O menino de 9 anos que foi resgatado pela Polícia Civil, em Manaus, contou em depoimento que dormia acorrentado todos os dias. Ele era torturado pelo pai e pela madrasta. O casal teve a prisão preventiva decretada.
Por pelo menos dois anos, o menino dormiu acorrentado em cima de um colchão jogado no chão da casa onde morava com o pai e a madrasta, no bairro Gilberto Mestrinho, na Zona Leste da capital. O garoto, que foi abandonado pela mãe biológica, chamava a madrasta de “titia”.
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Menino resgatado em Manaus — Foto: Reprodução
Veja abaixo como foi o depoimento:
- Entrevistadora: você dormiu acorrentado de ontem para hoje?
- Menino: todo dia eu durmo acorrentado.
Em depoimento, ele disse ainda que era proibido de se alimentar durante à noite:
- Menino: a titia diz ‘sabe por que o teu pai põe essa corrente na tua mão?’. ‘Eu sei, porque eu fico mexendo nas coisas…’
- Entrevistadora: em que coisas você mexia?
- Menino: comida, pão, café, bolacha, iogurte…
Policiais da Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca) foram até a casa da família depois de receber uma denúncia anônima.
Na residência, o pai da criança mostrou como e onde acorrentava o filho.
“Havia um protocolo na casa de acorrentar essa criança durante as noites e soltar a criança pela manhã. Durante as noites, se ele tivesse vontade de fazer necessidades fisiológicas, fazia ali mesmo”, explicou a delegada Joyce Coelho.
As marcas dos espancamentos que sofria todos os dias estão espalhadas pelo corpo da criança.
No domingo (5), ele foi espancado pela última vez, porque pegou duas uvas que estavam no chão.
- Menino: domingo, a gente foi para igreja. Aí, caiu duas uvas lá no chão. Eu juntei logo. A titia falou “não junta”, eu já tinha pegado, eu ia comer duas uvas, quando eu cheguei em casa, apanhei…
- Entrevistadora: por que você apanhou?
- Menino: porque eu ia comer.
- Entrevistadora: você apanhou de que?
- Menino: com um pedacinho de pau…
- Entrevistadora: você apanhou de quem? Da titia ou do seu pai?
- Menino: do meu pai…
Para a polícia, mesmo não espancando o menino, a madrasta era quem comandava as sessões de tortura. Em uma conversa com o marido por aplicativo de mensagens, ela diz estar preocupada com a sogra, pois ela poderia denunciar as agressões.
O pai descarta essa possibilidade. Ela, então, manda que o pai mantenha o menino preso o tempo todo
Em outra conversa, o pai admite que bate no filho para ele ir tomar banho. A mulher responde que o menino só sabe tomar banho se apanhar.
Em outra mensagem, o homem reclama que o filho não o deixa assistir à novela. Ela, então, sugere que o marido bata no filho com um pedaço de pau, porque o menino está “chateando demais”.
O o casal foi preso, em flagrante por crime de tortura, na manhã de segunda-feira (6). Em depoimento à polícia, o pai contou que acorrentava a criança todas as noites pelo fato de o menino urinar na cama da irmã mais nova e também tomar o iogurte dela.
Na terça-feira (7), a Justiça decretou a prisão preventiva do pai e madrasta. Na prática, significa que eles ficarão presos até o julgamento.
“Ele relatou diversas surras, diversos espancamentos, com diversos objetos. Ele tem lesões na cabeça, lesões pelo corpo. As maiores lesões são nas nádegas, onde eles costumam bater em cima das lesões já feitas antes e isso provoca uma dor intensa nessa criança, relatado por ele”,
O medo de novos espancamentos impedia que o menino denunciasse os crimes. O garoto sofria sozinho.
- Entrevistadora: na escola, você não contou para os professores o que acontecia com você?
- Menino: eu tinha medo de contar e a professora contar para o meu pai e eu apanhar…
Além da criança que era acorrentada, outras duas, de 8 e de 2 anos, também moravam na casa. Não há informações se elas também eram vítimas de tortura.
O menino agredido foi levado a um abrigo. Os outros dois filhos do casal vão ficar com parentes.
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Menino resgatado em Manaus — Foto: Reprodução
