O ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal) pediu vista (mais tempo para análise) em sessão na 6ª feira (16.jun.2023) do plenário virtual para julgar o piso nacional de enfermagem.
O julgamento havia sido liberado na última 6ª feira (9.jun) para debater a decisão liminar do ministro Roberto Barroso, relator do processo, que restabeleceu o piso com condicionantes. O processo estava parado desde 24 de maio a pedido do ministro Gilmar Mendes.
Antes da interrupção, Barroso havia votado favoravelmente ao pagamento da remuneração à categoria parcialmente, com especificações para custear os gastos com o piso no setor público. Já o ministro Edson Fachin divergiu, votando para que a medida fosse integral e valesse também para outras categorias.
Na sessão na madrugada desta 6ª (16.jun), Barroso e Gilmar haviam proferido um voto complementar conjunto, algo inédito na Corte. Os magistrados decidiram por barrar outros pisos de categorias e determinaram uma negociação coletiva prévia no setor privado antes da implementação do piso da enfermagem com o objetivo de evitar demissões em massa.
Com o pedido de vista feito poucos minutos após a retomada do julgamento, Toffoli tem até 90 dias para devolver o processo.
Em sua decisão, Barroso reconheceu que os recursos não são suficientes para garantir 100% do custeio da regra. Por essa razão, determinou a implementação da seguinte forma:
-Funcionários públicos federais – o piso deve ser aplicado de maneira integral com reajustes dos salários de acordo com o estabelecido pela lei 14.434/2022;
-Funcionários públicos de Estados, Distrito Federal e Brasília e de autarquias dessas instâncias e de entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS – nesse caso, o piso salarial só será aplicado até quando os recursos fornecidos pela União, de R$ 7,3 bilhões, atendam aos pagamentos.
-Funcionários da iniciativa privada contratados por meio da CLT – o piso salarial da enfermagem deve ser aplicado como definido pela lei 14.434/2022, exceto se houver convenção coletiva que estabeleça outros valores levando em conta “a preocupação com demissões em massa ou comprometimento dos serviços de saúde”.
Além do voto do ministro Roberto Barroso (eis a íntegra – 116 KB), apenas o ministro Edson Fachin votou. O magistrado divergiu da decisão do relator e mandou pagar integralmente o novo piso nacional da enfermagem.
O voto de Fachin (leia a íntegra – 111 KB) fala em “justiça social” e “dignidade da pessoa humana”, mas não informa como as entidades públicas e privadas terão recursos para pagar os novos salários.
Fachin divergiu dos pontos 2 e 3 de Barroso. O ministro defendeu em seu voto a integral aplicação do novo piso nacional da enfermagem, mas sem dizer de onde devem sair os recursos.
Com a manutenção da decisão enquanto o caso não termina de ser julgado, o setor privado terá de arcar sem auxílio com o aumento total das despesas com salários e encargos. O resultado deve ser o fechamento de unidades e demissão de profissionais com fechamento de postos de trabalho. Cálculos preliminares falam em demissão de até 165 mil profissionais.
Cidades das regiões Norte e Nordeste –que tradicionalmente já contam com estruturas mais precárias e dificuldades financeiras– serão desproporcionalmente impactadas pela regra. Isso se deve principalmente ao fato de a diferença entre a média salarial atual e os valores do novo piso nacional serem maiores do que nas regiões mais ricas do país.
O piso salarial é um tema discutido por diversas categorias no Brasil. O Congresso tem hoje 148 propostas para criação de piso nacional de salários para pelo menos 59 categorias profissionais de trabalhadores. Os dados são de levantamento do Poder360 realizado até 30 de maio de 2023. Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. Essas propostas ganharão tração caso seja implantado o piso nacional da enfermagem.
HISTÓRICO DO PISO NACIONAL DA ENFERMAGEM
Eis o histórico da tramitação do piso salarial da enfermagem nos Três Poderes:
-Aprovação no Congresso Nacional – em 14 de julho de 2022, o Congresso promulgou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que torna o piso salarial para enfermeiros constitucional (Emenda Constitucional 124, de 2022). O texto determina piso salarial de R$ 4.750 para enfermeiros, R$ 3.325 para técnicos em enfermagem e R$ 2.375 para os auxiliares de enfermagem e parteiras;
-Tema chega ao STF – ainda em agosto, a CNSaúde protocolou uma ADI na Suprema Corte questionando dispositivos da lei e alegando que haveriam prejuízos ao setor privado. O caso foi distribuído, por sorteio, ao ministro Roberto Barroso;
-Suspensão do piso – em 4 de setembro de 2022, Barroso determinou a suspensão do piso salarial e pediu que o governo federal, Estados, Distrito Federal e entidades do setor prestassem informações acerca do impacto financeiro da lei. A decisão foi referendada pela Corte por 7 votos em 16 de setembro;
-Nova emenda constitucional – em 23 de dezembro de 2022, o Congresso Nacional publicou uma nova emenda à Constituição que estipula que a União ajudará os Estados e Municípios a pagarem o novo piso;
-PLN do piso da enfermagem – em 26 de abril deste ano, o Congresso aprovou o Projeto de Lei do Congresso Nacional enviado pelo Planalto sobre o tema. O projeto liberou R$ 7,3 bi dos cofres públicos para o Ministério da Saúde e permite que Estados, municípios e entidades privadas com ou sem fins lucrativos que atendam pelo menos 60% de seus pacientes pelo SUS recebam recursos para bancar o aumento nas despesas com salários;
-Verba é sancionada – o presidente Lula sancionou, em 12 de maio, a medida aprovada pelo Legislativo, de iniciativa do Palácio do Planalto;
-Piso é restabelecido – em 15 de maio, Barroso restabeleceu o piso salarial por meio de uma decisão liminar (provisória).
-Prazo no setor privado – Barroso deu 45 dias para empresas privadas negociarem eventuais valores menores do que o piso nacional da enfermagem. Esse prazo vai até a 1ª semana de julho. Depois disso, se não houver acordo, o piso salarial terá de ser pago, tendo como consequência possíveis demissões no setor.