Para conscientizar sobre ações de vigilância, prevenção e controle das hepatites virais, o Julho Amarelo – representado por uma fita amarela – visa a importância das hepatites virais são infecções que atingem o fígado, causando alterações leves, moderadas ou graves.
Segundo o Ministério da Saúde, na maioria das vezes, são infecções silenciosas, ou seja, não apresentam sintomas. Elas são causadas por vírus e algumas hepatites se dão pelo uso de medicamentos, álcool e outras drogas, assim como por doenças autoimunes, metabólicas ou genéticas.
O ContilNet conversa com o médico infectologista Thor Dantas, chefe do serviço de infectologia e de hepatologia na Fundhacre. Ele também exerce atividades de coordenação clínica no Centro de Infectologia Charles Mérieux – laboratório pioneiro no diagnóstico de infecções virais não apenas no Acre, mas em todo o país.
Inaugurado em 2016, o Charles Mérieux é uma referência para o diagnóstico de doenças infecciosas a nível molecular, utilizando técnicas de biologia molecular que detectam o material genético de vírus, bactérias e fungos. Ele é essencial tanto para diagnósticos individuais quanto para a vigilância epidemiológica.
Laboratório pioneiro
“Por exemplo,a gente teve esse ano um vírus novo, que foi o Oropouche, que todo mundo comentou sobre. Se tem dengue tipo 2 ou tipo 3, tem informação também do ponto de vista da vigilância epidemiológica. Então,ele é a referência para diagnóstico de casos individuais, mas também é referência para vigilância das doenças”, descreve o médico.
Além disso, o laboratório tem um papel crucial no treinamento e capacitação de profissionais em técnicas de biologia molecular, e na pesquisa científica, especialmente na área de doenças infecciosas.
Durante a pandemia de COVID-19, foi o primeiro laboratório da Região Norte a fazer diagnósticos antes mesmo do Ministério da Saúde disponibilizar kits para o Brasil.
“Ficamos a pandemia inteira trabalhando de domingo a domingo, de manhã, de tarde e de noite. O laboratório continua servindo como referência, mas há algum tempo a gente vem com um trabalho realmente muito consistente na área das hepatites virais. Temos um grave problema de hepatites virais no nosso estado”, destaca.
Referência no Acre
O Acre é um dos estados com maior prevalência de hepatites virais crônicas (B, C e Delta), segundo o entrevistado, que podem levar à cirrose e ao câncer de fígado. O laboratório tem um papel fundamental, especialmente com a hepatite Delta, para a qual eles desenvolveram um exame de carga viral em parceria com a Fiocruz, uma vez que o SUS não oferece esse exame.
“A gente desenvolveu aqui o nosso próprio exame de carga viral em parceria com a Fiocruz”, revela Thor Dantas.
O teste específico para o vírus da hepatite Delta é validado cientificamente e publicado em uma revista de grande impacto. Hoje, o Acre e Rondônia são os únicos estados brasileiros que dispõem desse exame:
“E hoje nós já estamos juntos pleiteando esse papel de ser a referência para o Brasil todo. Quando alguém tiver um caso de hepatite Delta fora do Brasil, vai enviar pra gente”, reflete o doutor.
Prevenção
A prevenção está diretamente relacionada aos mecanismos de transmissão. Para hepatite B, é essencial o diagnóstico precoce das mães no pré-natal, vacinação e conscientização. Todos deveriam fazer o teste de hepatite B pelo menos uma vez na vida e se vacinar.
Para hepatite C, a prevenção envolve o cuidado com instrumentos perfurocortantes, evitando a reutilização de seringas e garantindo a esterilização adequada em salões de beleza, dentistas e hospitais. A conscientização é crucial para reduzir a transmissão.
A hepatite Delta, por sua vez, é prevenida ao se evitar a hepatite B, pois ela só ocorre em quem já tem hepatite B. Portanto, vacinar contra a hepatite B também previne a hepatite Delta. Diagnosticar e tratar precocemente quem já tem hepatite B é fundamental para evitar complicações.
“O laboratório tem um papel no diagnóstico de todas as doenças infecciosas, ou de quaisquer doenças infecciosas. O papel do laboratório vai muito além da COVID e das hepatites que a gente já comentou. Hoje, o laboratório também serve como base de referência para o diagnóstico e tratamento dos vírus que acometem os pacientes transplantados, como o citomegalovírus”, diz Dantas.
Charles Mérieux
Além de hepatites e COVID-19, o laboratório é referência para diversas outras doenças infecciosas. Como o controle da resistência da tuberculose, pesquisa de leishmaniose, vigilância de arbovírus como o Oropouche, e exames para vírus que acometem pacientes transplantados.
O laboratório não só diagnostica e trata, mas também realiza vigilância epidemiológica e pesquisas que contribuem para o desenvolvimento de novos métodos de prevenção e tratamento. Thor Dantas afirma que:
“Pesquisando novas estratégias, temos dados inéditos que vão mostrar para o mundo todo e para o Ministério da Saúde que podemos fazer a prevenção dessa infecção de uma forma muito mais eficiente, barata e simples do que se pensava anteriormente. Esses dados estão sendo produzidos no Acre, por meio de uma pesquisa sobre hepatite Delta, em conjunto com nosso programa de transplante”.
Para o entrevistado, é fundamental continuar investindo em tecnologia, laboratórios e pesquisa para enfrentarmos as doenças infecciosas. Pois, como por exemplo, a recente pandemia de COVID-19 mostrou a importância de estarmos preparados para novas ameaças.
Na região Amazônica, onde há contato constante com a floresta e a vida selvagem, o risco de surgimento de novos patógenos é significativo:
“Existe uma probabilidade importante de que novos patógenos surjam aqui na nossa região Amazônica, assim como surgem na Ásia e na África. Portanto, manter um laboratório capaz de fazer o diagnóstico de novos vírus e patógenos emergentes é fundamental para a nossa saúde coletiva nos próximos anos e décadas. É muito importante que o Acre esteja preparado para isso”, finaliza.