Polícia espanhola prende quadrilha de falsificadores de obras de Picasso e Da Vinci

Operações policiais em Albacete, Valência e Madrid interceptam vários quadros de artistas famosos prestes a serem vendidos por valores milionários

A polícia espanhola prendeu cinco pessoas que tentavam vender três falsificações de Picasso e outra de Benjamín Palencia através de uma casa de leilões em Albacete. Pelo Picasso mais caro, uma pintura de tamanho médio com o retrato de uma mulher, os golpistas pediam mais de 10 milhões de euros. Por outra obra do mestre cubista, 3 milhões de euros e pela terceira, um exemplar do desenho “Duas figuras e uma pomba”, feita por Picasso em 1956 e parte da coleção Reina Sofia, pediram 200 mil euros. Para a paisagem de Benjamín Palencia, pediam 3.500 euros.

Falsa pintura atribuída a Leonardo da Vinci apreendida pela polícia espanhola — Foto: Divulgação / Polícia Nacional da Espanha

A investigação teve início em janeiro, revela o responsável pela operação, Antonio López, chefe da Unidade de Patrimônio da Polícia Nacional em Valência. Ao serem interrogados, os proprietários das obras afirmaram se tratar de uma herança, mas a polícia já sabia que há anos haviam investigado a autenticidade das telas e receberam uma resposta contrária.

— É como se tivessem uma nota falsa, e seguiram adiante até passar para alguém — explica López por telefone.

Da Vinci no porta-malas

Dois dias após a operação, a polícia prendeu um homem em Madrid. Dois anos antes, o cidadão espanhol, originário de Granada, havia sido interceptado na fronteira entre a França e a Itália com uma suposta pintura de Leonardo da Vinci. A polícia francesa encontrou na mala do carro um pequeno retrato com o título “Retrato de Giacommo Trivulzio”, prestes a ser entregue por um valor de 1,3 milhão de euros.

— Ele ia se encontrar com um cliente em Milão. A obra foi emoldurada e colocada numa caixa de madeira — resume um dos agentes do Património que participou da operação.

Por fim, o Prado certificou que se tratava de uma cópia e, dois anos depois, o dono de um quadro que nem existe foi preso. No caso de Da Vinci, o fato de não ter assinado as suas obras dificulta o registro para além das duas dezenas de pinturas que se conhecem. Segundo os especialistas, o “Retrato de Giacommo Trivulzio” foi feito no início do século XX imitando o estilo dos retratos milaneses do Renascimento. O Prado avaliou a falsificação em muito dignos 3.500 euros.

A Espanha é um importante ponto no mundo do tráfico de arte falsa, sendo o quarto negócio ilegal que movimenta mais dinheiro no mundo, depois do tráfico de drogas, de armas e de seres humanos, afirma o Comissário López. Este mercado alimenta-se de duas tentações tão antigas quanto os seres humanos: a ganância e a decoração dos tetos das cavernas.

— Quem se atreve a pagar milhares de euros por um quadro que está no Reina Sofía? — questiona López. — Quem não é especialista e quem está à procura de uma pechincha. Eles fazem você acreditar que teve a sorte grande e que esse trabalho vale muito mais.

Picasso lidera ranking de falsificações

Ao mesmo tempo, o mundo da arte é o limbo perfeito para a lavagem de dinheiro. Quando os contatos entre o negociante de arte e o comprador ocorrem na Internet através de sites de leilões, é relativamente fácil descobrir o engano e localizar os golpistas, mas uma grande parte transita por e-mails entre indivíduos, pessoas do mundo da arte e especialistas em falsificações.

Numa das operações mais importantes da Unidade do Patrimônio, há alguns anos, o comissário Antonio López se fez passar por um comprador de arte, o que permitiu à polícia apreender cinco Picassos avaliados em 160 milhões de euros. Em outra ocasião descobriu um falso Modigliani ao detectar o branco titânio entre as cores da tela, quando seu uso só ocorreu após a morte do artista italiano, em 1920.

No ranking das falsificações, Picasso é um dos favoritos dada a sua enorme produção. Segundo o catálogo de Christian Zervos que compila toda o seu trabalho, ele assinou mais de 15.600 obras, entre pinturas, esculturas, gravuras e desenhos. Com uma produção como esta, “as falsificações seguem dois caminhos”, explica López.

— Em alguns casos, copiam o estilo e complementam com documentos ilegais graças a uma rede de falsos especialistas que garantem uma importância artística que as obras não têm — diz ele, citando como exemplo um dos Picassos confiscados que reproduz uma figura cubista — Noutros, copia-se diretamente o original e acrescenta-se a assinatura (o que foi feito com o ‘Duas figuras e um pombo’ da Reina Sofía).

Todos os presos esta semana foram libertados após testemunharem à polícia. A mera posse de uma cópia não constitui crime na Espanha, salvo se lhe for acrescentada assinatura ou se houver tentativa de engano na sua venda ou se incluir documentos falsos. O artigo 270.º do Código Penal espanhol pune com penas de prisão de seis meses a quatro anos quem plagiar, distribuir ou reproduzir, com fins econômicos, qualquer obra artística.

No século XV, Michelangelo forjou uma escultura romana que envelheceu urinando regularmente em cima dela e depois enterrando para fingir a sua descoberta. Desde então, a arte da falsificação segue um desafio para colecionadores e museus no mundo todo. Em seu livro “Illustrious forgers”, Harry Bellet, especialista em arte do Le Monde, afirma que 40% das obras do Metropolitan são falsas ou mal atribuídas e cita Thomas Hoving, ex-diretor do museu de Nova York, como fonte. Com muito menos dúvidas sobre a veracidade do que tem diante de si, o Comissário López deu forma nos últimos anos, nos seus escritórios em Valência, a um museu da falsificação com mais de 200 obras de artistas como Sorolla, Genovés, Modigliani, Dalí e Andy Warhol.

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