O deputado Edvaldo Maglhães, líder do PC do B (Partido Comunista do Brasil) e das oposições na Assembleia Legislativa, abriu sua bateria de críticas ao atual governo. Embora reconheça o esforço pessoal do governador Gladson Cameli em melhorar as finanças públicas, o parlamentar diz que o governo peca em não ter uma equipe coesa e por ter, segundo ele, atrapalhado o debate democrático na Assembleia Legislativa durante todo o ano de 2019. .
Portanto, em 2020, que o Governo não espere moleza das oposições, disse. Na entrevista a seguir, o deputado diz ainda que seu partido não muda de cor nem de nome, que espera por uma definição da prefeita Socorro Neri quanto às eleições municipais e é duro com o governador. A seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva com o deputado:

Deputado Edvaldo Magalhães avalia governo de Cameli/Foto: Reprodução
Com as luzes de 2019 se apagando, pergunto se no ano que se finda houve, para a população acreana, algum ganho proporcionado pelos políticos que a representa?
Edvaldo Magalhães – Do ponto de vista do legislativo, nós tivemos um ano intenso – do ponto de vista do debate político a cerca de cada momento. Houve participação decisiva e incisiva em todos os momentos por parte de todos aqueles que têm algum apreço pelo debate, e com o debate em curso. E houve muita produção legislativa também. Mas eu destaco que, no primeiro semestre, o poder legislativo foi mais protagonista do ponto de vista dos interesses da comunidade. Recebeu e acolheu os diversos segmentos que ali buscaram apoio e foram falar de suas dificuldades e aflições e também encaminhar e dar desdobramentos às questões colocadas, como os servidores públicos e outra boa parte da comunidade, o que fez do primeiro semestre muito intenso do ponto de vista da mobilização da sociedade e de sua participação no parlamento. No segundo semestre, nós tivemos os embates e as divergências acerca do olhar político sobre matérias polêmicas que foram desde a lei do exercício orçamentário, que foi objeto de grandes embates e também o debate em torno da reforma da Previdência. Neste aspecto, podemos dizer que a proposta inicial apresentada pelo governo era muito perversa. Ela terminou ainda com muitas maldades, ainda que aprovadas pelo parlamento. Mas dali foram tiradas muitas questões fruto das nossas intervenções e da mobilização dos servidores e de um embate intenso na Assembleia. As pessoas iam perder a sexta parte, a licença prêmio; queriam taxar os velhinhos aposentados; tungar 14% daqueles a que ganham acima do salário mínimo, o que seria inaceitável. Portanto, houve debates e embates e ganhos.
Na sua avaliação, qual foi, em 2019, o principal acerto do Governo do Estado – se é que houve?
O Governo ainda está tateando. É um Governo ainda em formação. Nós estamos terminando o ano e ainda e não existe no Governo uma equipe consolidada. No apagar das luzes de 2019, há escuridão no setor nelvrágico do Governo. Esse aspecto pesa no sucesso, pesa na gestão e na produtividade. Penso que houve medidas importantes. O fato de se fazer um ajuste fiscal para enfrentar a crise de liqueidez, para enfrentar os problemas fiscais, foi feito um esforço grande. Sempre costumo reconhecer esse acerto. Na outra ponta, houve um afrouxamento na execução orçamentária na produtividade de programas contratados que poderiam ter celeridade e execução que não houveram por conta do desmonte das equipes técnicas. Vejo também o esforço que se faz nesta questão da contratação de concursados, principalmente na área de segurança pública para fazer o enfrentamento à violência que estamos vivendo.
Onde mais peca o governo de Gladson Cameli?
Acho que o maior problema enfrentado pelo Governo é na equipe. [O Governo] nomeou pessoas, dividiu espaços [de poder] mas não conseguiu construir uma equipe. Uma equipe para, verdadeiramente, se transformar numa equipe precisa estar unificada em torno de um programa e que seja liderada por um grupo político coeso, unido, com propósito bem claros. Portanto, o Governo não tem equipe. Tanto é que, na primeira reforma tão propalada no início do Governo e em menos de 100 dias, teve que se fazer uma terceira e uma quarta, o Governo ainda está à procura de qual desenho de gestão que lhe é melhor adequado para os seus propósitos. Portanto, não tem equipe e esse é o principal problema. Em decorrência disso é a divisão política interna. O que o unificou na campanha [eleitoral], está desde o início destruindo a governança. O que o unificou na campanha foi o “Fora PT” e isso agora não está dando certo porque têm propósitos e olhares diferenciados para a sucessão de 2022. PSDB, MDB, PP e PSD não têm um ponto de intercessão quando se trata dos interesses para 2022. Então, essa disputa que já se torna pública neste momento, ela é muito dura nos bastidores. Portanto, este é um problema para a governança.
E como é que, com tantas críticas a este Governo, o senhor votou a favor de concessão de empréstimos para o Governo? Por que isso?
O debate em torno da capacidade de endividamento do Estado sempre foi camuflado e perverso do ponto de vista político e eleitoral mentiroso. Se propagandeou na campanha [eleitoral de 2018] que o Estado estava inviabilizado porque havia feito muitos empréstimos. Se tivesse feito uma discussão honesta, decente e sincera acerca deste tema, o debate era outro. No dia da posse do governador, eu manifestei minha opinião. Disse que estava sentindo falta na mensagem governamental de referência à operações de crédito. Não demorou muito e três operações foram solicitadas [à Assembleia] – uma, de renegociação de débitos e outras de empréstimos, para aumentar o endividamento do Estado. E eu votei a favor por uma questão muito simples, de coerência. O Estado, com seu orçamento baseado nas transferências constitucionais e na arrecadação de ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias]. Não tem capacidade de fazer grandes investimentos. Os grandes investimentos que podem vir a alavancar a economia e abrir caminhos novos para o nosso desenvolvimento só são possíveis frutos de operações de crédito. Os governos anteriores fizeram e o atual governo também precisa fazer e por isso votei a favor. Tenho a convicção de que nenhum desenvolvimento ocorre sem que o poder pública faça investimentos pesados.
Como ex-dirigente do Depasa, o que o senhor da proposta de Governo de privatização do sistema de água e esgotos do Estado?
A universalização dos serviços de água e esgotos, a partir de um estudo contratado pelo BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], tem por finalidade investimentos que possam dar conta dessa universalização. O grande problema é o olhar sobre o isso. O Banco, com sua visão privatista, impõe uma receita que não é a melhor receita. Por isso, eu sou contra a privatização do sistema de água e esgotos. Em Estados como o nosso, que tem uma dezena de municípios pequenos, nós não vamos ter uma gestão privada dos recursos e do fornecimento da água e da exploração dos serviços de esgotos que não quebrem nas costas dos mais pobres o custo disso. Transformar a água e o tratamento de esgotos num negócio não é o melhor caminho. O fornecimento de água, o tratamento de esgotos – a prestação desses serviços é uma questão de saúde pública e a saúde pública tem que ser cuidada pelo poder publico e, portanto, não é um negócio.
Mas a proposta obedece a uma estratégia nacional. O que há de errado nisso?
Errada está a estratégia nacional. Há vários estados que não embarcaram nesta estratégia. Vão pegar suas companhias de água e esgoto e vão até abrir os seus capitais para parcerias com o setor privado mas vão continuar sendo, digamos, majoritárias, para a coordenação e condução desses serviços. Outros querem vender. O mundo todo está fazendo o inverso. Paris, Londres, as principais capitais do mundo, estão reestatizando [o sistema].O [Estado do] Amazonas, por exemplo, tem uma péssima experiência de privatização. O Acre conhece muito bem isso também. É só se espelhar com o que aconteceu com a Energisa. Ofereceu o céu mas o que sobrou para os consumidores foi o inferno da conta alta e da exploração de um serviço tão importante para a via das pessoas como é a energia. Imagine em se tratando de água. Nós estamos entrando por um caminho, se esta for a decisão do Governo [de privatização], muito perigoso e no qual os mais pobres sofrerão.
Como será, na sua avaliação, a relação da Assembleia Legislativa com o Governo em 2020?
Este primeiro ano, vamos dizer assim, foi o ano de demarcação de terreno das forças que compõem o governo, que são bastante heterogêneas entre si – e, portanto, não estão consolidadas – e das forças que fazem oposição ao projeto atual, nas quais eu me incluo, o meu Partido e também àqueles que se posicionam também como independentes na Casa [Assembleia Legislativa]. O método adotado no segundo semestre [pelo Goerno], que eu chamo de vitória dos falcões – porque é a política do enfrentamento pelo enfrentamento, onde se abandona a construção da política majoritária para fazer uma disputa de esmagamento das minorias através do rolo compressor da maioria, isso trouxe profundas mágoas, porque expôs, desnecessariamente, a base. A condução mal feita no encaminhamento da proposta da reforma da previdência deixou marcas profundas, que começaram a se manifestar na condução da terceirização da saúde, na discussão do projeto do pró-saúde. É preciso ter cautela. Aquilo que parece ser uma maioria não está consolidada. Haverá, portanto, mudanças no nível do debate na Assembleia, que no próximo ano deverá ter nuances diferenciadas.
E no próximo ano o PC do B estará disputando as eleições? Como?
O PC do B vai participar ativamente das eleições e vai fazer uma construção política em cada município, obedecendo e olhando para a realidade de cada localidade, porque o bordado político de cada local é diferenciado – nós não podemos pegar uma forma e a partir daí querer estabelecer as regras para cada um dos 22 municípios, que têm características locais. Vamos participar ativamente porque nosso Partido está registrado nos 22 municípios.
E na Capital, o PC do B vai apoiar a prefeita Socorro Neri caso ela saia para a reeleição?
Na Capital, nós participamos da administração da prefeita Socorro Neri. Nós também participamos da base de apoio da prefeita na Cãmara Municipal com o nosso vereador Eduardo Farias, que é o líder do PC do B na Câmara. Portanto, nós cainharemos a partir de uma discussão e da decisão que a prefeita for tomar. Estamos aguardando qual será sua decisão em relação às eleições municipais.
E essa história de que o PC do B vai mudar de nome, acabar com a expressão comunista e tirar a foice e o martelo como símbolos?
É tudo fake news. O PCdoB continua com as mesmas causas e nas mesmas trincheiras de lutas, que é a defesa dos trabalhadores e do povo brasileiro. Vamos manter nosso símbolo e nossa cor, embora nunca tenhamos escondido o verde e o amarelo da nossa bandeira porque o PC do B é um partido nacional e que defende a não entrega das nossas riquezas ao capital estrangeiro, como vem acontecendo.