SrN sofre ataques e desativa perfil após vitória no PeB

Eleição de atleta não binária de 16 anos como a melhor no cenário inclusivo de Valorant no Prêmio eSports Brasil a fez receber mensagens transfóbicas na web

A eleição como melhor atleta do cenário inclusivo de Valorant em 2023 no Prêmio eSports Brasil provocou polêmica e uma onda de mensagens e ataques transfóbicos a Nicolas “srN”. Diante das mensagens de ódio na internet, srN desativou o perfil no X (antigo Twitter). Durante a premiação, jogadoras da Team Liquid criticaram a escolha, pelo júri, de srN como vencedora.

— Por mais que li muita m*, ganhei dois prêmios hoje. Nada tiro isso de mim. Só tenho a agradecer por todo mundo que me apoia. Se você acha que pessoa X ou Y mereceria mais, está tudo bem. Só lembrem que qualquer postzinho abre bueiro dos transfóbicos e isso está acabando com meu dia — escreveu srN, de 16 anos, que se identifica como pessoa não binária, em uma primeira publicação no X.

Horas depois, srN se manifestou novamente no X, revelando que havia mensagens de ódio sendo enviadas para a mãe dela.

— ‘Seloco’, estão mandando mensagem de ódio até para minha mãe. A que ponto chegamos.

Em uma terceira publicação, srN lamentou os ataques que estragaram a premiação.

— É isso aí, valeu por estragarem a p* de dois prêmios — escreveu a jogadora, antes de desativar a conta no X.

Na cerimônia de premiação do Prêmio eSports Brasil, realizada nessa quinta-feira, no Memorial da América Latina, em São Paulo, srN chorou ao discursar e receber o troféu de melhor atleta do cenário inclusivo de Valorant. Ela voltou ao palco tempos depois para ser premiada como atleta feminina revelação do ano.

Em uma temporada dominada pela Liquid, SrN se destacou na conquista, pela Legacy, de duas, das três classificatórias para a Etapa 2 do Valorant Game Changers Brazil deste ano. No evento principal, porém, a Legacy terminou em 3º lugar, abaixo da Liquid, a campeã, e da LOUD, a vice.

A Liquid, que também venceu a Etapa 1 do Game Changers brasileiro, não disputada por srN, tinha Vitoria “bizerra” como uma das finalistas na categoria de melhor atleta do cenário inclusivo de Valorant, ao lado de Julia “Jelly”, da LOUD.

Durante a cerimônia de premiação, jogadoras da Liquid se manifestaram com a opinião de que bizerra é quem merecia ser escolhida como a melhor do ano no Valorant. Outros integrantes da comunidade e torcedores tiveram a mesma opinião.

— Nada contra srN, mas a bizerra merecia muito mais. Bizerra vice-campeã mundial, destaque no Brasil todo, em todos os classificatórios, em todos os Gamers Changers e não ganhou? Zero sentido — criticou Letícia “joojina”.

— SrN é muito bom mesmo, mas sequer jogou o primeiro split — escreveu Natália “daiki”.

SrN com dois troféus do Prêmio eSports Brasil 2023 — Foto: Reprodução/X

SrN com dois troféus do Prêmio eSports Brasil 2023 — Foto: Reprodução/X

O manager de esports da Liquid, André “Sensi”, também comentou os resultados da premiação:

— Galera tem que ser muito pé no chão. SrN é, sim, uma ótima jogadora, teve um bom ano, faz sentido ter ganhado como revelação. No entanto, melhor jogadora do ano, na minha humilde opinião, seria da bizerra por motivos óbvios… Ganhou os presenciais e ainda ficou top-2 do mundo. Dito isso, é surreal ver os ataques e crimes sendo cometidos para cima da srN.

Em meio às críticas à escolha da vencedora, houve muitas ofensas transfóbicas a srN, parte delas baseada no fato de a categoria do Prêmio eSports Brasil ter “feminino” no nome.

Apesar disso, a categoria em questão abrange o cenário inclusivo, como é chamado no Valorant, de acordo com a nomenclatura dada pela Riot Games, desenvolvedora do game e organizadora dos campeonatos oficiais. O cenário inclusivo é aberto a mulheres cis, mulheres trans e pessoas não binárias.

Daiki, que criticou a escolha da vencedora, se manifestou contra os ataques transfóbicos.

— Eu entendo as pessoas não concordarem e saírem insatisfeitas, mas muita gente usa disso pra ser transfóbico e nisso eu discordo 100%. Tem muita gente com m* no lugar do cérebro — observou a jogadora da Liquid.

Uma das juradas na categoria, a narradora Babi Micheletto defendeu o resultado. O júri era composto ainda pelas casters Letícia Motta, “Chun”, Ana “Anyazita” e Flávia Naoshii.

— Não vou falar em quem eu votei, porque acho desnecessário. Parabéns, srN, pelo prêmio, que mereceu muito, assim como todas as outras. Mas quero deixar um ponto importante aqui. Para quem não sabe, as votações para a campeã acabaram bem antes de o Mundial começar. É isso, respeitem os vencedores, independente de você concordar ou não… É uma noite inesquecível para eles…Não estraguem isso — escreveu Babi no X.

Os comentários depreciativos e preconceituosos vieram não só da comunidade de esports, porque o assunto furou a bolha dos games competitivos. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), por exemplo, publicou um vídeo da premiação e ironizou a vitória de srN.

O apresentador e criador de conteúdo Theo “RedMake” criticou os ataques sofridos por srN, com quem o ge tentou, mas não conseguiu contato até a publicação desta matéria.

— Uma adolescente de 16 anos teve um dos melhores dias da sua vida arruinado por causa do discurso de ódio de vocês. Vocês começaram com um ataque em massa e essa m* furou a bolha ao ponto de ela ter que desativar sua rede social. Vocês têm noção da seriedade disso? Ela está recebendo ataques de todos os lados, e esse ódio mata. Sim, isso mesmo que você leu, esse ódio mata pessoas trans. Se esse ódio destrói adultos, imagine uma pessoa de 16 anos.

PUBLICIDADE