Quando discutimos os problemas criados por gerações e mais gerações (como a minha) educadas sexualmente pela pornografia mainstream (aquela antiquada – ainda que muito popular), o orgasmo masculino talvez seja um dos últimos pontos a serem questionados.
Mas, se você quer mais um motivo para se livrar o quanto antes do vício em uma pornografia ruim, aqui vai: quando tudo o que vemos são homens fazendo sexo super performático, intenso, centrado no falo e no gozo abundante, sobra pouco espaço no nosso imaginário para o homem mediano e real.
Aquele que às vezes pode estar cansado ou preocupado demais e só quer transar de boa, sem pressão, ou até – pasmem, isso é possível – não quer transar e isso não é o fim do mundo.
Encomendei uma pesquisa ao Sexlog.com que foi realizada com 4.473 homens (majoritariamente cis) e 35% assumiu: já simulou que gozou para finalizar uma transa. Ou seja. 1 a cada 3 homens que você conhece já simulou um orgasmo.
Nessa mesma pesquisa, a maior parte dos homens (45%) disse que quando aconteceu ele estava curtindo a transa, mas muito cansado. Outros 28% respondeu que o sexo não estava lá tão legal, enquanto 12% estava com a cabeça em outro lugar na hora. Ainda 6% sentiu que não podia decepcionar e acabou transando por obrigação. Num volume menor, justificativas como insegurança com o corpo e com a performance também foram mencionados.
De acordo com a sexóloga, psicóloga e terapeuta de casais Carla Cecarello, não atingir o orgasmo e fingir é mais comum entre as mulheres, mas ela também atende homens que vivem esse tipo de situação: o caso das mulheres geralmente tem a ver com a forma como foram criadas em relação ao sexo. Se é uma mulher que cresceu num ambiente onde sexo foi visto como uma coisa suja ou pecaminosa, isso contribui para que ela se torne adulta com a ideia de que sexo não é positivo e consequentemente se torna complicado alcançar o orgasmo.
Para Carla, o orgasmo também está relacionado à entrega. Muitas não conseguem se entregar emocionalmente e afetivamente à parceria. Outras relatam dificuldades para lidar, também, com a figura paterna. No caso dos homens, muitos fingem porque não estão envolvidos emocionalmente com a outra pessoa ou porque sentem que foi um erro cometido que os fez estar naquela situação. Uma outra parcela de homens já tem alguma dificuldade de ejacular por algum motivo físico e fingem para não ficar desagradável. E há casos em que estão em conflito com a sua orientação sexual, mas acabam insistindo em uma relação que não os contempla.
Um outro ponto levantado pela Carla é uma percepção construída ao longo do tempo, e bastante opressora, de que aos homens não é permitido negar sexo em circunstância alguma. Do homem sempre foi cobrado que ele estivesse pronto para o sexo: com uma ereção super rígida e gozando sempre que fosse solicitado para o sexo. “Há uma espécie de ditadura, onde cobramos para que ele sempre esteja pronto, quase como uma máquina. Dentro da nossa cultura é muito difícil entender que, por diferentes motivos, um homem pode não ejacular. Também é difícil imaginar que eles consigam fingir o orgasmo, mas a verdade é que isso é perfeitamente possível, se for preciso eles dão um jeito”, afirma a sexóloga.
Confesso que durante mais tempo do que gostaria de admitir também compartilhei dessa visão deturpada, de que homem não nega sexo e se nega há alguma coisa errada, comigo ou com ele. Por isso, ainda é difícil entender exatamente em que quando isso acontece, como e por que. Aproveitei para perguntar para homens que já viveram essa situação:
Gustavo é de São Paulo, gay e contou de um date em que ele fingiu para terminar logo com aquilo:
“O motivo foi falta de química que levou a uma não excitação. Foi com uma pessoa daquelas que na conversa online te diz que vai te virar do avesso, fazer e acontecer e chega na hora a pessoa não tem carisma, não é safada, não tem pegada, não tem iniciativa e quase que não sabe o que fazer… Daí a ideia de fingir foi pra acabar logo fazendo de conta que estava muito bom, gemendo alto, elogiando o pau dele e o jeito que ele metia, forçando pra ele aumentar a velocidade e força da penetração pra ele gozar mais rápido e o plano deu certo!
O cara se animou se achando o máximo e acabou gozando. Daí eu dei a desculpa que eu demorava muito pra gozar e que estava tudo bem que ele podia ir embora porque eu tinha compromisso e que ele me faria gozar outro dia com mais tempo. Hoje em dia não fingiria, pois acredito que o melhor seria conversar de um jeito bacana pedindo coisas que eu gosto ou dando dicas pra ele melhorar, porque o cara saiu achando que era bom e provavelmente teve esse desempenho sofrível depois com outras pessoas. Se a gente alerta quem trepa mal (sem ser grosseiro ou maldoso) a pessoa pode se esforçar pra melhorar, mesmo que a gente não tenha obrigação de ensinar nada pra marmanjo que se gaba… Acho válido mais pela empatia, afinal eu também não nasci sabendo tudo!”
Confesso que mesmo com todas essas informações continuei sem entender como exatamente esse gozo fake acontece. Perguntei sobre isso ao Arnaldo, também de São Paulo, heterossexual e ele me deu mais detalhes:
“Quando aconteceu comigo eu aproveitei a hora em que a pessoa gozou pra gemer mais alto e fingir que gozei também. Tirei o preservativo rápido e emendamos algum assunto. Acho até que ela percebeu, mas não disse nada. Ficamos de chameguinho e vida que segue. Às vezes o problema é que bate um cansaço no meio da transa. Até sei que dá pra parar, descansar e retomar depois, mas às vezes não dá vontade de ter que retomar depois e aí é melhor finalizar mesmo rs”
Por fim, recebi outros depoimentos que podem nos ajudar a montar esse quebra-cabeça que é entender a sexualidade nua e crua, pra além das transas perfeitas sobre as quais adoramos falar por aí. Dá pra perceber que motivações e jeitos de lidar com as situações são variadas:
“Teve uma vez em que a pessoa em questão era uma múmia na cama e pra acabar logo aquele suplicio fingi que gozei, tomei um banho rápido, me vesti e sumi. Ninguém merece pegar alguém na cama que não esboça nenhuma reação.”
“Tinha um compromisso logo após a transa e companheira já estava satisfeita. Menti para poder ir logo.”
“Eu estava sentindo que a velocidade das coisas não estava como eu gostava. Tudo estava indo rápido demais, com pouco carinho. A parceira com quem estava no insistia em me pedir que eu gozasse, ao ponto de eu me sentir nervoso e perder o prazer. Fingi que eu tive um orgasmo porque não estava mais desfrutando do sexo.”
“Na hora H as partes íntimas da pessoa estavam fedidas. Tentei fazer algo o mais rápido possível, respirando pouco e fingi gozar para fugir daquilo.”
“Já tinha gozado uma vez, fomos pra segunda, mas não estava legal. Pra acabar logo fingi e acabou.”
“Estava com uma conhecida e não estava conseguindo gozar, como estava de camisinha, tirei e disse que já tinha terminado. Ela acreditou e ninguém saiu prejudicado. “
“Durante o sexo ela atendeu o celular ficou por uns cinco minutos conversando aí fingi que gozei e sai de cima.”
“A transa estava gostosa, mas o período do motel que estávamos estava acabando então eu fingi um orgasmo.”
“Foi por ter ido transar por impulso, estava muito cansado.”
“É raro, mas as vezes acontece de estar transando forte, excitado ainda, mas um pouco cansado e acabo não encontrando o ponto mental pra chegar no gozo. Já aconteceu também de simplesmente não gozar, mesmo depois de muito tempo transando forte… creio que quando seguro o gozo por muitas vezes no começo da transa, o ponto de orgasmo simplesmente não vem novamente.”
“Eu estava a fim, tava gostosa a brincadeira, mas eu não está conseguindo gozar por estar muito cansado do trabalho e estressado aí como ela estava gozando disse que gozei junto.”
Pois é, parece mesmo que a situação é mais comum e corriqueira do que a gente podia imaginar. E agora chegou a vez daquela reflexão dolorida: alguém já fingiu gozar transando com você? Se sim, consegue imaginar o motivo? Aos corajosos e corajosas, compartilhem nos comentários!