Voz firme, nem de homem, nem de mulher, mas de pessoa não-binária de personalidade marcante. Conversar com o acreano Igor Martins, ou com a Igor Martins, desde que seja com mente aberta e acima de tudo com respeito, é mergulhar num universo que muito se fala e a cada dia se aprende mais. E como nesta terça-feira (28) é Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAP+, vamos conhecer um pouquinho sobre ser uma pessoa não-binária.
Mas já deixando claro que não é para todo mundo ter uma personalidade bem formada e principalmente ter orgulho de si, da construção diária de um ser que é homem, é mulher, e segue feliz sendo quem é. Igor Martins revela em seu discurso um conhecimento interior que interage com o exterior e mesmo sabendo que o tema do não-binarismo é considerado confuso, fala com a maior naturalidade, calma e paciência sobre o assunto.
A sigla LGBTQIAP+ representa as pessoas que de alguma forma não se identificam com a heterossexualidade ou com o conceito de que só existem dois gêneros (masculino e feminino) e dentro do símbolo de mais, encontram-se as pessoas não-binárias.
Igor explicou que dentro desse aspecto de não-binarismo de gênero, existem duas grandes correntes. “Uma delas é a de pessoas de gênero fluido, que se identifica tanto com o gênero masculino quanto com o feminino, que é o meu caso. E nós temos as pessoas agênero, que não se identificam nem com o masculino nem com o feminino, que preferem a neutralidade”, comentou.
E não foi do dia para a noite que Igor se encaixou nessa definição. “É difícil você se identificar como algo que não tem conhecimento. Há cinco anos, quando me identifiquei como uma pessoa não-binária, se falava muito menos sobre isso”, lembrou.
Ter o gênero fluido, como Igor destaca, preenche o seu ser de um modo inexplicável. Deu para ele a liberdade necessária para exercer sua voz política e artística. Política no sentido mais amplo da palavra, de conhecedor e defensor dos seus direitos e deveres, e artística no sentido mais pleno, atuando como a drag queen Ágata Power.
Ser diverso não é misturar personalidades e sentimentos: o discurso é bem organizado dentro da mente de Igor. “É importante ficar claro que o não-binarismo é uma questão de sentimento, é algo interior e muito pessoal. Não se expressa visualmente, por exemplo quando um homem usa barba, maquiagem e brincos”, disse.
Igor citou um exemplo que ele considera ainda mais claro. “Não é porque você é mulher e veste a roupa do seu namorado que você se torna não-binária. O que vai fazer que você seja, o que quer que seja é o que você sente e como se enxerga. Como os outros te vêem, já é uma coisa completamente diferente”, completou.
Igor admite que o assunto é considerado confuso até para pessoas que são do universo LGBTQIAP+, mas ele garante que quando os conceitos são colocados no dia-a-dia, tudo fica mais fácil. “Eu sou Igor Martins e ponto final, mas pode me chamar de a Igor, desde que não seja de forma pejorativa. São duas existências que convivem juntas dentro de um mesmo corpo mas não contemplam 100% do que é o Igor”.
Trabalho e família
Jornalista formado há mais de 10 anos na Universidade Federal do Acre (Ufac) e atualmente servidor público na mesma instituição, Igor Martins considera-se realizado em sua atuação profissional, mas nem sempre foi assim. Ao longo da sua trajetória de estudante escutou de professores que ele não se encaixaria no padrão exigido, que a voz era bonita, mas não condizia com o corpo.
“Alguns professores chegaram a me dizer que eu iria me restringir a escrever textos porque eu não fazia parte de um padrão. E hoje eu trabalho na universidade, lido diante das câmeras em conteúdos para redes sociais e as pessoas convivem com uma pessoa não-binária. Isso é considerado como algo inovador. Meu trabalho sempre me deu essa liberdade, e mesmo que eu tivesse medo, pelo que ouvi no início, a universidade se tornou de fato um ambiente plural”, argumentou.
Em relação à família, Igor falou com toda objetividade. “Minha relação com minha família é razoável, por ‘n’ motivos, mas não é uma relação ruim. E hoje tenho minha autonomia, pago minhas contas e se tinha alguém que achava ruim alguma coisa, ficou no passado. E não somente a família, quem quiser achar ruim, não posso fazer nada porque não é sobre o que as pessoas pensam sobre mim e sim sobre o respeito que elas têm que ter”, finalizou.