais que podem indicar algum problema de saúde mental, afirma Gabriela Crenzel, psiquiatra de crianças e adolescentes, mestre em saúde da criança, presidente do Departamento de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro e uma das autoras do livro “Saúde Mental da Criança e do Adolescente”.

“Crianças e adolescentes que vêm desenvolvendo um transtorno mental apresentam emoções, pensamentos e comportamentos que geram algum tipo de sofrimento contínuo, como a dificuldade de interação social, seja por falta de motivação, seja por não conseguir gerenciar as habilidades que são necessárias para que isso aconteça”, alerta Gustavo Estanislau, médico psiquiatra, especialista em psiquiatria da infância e da adolescência pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre, pesquisador do Instituto Ame Sua Mente e organizador do livro “Saúde Mental na Escola: O Que os Educadores Devem Saber”.

Percebeu alguma alteração? Veja o que fazer

Ao prestar atenção a esses sinais, pais e cuidadores —o que inclui professores e familiares como avós e tios — podem detectar problemas em uma fase em que eles são mais leves e menos frequentes na vida da criança e do adolescente, permitindo cuidados que serão de mais baixa complexidade e com melhores resultados.

Em muitos casos, pais demoram para buscar ajuda por acreditarem que tais problemas irão desaparecer, mesmo que já venham durando há longos períodos de tempo. Por outro lado, ainda vivemos em uma sociedade que não compreende plenamente que transtornos mentais estão relacionados ao funcionamento cerebral, e não dependem apenas da força de vontade da pessoa para melhorar”.Gustavo Estanislau, médico psiquiatra, especialista em psiquiatria da infância e da adolescência pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre.

Uma intervenção baseada na detecção precoce proporciona um melhor uso da rede de apoio de especialistas voltados à saúde mental. Quando temos esse olhar preventivo, o papel de terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogas, psicopedagogas, entre outros, tende a ser mais valorizado, segundo Estanislau.

Além de buscar ajuda profissional, os pais devem prontamente se aproximar e conversar com os filhos. “O diálogo, ouvir, olhar nos olhos, conhecer os amigos, vivenciar a família são protetores e ajudam a diminuir a incidência dos transtornos. Os adolescentes estão numa fase de transformação de aspectos biológicos, psicológicos e sociais. É uma fase de identificação com o eu, saber quem é, o que deseja ser e o que os outros esperam dele. É fundamental o apoio e vigilância dos responsáveis”, afirma a pediatra, hebiatra e presidente do Departamento de Adolescência da Sociedade Baiana de Pediatria, Sandra Plessim.

Transtornos mais frequentes

Entre os transtornos mentais mais frequentes que podem se manifestar na infância estão os de ansiedade, sendo que os mais comuns são transtornos de ansiedade de separação e as fobias, dificuldades de aprendizagem, TDAH (transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), TOD (transtorno opositivo desafiador), transtornos de linguagem.

Entre os adolescentes, os mais comuns são: TDAH, transtorno de conduta —quando o jovem apresenta um comportamento desafiador ou transgressor, sem sinais de empatia ou arrependimento —, transtornos de ansiedade, transtorno do pânico, transtornos de humor, como depressão, transtorno de alimentação, como quadros de anorexia e bulimia.

Sem ajuda o problema piora

Segundo Crenzel, antes de atribuir diagnósticos relacionados a problemas de saúde mental a uma criança ou adolescente, é necessário identificar o contexto em que surgem e se não são temporários ou circunstanciais.

pais; adolescente; briga - iStock - iStock

Os pais e cuidadores precisam separar os problemas circunstanciais dos estruturais. Existem sinais mais silenciosos, como uma criança que fica vidrada na tela do celular ou computador e que tem pouca comunicação com o mundo exterior. Se for algo circunstancial, ao propor uma mudança de rotina com a inclusão de outras atividades, a criança imediatamente apresentará uma melhora significativa. “Quando se trata de algo estrutural, a proposta de mudança será recusada e aí estaremos diante de uma situação mais preocupante”, afirma Claudia Mascarenhas, psicanalista e diretora clínica do Instituto Viva Infância, localizada em Salvador (BA).

Caso não recebam o suporte e tratamento adequado, crianças e adolescentes podem apresentar agravamento dos sintomas, cronificação de problemas que poderiam ser enfrentados, aumento da sensação de desesperança, fazer o uso de álcool e de outras substâncias, de acordo com Crenzel. “Sem a devida supervisão, eles têm maior risco de buscar apoio em redes sociais e acabam sendo influenciados de forma perniciosa. Nos últimos anos vêm surgindo na internet grupos que promovem o suicídio, automutilação, anorexia, que “ensinam” técnicas de purgação, formas de se machucar e estratégias para driblar a vigilância da família”, diz.

Na trajetória de um transtorno mental é comum que crianças e adolescentes não apresentem recursos para conseguir compreender o que está se passando, gerenciar o sofrimento ou buscar ajuda. Quando não recebem auxílio, eles podem ter condutas mais impulsivas. Essas situações podem gerar uma desconexão da família”, pondera o médico Estanislau.

Um ponto importante desse processo é evitar a atribuição de culpas entre pais e filhos a respeito das causas ou razões do quadro do paciente. “É imprescindível não fazer julgamentos e valorizar o que a criança ou adolescente diz estar sentindo. Ninguém tem como avaliar se o sofrimento é desproporcionalmente intenso ou não. Receber apoio e estímulo favorece o desenvolvimento da autonomia, segurança, criatividade, capacidade de adaptação e autoestima”, diz Crenzel, mestre em saúde da criança.

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