O óleo que chegou no Nordeste brasileiro, os deslizamentos na cidade de São Sebastião, em São Paulo, e os resorts que nascem em diversos pontos da nossa costa. Todas as vezes em que temos algum desastre ambiental no litoral do Brasil, eu me pergunto: os conflitos no ambiente marinho são muitos, por onde começar a resolvê-los? Ou mesmo: a quem culpar quando vemos que muito pouco está sendo feito?
Considerando que em geral são situações que exigem respostas rápidas do poder público, deveríamos ter uma resposta simples para essas perguntas, mas na maioria das vezes não temos. Dependendo da região impactada, são diferentes instituições e níveis de poder envolvidos num enfrentamento de crise. Frequentemente, esses órgãos e instâncias se confundem, misturam atribuições e ficam jogando os problemas de um colo para outro, o que resulta em ineficiência ao mesmo tempo que todo mundo acha que “fez sua parte”.
Até poucos anos atrás, o ambiente marinho não era nem considerado um bioma pelas políticas públicas. Toda a região costeira dependia de leis referentes a outro bioma, como a Mata Atlântica ou a Amazônia.
Temos um litoral de quase 10 mil quilômetros de extensão que é regido por diferentes leis e instrumentos de gestão, em diferentes órgãos governamentais, que não dialogam bem entre si.
Cenários como esse facilitam a ocorrência de situações que permitem a invasão indiscriminada em nossas praias: a grilagem que ocorre em todo o Brasil também se estende às áreas costeiras, inicialmente ocupadas por comunidades tradicionais e terrenos de marinha, que deveriam pertencer ao governo federal e a todos nós.
O caos gerado pela falta de leis e atribuições objetivas dos órgãos faz com que grupos financeiramente poderosos encontrem brechas para impor as suas vontades sobre a legislação e aos poucos os povos tradicionais perdem seus territórios, e nós perdemos nossas praias.
Desde 2013, a sociedade civil propôs um marco regulatório para o ambiente marinho. Apelidada de Lei do Mar, o PL 6969/2013 sofreu diversas alterações ao longo dos anos, sendo modificado para facilitar a gestão dos órgãos públicos e evitar conflitos com setores econômicos como o do turismo.
A Lei também busca uma maior participação social, do pescador às grandes empresas que atuam no ambiente, propondo um processo de Planejamento Espacial Marinho público mais transparente.
Além de estarmos na declarada Década do Oceano – período de 2021 a 2030 declarado pela ONU para chamar atenção para o ambiente marinho e promover a gestão sustentável de seus sistemas costeiro-marinhos entre os países membros, hoje, 8 de junho, é celebrado o Dia do Oceano.
Estas datas existem justamente para incentivar que a sociedade e os tomadores de decisões olhem nossos mares para além do lazer no feriado. E nesse sentido, a Lei do Mar poderia ajudar o Brasil a criar um futuro mais sustentável para o seu litoral e para sua população. Mas, para isso, ela precisa avançar em Brasília, o que ainda não aconteceu mesmo dada a urgência do tema.
Parece estranho pensar nisso após as semanas tão conturbadas para a pauta ambiental e as políticas públicas, em que ficou evidente que a pauta socioambiental do novo governo enfrentará muitos desafios, especialmente no Congresso. Para quem luta pelo meio ambiente, às vezes parece que somos muitos e as coisas estão mudando, mas logo vem um balde de água fria.
No fim, ainda somos poucos, e embora juntos estejamos mais fortes, ainda não é o suficiente para mudar o rumo de um país. Mas como uma amiga de luta me lembrou, seguimos como pequenas ondas no mar, mudando o relevo da praia não com sua força, mas com a sua constância. O dia do meio ambiente e do oceano passará, mas ainda temos a semana, o mês, o ano e toda a nossa existência para lutar por um mundo melhor.
Beatriz Mattiuzzo é oceanógrafa, mestranda em Práticas de Desenvolvimento Sustentável, instrutora de mergulho e cofundadora da Marulho, negócio socioambiental que intercepta redes de pesca junto a pescadores locais em Angra dos Reis.