Será sepultado na tarde desta quinta-feira (25), no Cemitério São João Batista, em Rio Branco, o membro da Guarda Territorial aposentado Jonas Pereira de Souza, falecido na noite de ontem, aos 93 anos de idade, no Hospital Santa Juliana, depois de três meses lutando contra as crises decorrentes de um AVC (Acidente Vascular Cerebral). Acreano de Rio Branco, Jonas Pereira foi casado com a professora e escritora Robélia Fernandes, membro da Academia Acreana de Letras, de 83 anos de idade, e era pai do ex-reitor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Jonas Pereira de Souza Filho, do ex-atleta Joneudes, do músico James e das professoras Márcia e Núcia.
Jonas Pereira de Souza encerra em si mesmo uma história de muito trabalho, de amor à família e de completa dedicação ao Acre e às suas causas mais nobres. Nascido às margens do rio Acre, fez o caminho próprio de um acreano em busca da sobrevivência numa região em que a época a proteína para alimentar uma sociedade em formação, baseada na exploração das florestas e de seus recursos naturais como a seringa e a castanha, ainda era obtido a partir da caça de animais silvestres e do pescado de igarapés, rios e lagos da região.
Não por acaso, por isso mesmo, Jonas Pereira se tornou um exímio caçado e pescador, um autêntico homem da floresta. Por isso, nos rios, nas atividades de pescador, tornou-se também um exímio mergulhador, desses que, desafiando a turbidez das águas e os riscos de encontro com feras aquáticas, desciam às profundezas para desenganchar tarrafas presas em balseiros submersos. Consta que, nesta atividade, chegou ganhar fama por passar mais tempo debaixo d’agua que qualquer outro homem comum. Tamanha habilidade debaixo d’agua mereceu inclusive uma crônica de Jonas Filho, seu primogênito e admirador confesso.
Na crônica intitulada “O Mergulhador”, publicada em redes sociais enquanto seu pai lutava para viver numa UTI do Santa Juliana, Jonas Filho escreveu: “Antes de se tornar soldado da Guarda Territorial do Acre, Jonas tinha por habilidades as práticas tradicionais da caça e da pesca, comuns aos seringueiros da região. Filho de migrante pernambucano e de acreana do “pé rachado”, Jonas sempre foi um misto de perseverança e revolucionarismo. Na prática da pescaria, tornou-se notório e reconhecido como excelente mergulhador. E era mesmo, contam os seus contemporâneos.
Jonas encarava qualquer cor de água e profundidade de rio ou lago. Em poço fundo tarrafa não ficava presa em tronqueiras submersas. Ele mergulhava com seus pulmões privilegiados, cheios de ar, e resolvia. Nadava entre os troncos para espantar os peixes e o que tivesse por lá. Cobra, jacaré, raia, poraquê, nada amedrontava, era destemido. Fé em Deus, pulmões joviais e falta de juízo era o seu lema, pessoalmente me contou. E isso, ele sempre admitiu sem nenhuma exaltação, embora admitisse também que, por vezes, se metera em dificuldades que quase lhe sobrou a morte como recompensa. O que fazia era realmente “coisa de maluco”, dizia quando contava sobre suas façanhas de pescarias”.
Mas, segundo a crônica, um dia Jonas e sua família fez o êxodo da floresta rumo a cidade, onde passou a residir. Prossegue o filho em sua bela crônica: “Depois que veio morar na cidade de Rio Branco, arranjou emprego de vigia e fez da caça e da pesca apenas um hobby sustentável, mesmo que ainda com muita “maluquice”. Progrediu no emprego e foi finalmente nomeado Guarda Territorial. Foi promovido à patente de cabo, condição em que se aposentou, tempos depois. Certo dia, como guarda, recebeu em sua casa a visita de um superior que o convocou para uma incondicional missão, por mandado do Cel. Manoel Fontinelle de Castro.
Isso, porque havia sabido o coronel que Jonas era o tal tipo de pessoa que poderia ajudar a resolver um problema instalado e que precisava ser urgentemente resolvido. O problema: Na travessia de um trecho do rio Purus, um trator que ia sendo levado para abertura de ramais, havia tombado da balsa, na água, e precisava ser resgatado. A missão era a de localizar o trator e amarrá-lo a um cabo de aço, em uma alça específica na máquina, para resgate. E na profundidade do rio Purus cheio e turbulento, sem nenhum equipamento de mergulho ou especializado, Jonas mergulhou, por várias vezes, cumprindo a missão com êxito, após horas. Sobre esse episódio, contou aos filhos, teria ele feito “uma média”, “uma onda”, para impressionar o coronel, ficando vários e desnecessários minutos, submerso, depois de já ter amarrado o cabo de aço. E impressionou mesmo. O próprio coronel a ele se manifestou impressionado por sua destreza”.
Mas, no início da noite de quarta-feira, Jonas Pereira deu seu último mergulho em vida. “Eu que fico, me agarro, me apego, honrando sua bondade, dignidade e lisura. A candura dele restará sempre na minha lembrança, até que eu possa também dar meu último mergulho para o nosso reencontro”, disse o professor Jonas Filho em nome da família.