Funcionário pode dar ‘justa causa’ no patrão? Entenda a rescisão indireta

Com a medida, o colaborador pede demissão do emprego, mas garante todos os direitos trabalhistas que conseguiria caso tivesse sido desligado pela empresa

Demissão por justa causa é uma das formas mais drásticas de uma empresa desligar um funcionário. Ela só pode ser aplicada em algumas circunstâncias previstas em lei, como abandono de emprego, agressão física e embriaguez em serviço, por exemplo.

Ao ser demitido nessas condições, o trabalhador perde direitos garantidos em outras modalidades de demissão, como seguro-desemprego e a possibilidade de sacar o FGTS.

Na rescisão indireta, o funcionário considera o seu contrato de trabalho extinto — Foto: drobotdean/Freepik

Mas, você sabia que um funcionário com carteira assinada também pode “dar justa causa” no patrão?

É a chamada rescisão indireta, uma prática assegurada pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) na qual o colaborador considera o seu contrato de emprego extinto porque o chefe cometeu uma falta grave, como atrasar repetidamente o pagamento do salário (veja mais exemplos abaixo).

Na prática, com a rescisão indireta, o funcionário se demite do emprego, mas garante todos os direitos trabalhistas que conseguiria caso tivesse sido desligado pela empresa (sem justa causa, é claro).

Para pedir esse modelo de rescisão, geralmente, é necessário entrar com uma ação na Justiça.

1- Em quais casos posso pedir uma rescisão indireta?

O funcionário pode recorrer à rescisão indireta se o chefe deixar de cumprir as obrigações do contrato de trabalho, cobrar dele a prática de um ato ilegal, agredi-lo fisicamente, entre outras situações previstas no artigo 483 da CLT.

Todas essas condutas deverão ser comprovadas à Justiça do Trabalho, que tem reconhecido o direito do empregado à rescisão indireta em várias situações. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), as mais comuns são:

  • atraso reiterado no pagamento de salários e não recolhimento do FGTS;
  • não fornecimento do equipamento de proteção individual (EPI) necessário para o desempenho das atividades;
  • não pagamento do adicional de insalubridade ou de periculosidade, no caso de trabalho que oferece risco à saúde;
  • não pagamento de horas extras;
  • assédio moral;
  • agressão física ou submissão do trabalhador a um perigo considerável;
  • redução de horas de trabalho ou de salário sem acordo.

2- Qual é a vantagem dessa medida para o trabalhador?

Com a rescisão direta, o funcionário “garante o recebimento de todas as verbas trabalhistas, como se tivesse sido demitido”, explica a advogada Hanna Garros, especialista em direito do trabalho, do escritório Ferraz dos Passos Advocacia.

Veja a diferença:

  • Ao pedir demissão, o funcionário recebe: o salário referente aos dias trabalhados naquele mês, 13º e férias (com adicional de ⅓ do salário), ambos proporcionais aos meses trabalhados no ano. Além disso, deve cumprir aviso prévio.
  • Ao ser demitido sem justa causa (ou pedir a rescisão indireta), além das verbas rescisórias citadas acima, o trabalhador tem direito ao seguro-desemprego e a sacar o FGTS, mais uma multa de 40% sobre os depósitos do fundo. E, nesse caso, o aviso prévio deve ser pago pela empresa ao funcionário, ainda que não tenha sido trabalhado.

3- Como fazer o pedido de rescisão indireta?

O funcionário deve comunicar, formalmente, ao empregador que está considerando o seu contrato de trabalho extinto, orienta o advogado trabalhista Roberto Fiorencio, sócio do escritório A. C Burlamaqui Consultores.

No entanto, normalmente, o empregador não reconhece a rescisão indireta, e o trabalhador precisa entrar com uma ação na Justiça, observa o especialista.

Esse processo deve ser aberto na vara mais próxima de onde a pessoa trabalha, e que seja competente para julgar esse tipo de ação, acrescenta a advogada Hanna Garros.

Enquanto a ação corre na Justiça, o empregado pode escolher se quer seguir trabalhando ou não, afirma Fiorencio.

“Normalmente, ele opta por não seguir prestando o serviço, mas o contrato somente será tido como encerrado e as verbas rescisórias serão recebidas após o trânsito em julgado da sentença“, ou seja, quando a Justiça emite uma decisão definitiva, da qual não se pode mais recorrer.

Mas Garros ressalta que, se o trabalhador optar por deixar o emprego neste período, é importante buscar orientação de um advogado especializado sobre como notificar a empresa, para que a conduta não configure abandono de emprego.

4- O que acontece se o trabalhador perder o processo?

Se a Justiça não entender pela rescisão indireta e o funcionário tiver deixado o emprego durante o andamento do processo, o contrato de trabalho será extinto, mas ele receberá apenas as verbas que correspondem a um pedido de demissão, explica Hanna Garros.

Já se o empregado tiver permanecido trabalhando, o contrato dele vai se manter normalmente, diz a especialista.

Além disso, nos dois casos, com exceção de quem é beneficiário da justiça gratuita, o trabalhador terá que pagar os advogados da empresa que venceu o processo pelo serviço prestado na ação, ressalta o Tribunal Superior do Trabalho.

Por isso, para pedir a rescisão indireta, “é importante que as faltas imputadas ao empregador sejam efetivamente graves e que exista prova do ocorrido”, finaliza Fiorencio.

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